Obrigações contabilísticas impostas às PME são excessivas
A contabilidade assume um papel essencial na atividade das empresas, incluindo nas de menor dimensão. No entanto, o que se verifica atualmente é que as obrigações impostas às PME são excessivas e a relação custo-benefício é questionável, defende Luís Gaspar, managing partner da Mazars Portugal, em entrevista à “Contabilidade & Empresas”. Quanto ao Orçamento do Estado, admite que não existe uma linha condutora em termos de política fiscal, já que as medidas são avulsas. A redução da carga fiscal e dos custos de contexto continua a ser uma possibilidade adiada, o que trava a competitividade das empresas.
Contabilidade & Empresas - Tendo em conta a vossa experiência, como encaram a contabilidade a nível nacional? Quais os principais problemas que se colocam e quais as oportunidades que existem?
Luís Gaspar - Não obstante as evoluções positivas que em termos regulamentares têm existido, a verdade é que continua a existir uma tónica importante nas grandes empresas. Frequentemente, as obrigações impostas às pequenas organizações são excessivas para a sua capacidade e com uma relação custo-benefício questionável. Um dos principais problemas é a dimensão média dos prestadores de serviços nesta área, que também é demasiado reduzida para poderem ser agregadas todas as competências de que as organizações necessitam.
CE - A Comissão de Normalização Contabilística está a desenvolver adequadamente as suas competências ou deveria ser mais rápida? Ir mais longe no SNC?
LG - A estabilidade é fundamental para a existência de informação financeira comparável porque só esta permite identificar padrões suscetíveis de intervenção e melhoria para as empresas. O alinhamento com as práticas internacionais evoluiu significativamente, pelo que é importante reduzir o volume de alterações ao indispensável, tendo sempre em atenção o esforço de simplificação para as pequenas e médias empresas. A prática profissional tem de evoluir num cenário de maior urgência do que propriamente a regulamentação em termos contabilísticos.
CE - As empresas tiram proveito efetivo das competências dos Contabilistas Certificados?
LG – Provavelmente, a questão mais complexa, dado que, por um lado, muitos dos empreendedores ainda não têm completa noção da importância que pode ter o apoio do Contabilista Certificado; por outro lado, nem todos os Contabilistas Certificados têm agregadas nas suas equipas o conjunto de competências necessárias ao apoio mais alargado às empresas.
Seria importante que o nível de exigência das empresas aumentasse, assim como a diversidade de competências dos Contabilistas Certificados.
Contabilistas “versus” gestão empresarial
CE - A intervenção dos contabilistas na gestão empresarial é uma necessidade?
LG - Quanto menor for a organização, maior é a necessidade da intervenção e do apoio à gestão decorrente das competências dos Contabilistas Certificados. Em muitas organizações de pequena e média dimensão, o nível de comunicação entre a gestão e o Contabilista Certificado é ainda incipiente com responsabilidades de ambos os lados. A informação de gestão é determinante e nas pequenas organizações estará essencialmente a ser gerida fora da estrutura central, pelo que o reforço de comunicação e interação entre os responsáveis pela gestão e contabilista certificado trará vantagens a ambos. Um movimento de maior agregação dos prestadores de serviços pode permitir a constituição de equipas mais capacitadas e multidisciplinares, que assegurarão também melhores serviços e de maior utilidade para as empresas. O reforço ao nível da formação é também determinante para se conseguir alcançar este objectivo.
CE - A contabilidade está devidamente regulamentada ou há ainda muito a fazer?
LG - O alinhamento internacional evoluiu significativamente nos últimos anos. O mercado das empresas é cada vez mais um mercado global e, dessa forma, é importante mantermos regulamentos alinhados internacionalmente. As alterações, a existirem, devem circunscrever-se àquelas que acrescentem comparabilidade com as empresas originárias de outros países e que partilhem o mesmo mercado internacional.
CE - Qual a vossa opinião sobre o OE para 2019?
LG - As alterações fiscais promovidas pelo OE para 2019 são avulsas e não permitem vislumbrar qualquer política fiscal por parte do Governo, não resultando, deste documento, uma ideia, uma visão de médio/longo prazo para o nosso país do ponto de vista de competitividade económica e fiscal. Pelo contrário, consideramos que este tema está a ser gerido numa perspetiva imediatista, existindo uma clara preocupação com a manutenção (até aumento) da receita fiscal. Infelizmente, quando a conjuntura internacional não for a melhor e já estando a carga fiscal em níveis para além do aconselhável, vai ser necessária imaginação para criar novas formas de manter a receita fiscal e muita resiliência aos portugueses para, querendo, a suportarem.
Empresas fiscalmente mais competitivas
CE - O que é necessário fazer para tornar as empresas fiscalmente mais competitivas?
LG - A resposta imediata a essa pergunta seria a promoção da redução dos impostos e dos custos de contexto que cada vez mais assombram o dia a dia das nossas empresas (as obrigações declarativas continuam infelizmente a proliferar). Contudo, e mesmo tendo em conta a redução da taxa nominal do IRC ser uma hipótese a considerar, bem como o fim daquela medida provisória tendencialmente perpétua que se tornou a derrama estadual também ser aconselhável, a solução passa, sobretudo, por uma mudança de “mindset” dos nossos líderes em relação à política fiscal e ao papel das instituições relacionadas. De facto, o que, na nossa opinião, preocupa mais os empresários e investidores é a falta de estabilidade fiscal e a falta de confiança nas instituições – neste caso, Fisco e Tribunais, cuja visão é, no mínimo, inconsistente e a atuação tipicamente demorada.
CE – Pode-se fazer muito mais no que respeita à tão necessária estabilidade fiscal?
LG - No que se refere à estabilidade fiscal, produzir um “business plan” para uma empresa/investimento em Portugal é mais uma ação de pura adivinhação do que um exercício de gestão, considerando as inúmeras alterações fiscais e parafiscais que, certamente, nos vão continuar a infligir todos os anos e várias vezes ao ano, pelo que, chegados a este estado de necessidade, os empresários/investidores estão mais preocupados com a manutenção de um enquadramento (mesmo que mau) para poderem tomar decisões conscientes relativamente aos seus negócios e aos seus investimentos. Já no que respeita ao comportamento da autoridade tributária, temos assistido de forma crescente e preocupante a posições da autoridade tributária diametralmente opostas para a mesma questão técnica consoante o sujeito passivo, temos assistido ao procedimento de publicação/não publicação de respostas a pedidos de informação vinculativas sem seguir o critério previsto na lei, temos assistido ao posicionamento técnico da autoridade tributária em sentido contrário ao que resulta da lei e, por vezes, das suas próprias circulares/ofícios-circulados (para quem tiver interesse, debruce-se sobre o tema à volta do artigo 69/10 do Código do IRC e a surpreendente “evolução” técnica da autoridade tributária). Em suma, alguma estabilidade e coerência por parte da autoridade tributária facilitariam, uma vez que, como sabemos, atendendo à morosidade da justiça, os empresários/investidores preferem não ter que contar com ela.
CE – Portanto, na sua opinião, a carga fiscal continua excessiva…
LG - Remetendo para os comentários anteriores, a carga fiscal continua efetivamente excessiva, sobretudo face ao retorno para os contribuintes e para a sociedade. Num momento em que tanto se discute e louva o empreendedorismo, no nosso entendimento, o atual ordenamento fiscal português não promove nem a iniciativa privada nem o mérito, desencorajando os contribuintes de uma postura dinâmica e de criação de valor.
Posicionamento no mercado nacional
CE - Como opera a Mazars no mercado nacional?
LG - A Mazars opera no mercado nacional com mais de 150 profissionais, 3 escritórios em Lisboa, Porto e Leiria, oferecendo serviços nos domínios do Audit, Consulting, Financial Advisory Services, Tax e Accounting & Outsourcing. Em termos globais, a Mazars é um partnership integrado com mais de 23.000 profissionais em cerca de 300 escritórios de 89 países, que tem como principal objetivo ser um verdadeiro “challenger” no nosso mercado de atuação e em todas as geografias onde estamos presentes.
CE – Como surgiu a Mazars e qual o trajeto seguido nos últimos anos?
LG – Ao longo dos últimos 75 anos, a Mazars experienciou um crescimento contínuo e ininterrupto, que atribui ao seu modelo único e integrado. A empresa, que iniciou a sua atividade como um pequeno gabinete de contabilidade em Rouen, no ano de 1945, e cujo projeto internacional se iniciou em 1995, tornou-se num reconhecido e “player” internacional, contando com quase 23 mil colaboradores em 89 países e territórios, sem nunca perder os seus valores ou comprometer os seus princípios fundadores. A empresa cresceu para se tornar numa entidade especializada em auditoria e contabilidade, em França. Depois da expansão na Europa, a empresa, há cerca de década e meia, entrou nos mercados asiático, africano e americano.
CE – Como se posiciona no atual contexto de mercado?
LG - Num contexto de mudança sem precedentes, a Mazars encontra-se a acelerar a sua transformação para ajudar os gestores a navegar com confiança uma confluência de reformas regulatórias, disrupção digital e volatilidade geopolítica, que colocam uma enorme pressão e complexidade no modo como as organizações conseguem conformidade, performance e sustentabilidade.Face à desconfiança que existe no setor, a Mazars tem a responsabilidade de repor e assegurar essa mesma confiança por parte de todos os intervenientes.
Luís Gaspar - Não obstante as evoluções positivas que em termos regulamentares têm existido, a verdade é que continua a existir uma tónica importante nas grandes empresas. Frequentemente, as obrigações impostas às pequenas organizações são excessivas para a sua capacidade e com uma relação custo-benefício questionável. Um dos principais problemas é a dimensão média dos prestadores de serviços nesta área, que também é demasiado reduzida para poderem ser agregadas todas as competências de que as organizações necessitam.
CE - A Comissão de Normalização Contabilística está a desenvolver adequadamente as suas competências ou deveria ser mais rápida? Ir mais longe no SNC?
LG - A estabilidade é fundamental para a existência de informação financeira comparável porque só esta permite identificar padrões suscetíveis de intervenção e melhoria para as empresas. O alinhamento com as práticas internacionais evoluiu significativamente, pelo que é importante reduzir o volume de alterações ao indispensável, tendo sempre em atenção o esforço de simplificação para as pequenas e médias empresas. A prática profissional tem de evoluir num cenário de maior urgência do que propriamente a regulamentação em termos contabilísticos.
CE - As empresas tiram proveito efetivo das competências dos Contabilistas Certificados?
LG – Provavelmente, a questão mais complexa, dado que, por um lado, muitos dos empreendedores ainda não têm completa noção da importância que pode ter o apoio do Contabilista Certificado; por outro lado, nem todos os Contabilistas Certificados têm agregadas nas suas equipas o conjunto de competências necessárias ao apoio mais alargado às empresas.
Seria importante que o nível de exigência das empresas aumentasse, assim como a diversidade de competências dos Contabilistas Certificados.
Contabilistas “versus” gestão empresarial
CE - A intervenção dos contabilistas na gestão empresarial é uma necessidade?
LG - Quanto menor for a organização, maior é a necessidade da intervenção e do apoio à gestão decorrente das competências dos Contabilistas Certificados. Em muitas organizações de pequena e média dimensão, o nível de comunicação entre a gestão e o Contabilista Certificado é ainda incipiente com responsabilidades de ambos os lados. A informação de gestão é determinante e nas pequenas organizações estará essencialmente a ser gerida fora da estrutura central, pelo que o reforço de comunicação e interação entre os responsáveis pela gestão e contabilista certificado trará vantagens a ambos. Um movimento de maior agregação dos prestadores de serviços pode permitir a constituição de equipas mais capacitadas e multidisciplinares, que assegurarão também melhores serviços e de maior utilidade para as empresas. O reforço ao nível da formação é também determinante para se conseguir alcançar este objectivo.
CE - A contabilidade está devidamente regulamentada ou há ainda muito a fazer?
LG - O alinhamento internacional evoluiu significativamente nos últimos anos. O mercado das empresas é cada vez mais um mercado global e, dessa forma, é importante mantermos regulamentos alinhados internacionalmente. As alterações, a existirem, devem circunscrever-se àquelas que acrescentem comparabilidade com as empresas originárias de outros países e que partilhem o mesmo mercado internacional.
CE - Qual a vossa opinião sobre o OE para 2019?
LG - As alterações fiscais promovidas pelo OE para 2019 são avulsas e não permitem vislumbrar qualquer política fiscal por parte do Governo, não resultando, deste documento, uma ideia, uma visão de médio/longo prazo para o nosso país do ponto de vista de competitividade económica e fiscal. Pelo contrário, consideramos que este tema está a ser gerido numa perspetiva imediatista, existindo uma clara preocupação com a manutenção (até aumento) da receita fiscal. Infelizmente, quando a conjuntura internacional não for a melhor e já estando a carga fiscal em níveis para além do aconselhável, vai ser necessária imaginação para criar novas formas de manter a receita fiscal e muita resiliência aos portugueses para, querendo, a suportarem.
Empresas fiscalmente mais competitivas
CE - O que é necessário fazer para tornar as empresas fiscalmente mais competitivas?
LG - A resposta imediata a essa pergunta seria a promoção da redução dos impostos e dos custos de contexto que cada vez mais assombram o dia a dia das nossas empresas (as obrigações declarativas continuam infelizmente a proliferar). Contudo, e mesmo tendo em conta a redução da taxa nominal do IRC ser uma hipótese a considerar, bem como o fim daquela medida provisória tendencialmente perpétua que se tornou a derrama estadual também ser aconselhável, a solução passa, sobretudo, por uma mudança de “mindset” dos nossos líderes em relação à política fiscal e ao papel das instituições relacionadas. De facto, o que, na nossa opinião, preocupa mais os empresários e investidores é a falta de estabilidade fiscal e a falta de confiança nas instituições – neste caso, Fisco e Tribunais, cuja visão é, no mínimo, inconsistente e a atuação tipicamente demorada.
CE – Pode-se fazer muito mais no que respeita à tão necessária estabilidade fiscal?
LG - No que se refere à estabilidade fiscal, produzir um “business plan” para uma empresa/investimento em Portugal é mais uma ação de pura adivinhação do que um exercício de gestão, considerando as inúmeras alterações fiscais e parafiscais que, certamente, nos vão continuar a infligir todos os anos e várias vezes ao ano, pelo que, chegados a este estado de necessidade, os empresários/investidores estão mais preocupados com a manutenção de um enquadramento (mesmo que mau) para poderem tomar decisões conscientes relativamente aos seus negócios e aos seus investimentos. Já no que respeita ao comportamento da autoridade tributária, temos assistido de forma crescente e preocupante a posições da autoridade tributária diametralmente opostas para a mesma questão técnica consoante o sujeito passivo, temos assistido ao procedimento de publicação/não publicação de respostas a pedidos de informação vinculativas sem seguir o critério previsto na lei, temos assistido ao posicionamento técnico da autoridade tributária em sentido contrário ao que resulta da lei e, por vezes, das suas próprias circulares/ofícios-circulados (para quem tiver interesse, debruce-se sobre o tema à volta do artigo 69/10 do Código do IRC e a surpreendente “evolução” técnica da autoridade tributária). Em suma, alguma estabilidade e coerência por parte da autoridade tributária facilitariam, uma vez que, como sabemos, atendendo à morosidade da justiça, os empresários/investidores preferem não ter que contar com ela.
CE – Portanto, na sua opinião, a carga fiscal continua excessiva…
LG - Remetendo para os comentários anteriores, a carga fiscal continua efetivamente excessiva, sobretudo face ao retorno para os contribuintes e para a sociedade. Num momento em que tanto se discute e louva o empreendedorismo, no nosso entendimento, o atual ordenamento fiscal português não promove nem a iniciativa privada nem o mérito, desencorajando os contribuintes de uma postura dinâmica e de criação de valor.
Posicionamento no mercado nacional
CE - Como opera a Mazars no mercado nacional?
LG - A Mazars opera no mercado nacional com mais de 150 profissionais, 3 escritórios em Lisboa, Porto e Leiria, oferecendo serviços nos domínios do Audit, Consulting, Financial Advisory Services, Tax e Accounting & Outsourcing. Em termos globais, a Mazars é um partnership integrado com mais de 23.000 profissionais em cerca de 300 escritórios de 89 países, que tem como principal objetivo ser um verdadeiro “challenger” no nosso mercado de atuação e em todas as geografias onde estamos presentes.
CE – Como surgiu a Mazars e qual o trajeto seguido nos últimos anos?
LG – Ao longo dos últimos 75 anos, a Mazars experienciou um crescimento contínuo e ininterrupto, que atribui ao seu modelo único e integrado. A empresa, que iniciou a sua atividade como um pequeno gabinete de contabilidade em Rouen, no ano de 1945, e cujo projeto internacional se iniciou em 1995, tornou-se num reconhecido e “player” internacional, contando com quase 23 mil colaboradores em 89 países e territórios, sem nunca perder os seus valores ou comprometer os seus princípios fundadores. A empresa cresceu para se tornar numa entidade especializada em auditoria e contabilidade, em França. Depois da expansão na Europa, a empresa, há cerca de década e meia, entrou nos mercados asiático, africano e americano.
CE – Como se posiciona no atual contexto de mercado?
LG - Num contexto de mudança sem precedentes, a Mazars encontra-se a acelerar a sua transformação para ajudar os gestores a navegar com confiança uma confluência de reformas regulatórias, disrupção digital e volatilidade geopolítica, que colocam uma enorme pressão e complexidade no modo como as organizações conseguem conformidade, performance e sustentabilidade.Face à desconfiança que existe no setor, a Mazars tem a responsabilidade de repor e assegurar essa mesma confiança por parte de todos os intervenientes.