Governo quer executar mil milhões do Portugal 2020 este ano
O Governo quer executar 1000 milhões de euros do Portugal 2020 durante este ano, revelou o ministro da Economia à “Vida Económica”. Em entrevista em Milão, à margem de uma visita às mais de 97 empresas de calçado e acessórios expositoras na MICAM e MIPEL, o ministro da Economia foi taxativo: “propusemos para 2016 uma meta ambiciosa, que era chegar aos 450 milhões, e, no final de 2016, chegámos aos 477 milhões de euros de fundos atribuídos às empresas. Em 2017, o objetivo é chegar aos 1000 milhões”. O objetivo é “ambicioso”, colocando Portugal “acima da fasquia do QREN”, mas a meta está traçada e, para Manuel Caldeira Cabral, “é um objetivo que queremos atingir”.
Vida Económica – Que balanço faz da execução do Portugal 2020 em 2016 e, concretamente, do COMPETE?
Manuel Caldeira Cabral – Penso que houve uma mudança radical. Quando entrámos, em novembro de 2015, havia quatro milhões de euros do COMPETE pagos às empresas, que são incentivos fundamentais para pôr o investimento a andar. Nós achámos que isso era inaceitável e que tínhamos de acelerar os processos. Havia alguns problemas de pagamentos com o sistema informático que o anterior Governo tinha implementado e nós o que quisemos de uma forma pragmática foi fazer o dinheiro chegar às empresas rapidamente. E o Plano 100, dos primeiros 100 dias de Governo, teve a ver exatamente com isso. Passámos os pagamentos outra vez para o IAPMEI, para as entidades intermédias, porque é um modelo que sabíamos que funcionava. E conseguimos, de facto, nos primeiros 100 dias, não só chegar aos 100 milhões, mas acima disso: aos 116 milhões. Entretanto propusemos para 2016 uma meta ambiciosa, que era chegar aos 450 milhões. E, no final de 2016, chegámos aos 477 milhões de euros de fundos atribuídos às empresas.
VE – Que efeitos práticos é que isto teve na economia?
MCC – O efeito que isto teve é muito importante, porque o facto de as empresas, quando começaram, em janeiro, fevereiro, março [de 2016] a receber dinheiro e a ver que os seus projetos estavam realmente a avançar, teve um efeito de contágio muito grande. E tivemos depois em abril/maio um recorde de candidaturas, ou seja, a ideia de que nos dá é que as próprias empresas, como não estavam a ver o sistema a funcionar em 2015, também não estavam entusiasmadas em avançar com novos investimentos. E quando viram o dinheiro a chegar às empresas e os projetos das empresas que estão ao seu lado a avançarem, concorreram, ganharam confiança. E a seguir esse recorde de candidaturas em abril/maio de 2016 deu também lugar a um recorde de aprovações ao longo do ano e esses investimentos estão já a acontecer e estão já, até, a meu ver, a ter algum reflexo na criação de emprego.
VE – Por que é que diz isso?
MCC – Nós tivemos uma criação muito forte de emprego na indústria transformadora [4% em 2016], num ano em que o Governo estava a entrar a ser ainda muito afetado pelo mercado angolano e pelo mercado brasileiro, com a economia portuguesa a desacelerar. E, ao longo do ano 2016, a economia portuguesa foi acelerando, conseguimos ter no terceiro trimestre o maior crescimento da UE em termos de crescimento em cadeia, estamos a ter um quarto trimestre com um crescimento muito bom, vamos ter um crescimento homólogo que será o mais elevado desde que se iniciou a retoma [1,9%, segundo o INE]. E esse é, de facto, um sinal muito importante de que a economia portuguesa está outra vez a avançar, os empresários estão mais confiantes. Aliás, no final de 2016, as perspetivas de investimento para 2017 dos empresários eram as mais elevadas e isso teve a ver com o trabalho do Governo, com o retomar também da procura interna e o da procura externa, mas também teve a ver com a muita mobilização que fizemos dos fundos comunitários do COMPETE, quer para o investimento, quer para estas ações de internacionalização, porque sabemos que estes apoios, sobretudo para as PME, são muito importantes. As empresas sem eles continuariam a fazer um esforço de internacionalização mas, se calhar, se tivessem de fazer esse esforço sozinhas, vinham a uma ou duas feiras internacionais em vez de irem a três, quatro ou cinco. Estes apoios são uma alavanca que permite chegar mais longe, conseguir mais clientes e abrir mais mercados.
VE – Como vê os resultados das exportações portuguesas em 2016?
MCC – As exportações portuguesas estão a crescer. Aliás, desde o início do ano estiveram sempre a crescer bem para os mercados dentro da UE, mas, neste momento, estão a crescer também para novos mercados fora da UE, com um esforço grande que houve das exportações por parte das empresas.
VE – Voltando ao Portugal 2020, que metas de execução aponta para 2017?
MCC – Se em 2016 atingimos os 477 milhões de euros de fundos atribuídos às empresas, queremos, em 2017, chegar aos 1000 milhões de euros de incentivos. É um objetivo ambicioso, que nos vai colocar acima do que foi a fasquia do QREN, o anterior quadro comunitário de apoio, mas é um objetivo que queremos atingir e que creio que é possível atingir com os mecanismos que tivemos de aceleração dos fundos comunitários e de melhor esclarecimento junto das empresas. E também do que estamos a ver do entusiasmo e da confiança que as empresas têm.
VE – Sente que estão mais confiantes na economia?
MCC - De facto, a confiança que as empresas estão a demonstrar é muito grande, neste momento. Estão a voltar a investir, a voltar a crescer e, principalmente, a fazer investimentos de aumento da capacidade. E isso é muito importante. E é importante no que estamos a ver tanto de empresas portuguesas como no investimento estrangeiro. Durante os anos de ajustamento houve alguns casos de investimentos muito grandes e importantes, mas foram principalmente de compra de empresas e, portanto, em empresas que, no dia seguinte, não estavam a criar novos empregos nem a criar mais capacidade de produção ou de exportação, mas apenas a mudar a propriedade para mãos estrangeiras. E, neste momento, o que estamos a ver é muitas empresas estrangeiras a investirem em Portugal, quer investimentos novos, de raiz, quer as empresas que já estavam instaladas em Portugal há muitos anos e que estão a aumentar a sua capacidade, como é o caso da Volkswagen, da Renault, do grupo PSA, do grupo Continental, do grupo Bosh, de muitos dos grupos já instalados em Portugal e que estão a ver no país um bom momento para expandir e investir. E investir para trazer novas áreas de atividade, como é o caso da investigação, como é o caso do grupo Altice, como a Bosh ou a Siemens, para dar três exemplos, estão a trazer para Portugal centros de investigação e desenvolvimento do produto e não só a produção, porque já reconhecem aos nossos engenheiros e às nossas universidades uma capacidade grande como parceiros nesses processos de investigação e desenvolvimento.
VE – O Governo lançou na última semana o programa de valorização das áreas empresariais. Qual é o montante financeiro associado e que metas de execução tem?
MCC – O montante anunciado foi de 160 milhões de euros. Este é um programa em que o Ministério da Economia está, a par com o Ministério do Planeamento, muito empenhado. As áreas empresariais são muito importantes para criar sinergias para que as empresas, quando se instalam, consigam ter tudo a funcionar à sua volta, em vez de estarem a perder tempo a ter de resolver uma série de assuntos que instalar uma empresa requer. A estes apoios às áreas empresariais associa-se também um esforço muito grande que as autarquias estão a fazer para atrair investimento e facilitar a instalação das empresas. E estes apoios são muito importantes para que se criem condições para que uma empresa que se quer instalar o faça mais rapidamente. E também para que os empresários se concentrem a fazer os produtos que fazem e a conquistar os clientes e os mercados e não a atrasarem com o processo de licenciamento e construção das fábricas. Os espaços que as áreas empresariais oferecem estão já preparados para as unidades industriais, em que, numa conjugação de esforços locais e nacionais, se está a criar o melhor acolhimento possível para as empresas. E isso ajuda muito, quer às empresas portuguesas, quer às estrangeiras que se querem instalar em Portugal. E nós o que queremos é que se instalem com a maior rapidez, sem entraves produtivos e nas melhores condições.
Ministério da Economia injeta
O Ministério Economia anunciou esta semana, através da Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD), que estarão disponíveis 220 milhões de euros na economia, entre fundos de capital de risco e coinvestimento privado, na sequência do concurso de cofinanciamento de fundos de capital de risco.220 milhões de capital de risco nas PME A procura total do concurso, nos vários programas operacionais, ascendeu aos 196 milhões de euros, o dobro da dotação disponível, que era de 98 milhões. O montante total disponibilizado ascende aos 220 milhões de euros. Foram admitidas a concurso 25 entidades gestoras de fundos de capital de risco, em que uma é estrangeira, dez são novos operadores no mercado nacional e sete estão ligadas a grupos empresariais. Os setores mais procurados são as áreas das tecnologias da informação, a Indústria 4.0, a biotecnologia, a farmacêutica, a eficiência energética, a robótica e a eletrónica, a economia circular e as indústrias criativas. |
Efeito Trump nos EUA: “As empresas
têm de se afirmar pela qualidade” “As empresas portuguesas têm demonstrado uma grande capacidade, pela diversificação de mercados, de encontrar novos destinos para as exportações”, afirma o ministro da Economia nesta entrevista. Questionado pela “Vida Económica” sobre como olha para as medidas protecionistas da nova Administração Trump nos Estados Unidos e que efeitos podem ter nas exportações portuguesas, nomeadamente de calçado, para aquele mercado, Manuel Caldeira Cabral é cauteloso. Começa por dizer que “há mercados que estão a crescer muito, como os asiáticos, não só a China mas, também, a Índia, a Indonésia e vários outros”, nos quais “estão a crescer também no número de pessoas que estão na classe média e média alta, que querem produtos de luxo e alta qualidade e que são os produtos nos quais Portugal hoje está especializado”. Ora, esses mercados têm “um enorme potencial de crescimento e podem compensar um eventual menor crescimento noutros mercados mais maduros, como é o mercado europeu ou o norte-americano”, diz o governante, explicando que “as empresas têm encontrado grande capacidade de crescer no mercado americano ou no Canadá ou Japão ou da Coreia, países em que há concorrência das melhores marcas, mas em que as marcas portuguesas se afirmam também e têm estado a conquistar mercado”. Aliás, diz, “nos últimos 10 anos – e isso vem nos relatórios da OCDE -, Portugal teve um crescimento das exportações muito positivo e teve um crescimento de ganhos de quotas de mercado superior inclusive a países que se afirmaram muito na sua competitividade, como é o caso da Alemanha ou a Holanda”. Por essa razão, e “com esse esforço de inovação que as empresas portuguesas fizeram e com a melhoria da qualidade que houve, as empresas portuguesas são hoje muito competitivas, não pelo baixo preço da mão de obra, mas porque produzem com preços competitivos com preços que são iguais aos melhores do mundo, produtos com a mesma qualidade das melhores marcas mundiais e afirmam-se um pouco por todo o mundo”. O mundo, frisa Manuel Caldeira Cabral, “tem muitos mercados que estão a crescer e tem outros que estão a crescer menos”. Por isso, “as empresas têm de se adaptar”. Aliás, “elas têm demonstrado que têm uma grande capacidade de adaptação”. |
* A jornalista viajou a convite da APICCAPS.