Desigualdade entre homens e mulheres está a diminuir nas empresas;

TELLES DEBATEU ‘IGUALDADE DE GÉNERO E O NOVO PARADIGMA EMPRESARIAL’
Desigualdade entre homens e mulheres está a diminuir nas empresas
Desde Janeiro de 2018 que as empresas do setor empresarial do Estado e Local têm a obrigação legal de eleger 33,3% de mulheres para os novos mandatos dos seus órgãos de administração e fiscalização. Já no caso das empresas cotadas em bolsa, o patamar mínimo de representação feminina após as assembleias gerais eletivas realizadas desde Janeiro de 2018 é de 20%, passando a 33,3% a partir de Janeiro de 2020.
Procurando fazer um balanço da entrada em vigor desta legislação, a Telles Advogados organizou recentemente um debate sobre este tema, sob o mote “Igualdade de Género e o Novo Paradigma Empresarial”. 
Gonçalo Pinto Ferreira acredita que este diploma traz, para além de algumas novidades, alguns desafios às empresas. “Desde logo, passamos a ter uma análise setorial geral das políticas das empresas pelas entidades fiscalizadoras. O Ministério do Trabalho vai corrigir a informação que as empresas vão dar através do seu balanço social, vai transmitir esta informação à Autoridade das Condições de Trabalho (ACT), que a vai analisar. Sendo identificadas situações de divergência salarial, a ACT tem 60 dias para notificar as empresas em que verificou que há uma situação de discriminação. Perante esta notificação, as empresas têm depois 120 dias para a apresentar o plano de transparência salarial, para justificar as divergências e eliminá-las. Esse plano tem de ser analisado num período de doze meses e no qual a ACT volta avaliar a situação da empresa”. 
Esta legislação aplica-se a empresas com mais de 250 trabalhadores, tendo tido início em 2019, devendo estar implementada até 2020, e, para empresas entre 50 e 250 trabalhadores, a partir de 2022.
Mas as empresas com menos de 50 colaboradores não ficam “livres” de responsabilidades, pois, para além deste modelo macro, foi também criada uma ferramenta micro para todas as empresas, que entrou em vigor em Agosto passado e “que as empresas não podem controlar”, sublinha Gonçalo Pinto Ferreira, segundo a qual qualquer colaborador ou representante sindical pode pedir um parecer à CITE – Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, se considerar que é alvo de discriminação salarial. E se for apresentada queixa, durante um ano a pessoa que a apresentou não pode ser despedida.
Na opinião do advogado, este mecanismo é potencialmente perverso, pois, “se o colaborador achar que está na iminência de ser despedido, pode apresentar queixa e  ónus da prova está do lado da empresa, que tem que demonstrar à CITE que não há discriminação. E o ónus negativo é sempre mais difícil”, salientou. “E levanta-se a questão sobre como a CITE irá fazer a avaliação; qual será o critério? As instituições de fiscalização estarão preparadas?”, questionou.
 
“Não é uma questão de números, mas sim de mérito e de qualidade”
 
Em declarações à ‘Vida Económica’, Gonçalo Pinto Ferreira admite que a lei está a começar a gerar mais igualdade entre homens e mulheres. Segundo o jurista, a “experiência está a demonstrar que esta lei gerou um desafio às empresas, um desafio de identificar mulheres para cargos de administração que não era uma preocupação que estivesse em cima da mesa”. 
Embora ainda não seja possível dizer “que estamos num ponto ‘ótimo’, este é potenciador dessa igualdade e um catalisador para o caminho certo”. Com esta lei, e embora os efeitos não sejam imediatos, “vemos já empresas cotadas na bolsa a fazer um esforço nesse sentido, mas a verdade é que, se não o fizerem, também serão penalizadas, com comunicações à CMVM”, realça o responsável do departamento laboral e sócio da Telles Advogados. 
Questionado se estamos a falar apenas de equilíbrio numérico ou se está a haver, de facto, uma mudança qualitativa no sentido da efetiva igualdade, o advogado assume que “seria muito redutor pensar que isto é só uma questão numérica, pois “se assim fosse estávamos todos a fazer um esforço errado e ir por um caminho errado”. “Não é uma questão de números, mas sim de mérito e de qualidade”. 
Se no início o responsável era contra as cotas, porque defendia o princípio da “meritocracia e da competência”, hoje admite que é necessário “quebrar este ciclo vicioso”, mas admite que as mulheres “não têm confiança, não estão formadas e não têm exemplos a seguir. Este vai ser um caminho longo”. Mas é importante ter em conta a “diversidade, se outra razão não houver pelo negócio, a diversidade vai permitir olhar para as oportunidades de forma diferente. Com a diversidade eu vou estar melhor preparado para atacar e dar respostas ao mercado”. 
Confrontado sobre até que ponto as empresas nacionais estão comprometidas com a promoção da igualdade de género a partir de dentro, Gonçalo Pinto Ferreira afirma que, embora estejamos a falar de empresas públicas e de empresas cotadas na bolsa, a “verdade é que o tecido empresarial português é constituído sobretudo por Pequenas e Médias Empresas (PME), muitas delas familiares, e para estas o desafio é maior, por questões históricas e culturais. É um caminho longo de confiança das próprias mulheres, elas próprias tem de acreditar nelas próprias”. 
Por isso, acrescenta o jurista, temos que olhar com “objetividade para as nossas grelhas salariais, para as condições que damos na empresa, perceber onde está a paridade, onde estão as desigualdades”. Mais, o que a Constituição diz é “que eu tenho de tratar igual o que é igual”, agora também é importante “tratar de forma diferente o que é desigual, não pelo género, não pela raça, não pelas opções sexuais”. “Este vai ser um caminho longo e, portanto, as empresas têm que se preparar já. É importante estar preparado”. 
Ainda assim, o nosso país possui muitas multinacionais, muitas delas americanas, com relevo europeu, com outra mentalidade, e essas entidades têm o mesmo fio condutor em todos os países onde estão presentes. Ou seja, o que está em Espanhaestá na Noruega, é sempre a mesma política. Nesse contexto, o responsável lembra que existem “jurisdições mais evoluídas no Norte da Europa, onde temos por exemplo licença parental de um ano, e isso por si só já é uma diferença muito grande em relação à realidade portuguesa”. 
FERNANDA SILVA TEIXEIRA, fernandateixeira@vidaeconomica.pt, 31/10/2019
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