“O setor empresarial não está a ser suficientemente acarinhado”
“Mais de dois terços do investimento em Portugal é realizado pelas empresas”. Em 2017, “97% do emprego líquido por conta de outrem foi gerado por estas empresas”, que “criaram 169 mil novos postos de trabalho” e contribuíram com “56%” para o crescimento do PIB.
Os números foram avançados pelo presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal” durante o congresso que decorreu esta semana, em Santa Maria da feira, sob o lema “O Valor das Empresas”.
Num exclusivo à “Vida Económica” à margem do evento, e questionado sobre se estas não estão a ser suficientemente valorizadas em Portugal, António Saraiva foi incisivo: “essa é a questão”. O setor empresarial, diz, “não está a ser suficientemente acarinhado”.
Os números foram avançados pelo presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal” durante o congresso que decorreu esta semana, em Santa Maria da feira, sob o lema “O Valor das Empresas”.
Num exclusivo à “Vida Económica” à margem do evento, e questionado sobre se estas não estão a ser suficientemente valorizadas em Portugal, António Saraiva foi incisivo: “essa é a questão”. O setor empresarial, diz, “não está a ser suficientemente acarinhado”.
Vida Económica – O vosso congresso tem como lema “O Valor das Empresas”. Qual é esse valor, no atual contexto?
António Saraiva – Escolhemos este lema porque é cada vez mais necessário trazer para sociedade portuguesa aquilo que são as empresas e o seu valor enquanto empregadores e criadores de riqueza, porque é através delas que temos o crescimento económico que todos aplaudimos ter sido registado em 2017. Há sempre os que puxam a brasa à sua sardinha porque [o mérito] é do Governo anterior ou é do atual Governo. Não. O crescimento económico deve-se ao esforço e resiliência dos empresários, ao bom trabalho das empresas, ao aumento das vendas e das exportações, à procura de novos mercados, ao desenvolvimento de novos produtos e à inovação dos mesmos. Esse é o valor das empresas, é o papel que tiveram para o crescimento e que continuarão a ter. Os 169 mil empregos criados foram as empresas que os criaram. Por isso, quando os governos vêm dizer ‘criámos x mil empregos’, neste caso os 169 mil que foram criados, foram as empresas. O Estado não cria emprego. Nalguns casos até tem emprego a mais. Há alguns ministérios onde, como não foi feita a reforma do Estado, que está constantemente adiada, há funcionários públicos a menos e noutros a mais. Mas o criador de emprego são as empresas, é a iniciativa privada.
VE – Por que é que sentem necessidade de realçar isto? O tecido empresarial não está a ser suficientemente valorizado?
AS – Essa é a questão. O tecido empresarial não está a ser suficientemente acarinhado. Acarinhado. O termo diz tudo. Temos de acabar com esta diabolização que a sociedade portuguesa, lamentavelmente, tem com os empresários, este ataque constante dos partidos de esquerda à iniciativa privada. Têm de reconhecer o nosso trabalho. Nos outros países os empresários são acarinhados porque sabem que são eles que criam emprego e riqueza. Neste país, lamentavelmente, fruto de alguns tiques ideológicos que continuam a existir, há um ataque à iniciativa privada e a diabolização dos empresários.
VE – Está a referir-se a quê, concretamente?
AS – Estou a referir-me a ataques de partidos da esquerda parlamentar, quer quanto a algumas medidas, quer quanto a alguma comunicação que emanam para o exterior, de ataque constante aos empresários. Sabemos que há más práticas. Há casos que devem ser condenados, mas isso tanto há do lado dos empregadores como do lado dos trabalhadores. E daí o mérito da concertação social para, em diálogo social, construirmos uma relação moderna e que hoje o tempo nos aconselha com as enormes alterações das sociedades, com a digitalização da economia, com tudo isto. Temos de encontrar um diálogo construtivo. Não podemos, por um mau exemplo, generalizar relativamente aos maus exemplos, como se toda a classe empresarial tivesse cometido erros. Não pode ser. Há maus exemplos, mas a maioria dos empresários são gente abnegada, que arrisca, que emprega, que cria riqueza. Temos de acarinhar estes empreendedores que ousam arriscar todos os dias, em condições dificílimas, com uma envolvente que não é a melhor.
VE – Está em curso a reprogramação do Portugal 2020. Quais devem ser as prioridades na realocação dos fundos?
AS – O Portugal 2020 foi desenhado – e esse era o seu objetivo principal – para a melhoria da competitividade da economia portuguesa. Esta faz-se especialmente pelas empresas e é através delas que deveríamos ter um enfoque especial na reprogramação do Portugal 2020. Essa reprogramação tem de ser direcionada para a melhoria da competitividade e não ser desviada para aspetos públicos, porque, lamentavelmente, temos assistido que os fundos têm sido, nalguns casos, desviados mais para as autarquias do que para as empresas. Não digo que as autarquias, nesta ou naquela circunstância, não tenham de ser apoiadas e terem projetos de desenvolvimento – é óbvio que sim –, mas o foco não pode ser esse, porque o foco do Portugal 2020 era a melhoria da competitividade. E isso faz-se através das empresas. Tem de haver um justo equilíbrio e uma reafetação correta nesse sentido.
VE – Quais são as vertentes que gostaria de ver privilegiadas nesta reprogramação?
AS – Tudo aquilo que vá ao encontro da requalificação dos recursos humanos e tudo o que tenha a ver com a recapitalização das empresas. Necessitamos de exportar mais e isso exige investimento. As nossas empresas estão perante o desafio da digitalização da economia e há que investir, para investir há que ter apoio, para ter apoio há que ter capitais alheios, seja de fundos comunitários ou de apoio da banca e, por isso, a recapitalização das empresas e o apoio ao investimento produtivo e a qualificação/requalificação dos recursos humanos são objetivos que temos de perseguir.
VE – A nova linha ‘Recapitalizar’ [de 1600 milhões de euros] não lhe parece suficiente?
AS – A nova linha ‘Recapitalizar’ há-de ter méritos, ainda não foi suficientemente consumida, tem um desenho que reconhecemos válido, temos de a colocar ainda mais eficazmente no terreno.
VE – No âmbito no Portugal 2020, a CIP identificou vários desafios. Ao nível da política fiscal, por exemplo, o que defendem?
AS – O que queremos, sobretudo, é previsibilidade. Não podemos ter, por cada orçamento do Estado, um quadro fiscal. Este tem de ser simples, previsível e consentâneo, obviamente, com a realidade do país. Portanto, previsibilidade, desde logo, e tentarmos que a reforma do IRC, que estava estudada e validada com o anterior Governo, não seja totalmente abandonada, e consigamos uma melhoria e uma redução gradual, tal como se está a fazer em sede de IRS, para captar investimento.
Presidente da República teme “regresso à guerra fria”
e aos “protecionismos comerciais” O Presidente da República rejeita eleições antecipadas em Portugal e defende a importância da “normal conclusão da legislatura” e da aprovação do Orçamento do Estado para 2019 de modo a que este entre em vigor “a 1 de janeiro”. Disse, aliás, no congresso da CIP que espera “não ter de intervir a não ser para promulgar” o diploma, uma vez que uma crise política “é indesejável”. Elogiando a Confederação pela sua história, percurso e capacidade de “compatibilizar vontades” em “conjunturas exigentíssimas”, olhando para “empresas de geografias variadas e de dimensões muito diferentes”, Marcelo Rebelo de Sousa lembrou não só a realidade interna de Portugal como, também, “o futuro” e “o ambiente externo repleto de interrogações” em que as empresas operam. Disse, aliás, temer “o regresso à guerra fria”, aos “protecionismos comerciais” e aos “choques culturais e civilizacionais”. “Desejamos uma Europa unida, poderosa, reformista, aberta ao mundo, mas tememos indecisões, egoísmos, bloqueamentos e clausuras perigosas” e os seus efeitos, afirmou o Presidente da República. Ao mesmo tempo, também desejou “um Portugal claro, credível nas suas instituições, estável na política, na sociedade, na fiscalidade e nos fatores de contexto”. O chefe de Estado defendeu ainda “proximidade e confiança” por parte dos governantes face aos governados, “mandatos não interrompidos”, assim como “certezas mínimas” nas áreas que “acabam por condicionar a vida de todos: trabalhadores, empresários e gestores”. É com este “pano de fundo” que Marcelo Rebelo de Sousa deseja que “o potencial de crescimento suba” em Portugal, aliado à “literacia, à qualificação, à inovação e à organização”, que são “a chave da competitividade”. |