O registo da emissão de valores mobiliários: regime e natureza jurídica
I. Nos termos do artigo 43.º/1 do CVM, a emissão de valores mobiliários, por entidade cuja lei pessoal seja a lei portuguesa (n.º 2), independentemente da respetiva natureza jurídica – titulados ou escriturais –, está sujeita a registo junto do emitente. O preceito exclui, do seu campo de aplicação, os valores mobiliários destacados [artigo 1.º, f), do CVM].
O registo da emissão distingue-se do registo dos valores mobiliários em contas individuais dos investidores.
Esta distinção é particularmente nítida no seio dos valores mobiliários destacados: apesar de a sua emissão não se encontrar sujeita a registo, eles serão sempre representados por registo em conta autónoma, salvo se destacados de valores mobiliários titulados. Nesse caso, serão “representados por cupões fisicamente separados do título a partir do qual se constituíram” (46.º/3 e 4 do CVM).
II. Nos termos do artigo 61.º do CVM, o registo individualizado de valores mobiliários escriturais deve constar de: (i) conta aberta junto de intermediário financeiro, integrado em sistema centralizado; conta aberta junto de um único intermediário financeiro indicado pelo emitente; ou (iii) conta aberta junto do emitente ou de intermediário financeiro que o representa. Os valores mobiliários escriturais admitidos à negociação em mercado regulamentado são obrigatoriamente registados junto de intermediário financeiro, integrado em sistema centralizado (62.º).
São obrigatoriamente registados em conta aberta junto de um intermediário financeiro indicado pelo emitente: (i) os valores mobiliários distribuídos através de oferta pública e outros que pertençam à mesma categoria, mesmo que não tenham sido distribuídos através de oferta pública; (ii) os valores mobiliários emitidos conjuntamente por mais de uma entidade; e (iii) as unidades de participação em instituições de investimento coletivo (63.º).
Os valores mobiliários escriturais que não sejam reconduzíveis a nenhuma das situações acima elencadas são registados em conta aberta junto do emitente (64.º/1) ou de intermediário financeiro que o representa (64.º/2, todos do CVM).
III. O registo da emissão terá de conter os elementos mencionados no artigo 44.º e na P n.º 290/2000, de 25 de maio.
O registo da emissão é reproduzido, nos termos do artigo 44.º/3: (i) em conta aberta pelo emitente junto da entidade gestora do sistema centralizado, quando os valores mobiliários se encontrem integrados nesse sistema, alínea a), ou (ii) em conta aberta pelo emitente no intermediário financeiro que presta o serviço de registo dos valores mobiliários escriturais, nos termos do artigo 63.º, alínea b), todos do CVM.
O registo da emissão não é necessário para a emergência de uma nova posição jurídica – p. ex.: acionista, obrigacionista ou participante. Contudo, esse mesmo registo é constitutivo dos valores mobiliários e das posições aí representadas.
Esta afirmação nada tem de contraditório, importa relembrar que as situações jurídicas mobiliárias, sendo indissociáveis dos documentos que as representam, apenas assumem essa natureza com o cumprimento das normas, registais e substantivas, associadas à emissão dos próprios valores mobiliários.
Se previamente ao registo da emissão não é possível negociar a posição jurídica em mercados regulamentados, então, essa posição não pode ser descrita como sendo mobiliária, por não preenchimento dos requisitos legais e doutrinários.
Teremos assim de concluir que o registo da emissão consubstancia o ato de emissão em sentido estrito, i.e., o ato criador de valores mobiliários.
*Doutor em Direito
Professor Auxiliar convidado da Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa