“Existem muitas oportunidades resultantes quer do momento económico quer da fase de desenvolvimento estrutural”
Managing Partner da ActiveCap – Capital Partners, uma sociedade de capital de risco, especializada no financiamento de empresas com elevado potencial de crescimento, e que atua através da aquisição de posições acionistas em empresas (pequenas e médias empresas e Capitalizações Medias – Small Mid Market), tendencialmente minoritárias, com envolvimento no desenvolvimento da estratégia de crescimento e na valorização das empresas participadas, Pedro Correia da Silva traça uma panorâmica sobre o capital de risco em Portugal
Como se encontra a atual fase do capital de risco em Portugal?
A atividade de capital de risco tem vindo a ganhar expressão, tendo, nomeadamente, existido um aumento significativo de atividade na área das start-up e venture de cariz tecnológico. No entanto, se compararmos com outras economias europeias, existe ainda muito potencial de evolução, quer em dimensão (tem um peso relativo face ao Produto Interno Bruto reduzido) quer em novos segmentos e estratégias mais específicas.
A atual situação económica do país poderá originar a criação de novas oportunidades de negócio para investidores especializados em capital de risco?
Seguramente. Existem muitas oportunidades resultantes quer do momento económico, quer ainda da fase de desenvolvimento estrutural, à semelhança da evolução registada na generalidade das maiores economias europeias. O crescimento e desenvolvimento económico está intrinsecamente associado à evolução e dinamismo do tecido empresarial, tecido este que é o elemento central de atuação dos investidores de capital de risco. Sendo a concorrência empresarial cada vez mais global, o capital de risco tem um papel fundamental em proporcionar condições para as empresas serem mais dinâmicas, mais capitalizadas e de obterem uma dimensão global que lhes garantam uma posição competitiva.
Considera que a cultura portuguesa, tendencialmente adversa ao risco, é um entrave à proliferação da indústria em capital de risco?
Em parte, sendo de separar comportamentos distintos do lado da procura (empresas) e da oferta (investidores/aforradores). Do lado dos empresários, houve uma evolução muito positiva de financiar os seus projetos com mais capital (assumindo mais risco) e com o suporte de recursos humanos que normalmente o capital de risco incorpora. Do lado dos investidores/aforradores, a evolução tem sido mais ténue, onde o próprio nome “capital de risco” releva mais a componente de risco, em detrimento da componente do retorno, sendo que o que realmente importa é a relação entre estas duas componentes, retorno face ao risco. Para os investidores mais atentos a esta relação, o capital de risco é uma alternativa muito atrativa.
O que falta ao tecido empresarial português para aproximar o volume de investimento em capital de risco com a média europeia?
Dimensão é a palavra chave.
A Comissão do Mercado dos Valores Mobiliários (CMVM) tem criticado o peso excessivo da concessão de empréstimos, nomeadamente através de suprimentos, às empresas participadas pelas capitais de risco, (…) “muito próxima da atividade bancária”, em vez de se constituir essencialmente como um instrumento de reforço de capitais próprios. Qual a sua opinião?
É uma situação que reflete em parte o grau de desenvolvimento ainda incipiente e um número limitado de operadores e de estratégias.
As recentes estatísticas notam que o investimento em capital de risco no setor imobiliário ganhou um maior peso no último ano, em resultado da dinâmica recente do mercado imobiliário em Portugal. Considera que este mercado ainda permite “geração de elevado valor acrescentado”?
Apesar da recente dinâmica e apreciação do mercado imobiliário, considero que a implementação de estratégias de melhoria operacional permite ainda gerar valor acrescentado, mesmo que mais seletivamente. O capital de risco adota posturas ativas de melhorias operacionais, sendo essencialmente através dessas que se obtêm os superiores retornos.
Que avaliação faz do surgimento de instrumentos híbridos, tais como os que misturam capitais próprios com dívida ou obrigações convertíveis?
São mecanismos normalmente usados para encontrar soluções entre posições distantes das partes, muitas vezes permitindo ganhar tempo, mais visibilidade e até reduzir diferenças de expectativas de riscos ou de valorização. Quando utilizados corretamente, têm um papel fundamental para a capacidade de execução de investimentos.
Os fundos estrangeiros têm interesse por Portugal? E quanto aos demais países lusófonos?
Existem comportamentos mistos. Temos verificado muito interesse face ao potencial de crescimento e valorização, precisamente devido ao estádio económico, quando comparado com a evolução histórica de outras economias. Por outro lado, a reduzida dimensão (somos uma pequena economia no contexto global) tem retirado interesse de vários fundos que exigem uma dimensão mínima superior às oportunidades que existem. Quanto aos restantes países lusófonos, o mesmo racional do estádio de desenvolvimento e dimensão é aplicável.
Há falta de empresas com dimensão para serem adquiridas?
Há falta de empresas com dimensão. Para serem adquiridas ou não.
Considera que o momento pós-crise trouxe fundos institucionais, com maior credibilidade e menor oportunismo?
Talvez só agora iremos assistir à vinda de investidores “mais institucionais”, na medida em que existe uma melhor perceção internacional e também devido ao facto de as oportunidades existentes exigirem mais estratégias de valor acrescentado.
Quais as áreas de investimento mais significativas? Energia e turismo?
Apesar de existirem algumas áreas de atividade que no passado recente se têm vindo a sobressair, como o turismo, os grandes desafios de inovação tecnológica e concorrência global afetam a generalidade dos setores. Em Portugal, o turismo será sempre um setor relevante, mas existem muitas oportunidades de investimento na indústria, assim como nos serviços de base tecnológica.
Quais as áreas nas quais se perspetivam grandes oportunidades futuras? Dívida empresarial e reestruturação?
A dívida empresarial (private debt) tem sido das áreas com maior crescimento na Europa, assim como as estratégias de ativos reais/recursos naturais e infraestruturas.
E posições de controlo em empresas, pode ser interessante?
Faz parte do core do capital de risco e terá sempre um papel fundamental nesta atividade. Atualmente, a elevada disponibilidade de capital neste segmento na Europa tem aumentado a concorrência entre os operadores pelas mesmas oportunidades, o que eleva os preços pagos e provavelmente reduzindo o retorno potencial.
Há estabilidade legislativa e fiscal?
No que afeta diretamente os fundos de capital de risco, tem havido estabilidade, e é fundamental que nesta fase de crescimento esta se mantenha. No entanto, a instabilidade fiscal do lado das empresas (que é onde os fundos investem) afeta muito negativamente a perceção dos investidores, em geral, mais significativamente dos internacionais.
O possível fim das taxas de juro atrativas é positivo?
Se a normalização do nível das taxas de juro for resultado de uma maior estabilidade e sustentabilidade do crescimento económico, pode ser visto como positivo. Mas existem riscos.
Como se perspetiva o ano 2019?
Mais desafiante e necessariamente mais seletivo, exigindo seleção de investimentos mais conservadores para que alterações no ciclo não impactem nos objetivos de retorno. Neste contexto, existem estratégias que muito provavelmente terão retornos superiores face à fase atual do ciclo, nomeadamente as que estiverem sustentadas em projetos específicos e menos no crescimento global.
No que difere a gestão de clientes particulares e institucionais?
Uma das principais características do capital de risco é o tempo necessário para que estas estratégias tenham os resultados pretendidos. Normalmente, a média das maturidades dos fundos de capital de risco anda próxima dos 10 anos. É exatamente neste contexto onde a diferenciação entre clientes particulares e institucionais é mais relevante. Os clientes institucionais, pela dimensão e diversificação, são mais propensos a investir em ativos menos líquidos, pela contrapartida de maiores retornos. Os clientes particulares necessitam de dimensão para poderem alocar e comprometer capital a prazos longos, o que quase sempre significa aceitar manter o capital investido pelas diversas fases dos ciclos económicos.
Algumas start-ups têm falido. Este ainda é um investimento interessante para o Capital de Risco?
Faz parte do conceito do setor e não se estranha por definição que algumas tenham muito sucesso e outras não. O que releva é se no cômputo geral os retornos agregados são atrativos. Neste sentido, haverá anos melhores do que outros, mas é um investimento atrativo e adequado para um determinado perfil de investidores.
A CMVM indicou em dezembro que o valor gerido pelo capital de risco aumentou 1,2% em 2017 para 4,5 mil milhões de euros, montante este que corresponde a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) a preços correntes, sendo que a evolução resulta sobretudo da performance dos fundos de capital de risco. Como vê estes dados do setor?
Tendo o valor gerido aumentado via a performance dos fundos, resulta que estes obtiveram performances positivas e que o contributo destas foi mais determinante para o aumento do valor do que as novas subscrições de capital por parte dos investidores. De referir que a performance dos fundos de capital de risco tem sido sustentadamente superior à performance dos mercados accionistas cotados (segundo dados do setor).
Quais os problemas estruturais que podem ser encontrados em Portugal?
Salientava dois com impacto direto nesta atividade: i) A muito reduzida alocação das poupanças dos aforradores nacionais (direta e indiretamente) para o investimento na economia nacional, ainda mais relevante quando em termos agregados temos um nível de poupança baixo; ii) Uma fraca perceção do impacto positivo do capital de risco na atividade económica, quando este é fundamental para elevar o nível de investimento, as exportações e ainda a criação de emprego.