“O SAS não vai contribuir para a febre em torno da inteligência artificial”;

“O SAS não vai contribuir para a febre em torno da inteligência artificial”
No ano em que comemora o seu 25.º aniversário em Portugal, o SAS Fórum teve 1200 profissionais inscritos. Uma realidade bastante diferente da primeira reunião de utilizadores que reuniu trinta pessoas.
No ano em que se celebra os cinquenta anos da ida do Homem à Lua, o SAS completa um quarto de século de existência em Portugal. Esta foi uma curiosidade mencionada pelo diretor-executivo Ricardo Pires Silva, na abertura do SAS Fórum, provavelmente porque Jim Goodnight, fundador e ainda atual CEO da empresa norte-americana, ter pertencido ao programa Apollo, um conjunto de missões espaciais coordenadas pela NASA entre 1961 e 1972 com o objetivo de precisamente colocar o homem na Lua. “Nas raízes do SAS estão curiosidade, capacidade e espírito empreendedor”, lembrou Ricardo Pires Silva.
O responsável pelo negócio SAS em Portugal disse que, se pensarmos no contexto do final dos anos sessenta, encontramos uma analogia “espantosa” entre esse tempo e os dias de hoje: enormes progressos na matemática, no poder computacional, na conectividade e na automação. “Mas hoje, ao trabalharmos com tantos mais dados, damos à inteligência artificial, à automação e à aprendizagem de máquina renovadas ambições. Encontramo-nos outra vez numa corrida similar em que a curiosidade e a tecnologia conseguem resolver problemas que até agora pareciam insolúveis”.
Claro que a analogia fica por aqui. O poder computacional que trazemos no bolso, que nos é dado por um telemóvel, é muito maior que todo aquele que levou o Homem à Lua em 1969. “Por isso, hoje, todos nós estamos nas nossas próprias missões lunares, a viver uma época extraordinária, cheia de desafios, sim, mas ainda mais cheia de oportunidades”.
Cinco colaboradores, 
onze clientes
 
Em Portugal, a empresa está presente desde 1994, na altura com cinco colaboradores, dezasseis clientes e trabalhava com onze universidades. O primeiro encontro de utilizadores SAS teve trinta pessoas. Uma realidade bastante distinta da de hoje. A estrutura portuguesa tem mais de setenta colaboradores e mais de cem clientes ativos. No SAS deste ano estavam inscritas 1200 pessoas. “Não somos certamente a maior multinacional de software a operar em Portugal, mas somos a maior empresa em Portugal dedicada exclusivamente à analítica. Não sabemos como serão os próximos 25 anos nem vamos especular sobre isso. Mas temos muitas certezas que irão mais diferentes, mais rápidos, mais ligados e com mais mudança”.
 
Transformar dados 
em inteligência
 
A analítica avançada e a inteligência artificial estão a mudar estruturalmente quase todas as indústrias, negócios e, consequentemente, as nossas vidas. Ricardo Pires Silva admite que com o impacto potencial que só encontra paralelo provavelmente com a Revolução Industrial ou com o advento da eletricidade ou Internet, ainda assim estamos no princípio do princípio de tudo isto. 
Basicamente, o gestor defende que estamos a lançar as fundações que irão dar forma às nossas vidas e às nossas sociedades nas próximas décadas. “Quando a curiosidade encontra a capacidade, o processo é inevitável. E o mesmo espírito que pôs o Homem na Lua é o que nos deve fazer perguntar a todos nós, todos os dias… e se? Porque não? Essa curiosidade é responsabilidade de todos nós”. Do lado do SAS, Ricardo Pires Silva diz que a empresa está comprometida em transformar um mundo de dados num mundo de inteligência.
 
A democratização da IA
 
Para o SAS, a inteligência artificial é constituída por cinco grandes blocos: natural language processing (NLP), computer vision, forecasting, optimization e machine/deep Learning. “Podemos usar a NLP para trabalhar, sobretudo, dados não estruturados, como ler emails, contratos e CV. O forecasting serve para fazer melhores previsões de vendas ou de outros indicadores que sejam relevantes nas organizações. Podemos usar optimization para melhorar as rotas de distribuição em cadeias de fornecimento e computer vision para fazer controlo de qualidade em linhas de produção. Em todos estes contextos é possível utilizar machine e deep learning para que os modelos encontrem novos padrões e se consiga processar quantidades de dados que até aqui eram impossíveis de trabalhar”.
Mas como chegámos até aqui? Segundo o diretor-executivo, chegámos porque houve uma convergência, um vórtice de conectividade e computação, barata e omnipresente, melhores algoritmos e, sobretudo, dados. Muitos dados, que “permitiram que passássemos de um paradigma em que a automação e a inteligência artificial se baseavam em regras explicitamente transformadas em código para procurar sistemas, para um cenário em que os sistemas são capazes de aprender por si próprios. A programação, por isso, é feita agora de forma implícita”. 
 
O chauvinismo de carbono
 
Segundo Ricardo Pires Silva, estamos para lá do que se chama “chauvinismo de carbono”, onde para ser inteligente era preciso ser feito de carne e osso. “Costumávamos usar a palavra ‘inteligência’ da mesma maneira que o Facebook começou a usar a palavra ‘amigos’. Ser capaz de desenvolver lógica e encontrar padrões que estão além da nossa capacidade de aprendizagem e processamento são, sim, sinais de inteligência. Só questiono é se a palavra certa deveria ser artificial. Esta forma de IA que resolve problemas muito específicos em sistemas construídos para uma determinada tarefa chama-se AI neural e hoje já permite construir soluções poderosas, como por exemplo pegar em dados e transações de um cartão de crédito e transformá-las numa afirmação sobre a sua legitimidade. Ou transformar dados de câmaras, de sensores, informações GPS em instruções de condução num carro autónomo. Nenhum sistema de IA consegue entender um discurso melhor do que um humano, mas consegue desde logo traduzi-lo para japonês”. 
A questão que o diretor-executivo defende é que estes sistemas não pensam; limitam-se a aplicar algoritmos e, daí, defender a utilização do termo inteligência automatizada e não artificial. “E até nos podíamos dar ao luxo de usar a mesma sigla!”.
 
Da IA à AGI
 
Há, contudo, uma outra aproximação à IA referida por Ricardo Pires Silva: a visão de criar máquinas de pensamento geral. Uma máquina que teria todas as capacidades e aptidões da inteligência humana: a artificial general intelligence (AGI). “A sua ambição é realizar, em hardware e software, inteligência de nível humano. Não é construída para fazer uma coisa específica. Pode resolver qualquer problema, qualquer tarefa, inclusivamente… pensar”. 
Mas isto, pelo menos segundo o responsável, ainda não existe exceto nos filmes e na nossa imaginação. “Em abono da verdade, ainda não temos uma ideia clara de como o podemos construir. E isto é o que inteligência artificial ainda não é. É importante perceber que com a tecnologia que temos hoje não chegaremos diretamente ao AGI. Com pequenos ajustes e melhorias não chegaremos lá. Precisaríamos de uma abordagem radicalmente distinta, que estaria algures entre a ciência dos materiais, da biologia, da mecânica quântica, da ciência da computação e, provavelmente, em mais uma dúzia de outras disciplinas”. O que nos pode fazer lá chegar, nas palavras de Ricardo Pires Silva, é o facto de estarmos a tentar. Talvez por isso mesmo a empresa norte-americana tenha anunciado o investimento de mil milhões de dólares em I&D para que a inteligência artificial “real” seja mesmo para todos e em todo o lado.
SUSANA MARVÃO s.marvao@vidaeconomica.pt, 12/09/2019
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