Comentário às recentes alterações ao regime jurídico do arrendamento urbano
Pedro Teixeira de Sousa
André Mena Hüsgen
André Mena Hüsgen
As recentes alterações ao regime jurídico do arrendamento urbano, introduzidas pelas Leis n.º 12/2019 (“Lei 12/2019”) e n.º 13/2019 (“Lei 13/2019”), de 12 de fevereiro do presente ano, têm por objetivo, conforme expressamente assinalam os diplomas, reforçar os direitos do arrendatário na relação contratual com o senhorio, bem como a segurança e estabilidade do arrendamento. No presente artigo pretendemos fazer uma breve análise de algumas das principais alterações introduzidas pelos referidos diplomas.
Lei 12/2019
Assédio do arrendatário e subarrendatário
A Lei 12/2019 regula a matéria do “assédio” nos contratos de arrendamento e subarrendamento. Para este efeito, entende-se como assédio qualquer comportamento ilegítimo “que, com o objetivo de provocar a desocupação do locado, perturbe, constranja ou afete a dignidade do arrendatário, subarrendatário ou das pessoas que com estes residam legitimamente no locado, os sujeite a um ambiente intimidativo, hostil, degradante, perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo, ou impeça ou prejudique gravemente o acesso e a fruição do locado”.
Neste contexto, proíbe-se expressamente o assédio não só por parte do senhorio, mas também por parte de quem o represente ou de um terceiro interessado na aquisição ou comercialização do imóvel arrendado.
Intimações e injunções dirigidas ao senhorio
Em acréscimo e sem prejuízo da responsabilização civil, criminal ou contraordenacional do senhorio, nos termos gerais, a Lei 12/2019 confere ao arrendatário a faculdade de intimar o senhorio à pratica ou à omissão de certos atos, nomeadamente a cessar a prática de atos suscetíveis de causar prejuízo para a saúde do arrendatário e para as pessoas que com este vivam em economia comum, ou a corrigir deficiências do locado que constituam risco grave para a saúde e segurança de pessoas e bens, ou que impeçam a fruição do locado e o acesso ao mesmo.
Salvo justificação em contrário, o senhorio deverá, no prazo de 30 dias a contar da receção da intimação, demonstrar mediante comunicação enviada ao arrendatário a adoção das medidas necessárias para corrigir os problemas indicados pelo arrendatário. Em caso de falta de resposta do senhorio, ou de manutenção injustificada das situações denunciadas pelo arrendatário, este poderá requerer uma injunção contra o senhorio para correção da situação e exigir-lhe o pagamento diário de J20,00. Note-se que esta sanção pecuniária é elevada para J30,00 por dia quando o arrendatário tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60%.
Lei 13/2019
Por sua vez, a Lei 13/2019 enuncia como objetivo a introdução de medidas para correção de situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios e reforço da segurança e estabilidade do arrendamento urbano, bem como para proteção de arrendatários em situação de especial fragilidade.
Alterações às Regras do Arrendamento Urbano constantes do Código Civil
Redução do montante de indemnização em caso de mora
Em caso de mora do locatário no pagamento da renda, o locador tinha direito a exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que lhe era devido, salvo se o contrato fosse resolvido pelo locador com base na falta de pagamento. Com a aprovação da Lei 13/2019, o montante da indemnização foi reduzido para 20% do valor em dívida.
Forma do contrato
O artigo 1069.º, n.º 1, do Código Civil estipula a obrigatoriedade de o contrato de arrendamento ser celebrado por escrito. Contudo, a nova redação do n.º 2 do referido artigo prevê a proteção do arrendatário quando a falta de redução a escrito do contrato de arrendamento não lhe seja imputável. Assim, nesse caso, o arrendatário poderá provar a existência de um contrato de arrendamento não escrito, demonstrando que utilizou o locado sem oposição do senhorio e que pagou a respetiva renda por um período mínimo de seis meses.
Duração do contrato
Uma das principais alterações da Lei 13/2019 prende-se com a definição de um prazo de duração mínima dos contratos de arrendamento para fins habitacionais (solução que já anteriormente vigorou no ordenamento jurídico português, mas que tinha sido abandonada por forma a flexibilizar a celebração dos contratos de arrendamento). Com efeito, prevê-se agora que o contrato de arrendamento para fins habitacionais não poderá ser celebrado por prazo inferior a um ano. Tal limite não será, contudo, aplicável “aos contratos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios, designadamente por motivos profissionais, de educação e formação ou turísticos, neles exarados”, recuperando-se, também aqui, conceitos anteriormente vigentes no nosso ordenamento jurídico.
Extinção do contrato de arrendamento
Oposição à renovação
Com a nova redação do n.º 3 do artigo 1097.º do Código Civil, a oposição à primeira renovação do contrato de arrendamento para fins habitacionais, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data. Todavia, tal regra não será aplicável se o senhorio necessitar do locado para nele habitar, ou para habitação dos seus descendentes em primeiro grau.
No caso de contratos de arrendamento para fins não habitacionais, dispõe o n.º 4 do artigo 1110.º do Código Civil que o senhorio não pode opor-se à renovação do contrato durante os primeiros cinco anos da sua vigência.
Cremos tratar-se de soluções que poderão desincentivar a colocação de imóveis, por parte dos respetivos proprietários, no mercado de arrendamento, pelo que importará acompanhar e medir de forma atenta os seus efeitos.
Denúncia
Alarga-se de dois para cinco anos o prazo geral de pré-aviso para denúncia, por parte do senhorio, de contratos de arrendamento que, nos termos da lei, se considerem celebrados por duração indeterminada. Acresce que esta denúncia deverá ser confirmada, sob pena de ineficácia, através de nova comunicação do senhorio efetuada com a antecedência máxima de 15 meses e mínima de um ano relativamente à data da sua efetivação, o que torna mais exigente e burocrático o processo de denúncia do contrato de arrendamento.
Além disso, foi restringida a possibilidade de denúncia, pelo senhorio, dos contratos de duração indeterminada com fundamento na realização de obras de remodelação ou restauro profundo. Em particular, as referidas obras só poderão justificar a denúncia do contrato desde que delas resulte um local com características diferentes do locado, onde não seja possível manter o arrendamento.
No caso de arrendamentos para fins não habitacionais, se o senhorio denunciar o contrato de arrendamento com pré-aviso de cinco anos ou para realização de obras de remodelação ou restauro profundo, ficará obrigado a indemnizar separadamente o arrendatário e os trabalhadores do estabelecimento pelos prejuízos que resultem da cessação do contrato de arrendamento.
De referir, ainda, que a inobservância dos prazos de pré-aviso para oposição à renovação e denúncia do contrato de arrendamento para fins habitacionais, por parte do arrendatário, não o obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta quando for motivada por uma situação de desemprego involuntário, de incapacidade permanente para o trabalho ou por morte do arrendatário ou de pessoa que com este viva em economia comum há mais de um ano.
Outras Alterações
NRAU
A Lei 13/2019 efetuou, também, alterações à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano. Destaca-se, em particular, a concretização do procedimento de injunção previsto na Lei 12/2019, tendo sido criado, junto da Direção-Geral da Administração da Justiça, o Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), destinado a assegurar a tramitação da injunção em matéria de arrendamento.
RJOPA
Por último, a Lei 13/2019 alterou também as disposições do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto. Neste contexto, recorde-se que o senhorio não pode, atualmente, denunciar o contrato quando pretenda realizar obras de remodelação ou restauro profundos, que resultem em local com “características equivalentes às do locado” (alínea b) do artigo 1101.º do Código Civil).
Conclusões
As alterações ao regime jurídico do arrendamento urbano, especialmente as operadas pela Lei 13/2019, têm um impacto significativo no instituto do arrendamento urbano, diminuindo a liberdade das partes na definição do regime contratual (que era particularmente acentuada nos contratos de arrendamento para fins não habitacionais) e alterando materialmente pontos essenciais do regime, como a duração mínima dos contratos de arrendamento para fins habitacionais.
Por outro lado, estas alterações poderão ter um impacto significativo no mercado de arrendamento urbano, nomeadamente na vontade dos proprietários em arrendar os seus imóveis, não só em face das imposições acrescidas do regime do arrendamento urbano, mas também por via da possível perda de competitividade do instituto do arrendamento em face de formas alternativas de obtenção de rendimentos prediais (como a exploração de estabelecimentos de alojamento local).
Lei 12/2019
Assédio do arrendatário e subarrendatário
A Lei 12/2019 regula a matéria do “assédio” nos contratos de arrendamento e subarrendamento. Para este efeito, entende-se como assédio qualquer comportamento ilegítimo “que, com o objetivo de provocar a desocupação do locado, perturbe, constranja ou afete a dignidade do arrendatário, subarrendatário ou das pessoas que com estes residam legitimamente no locado, os sujeite a um ambiente intimidativo, hostil, degradante, perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo, ou impeça ou prejudique gravemente o acesso e a fruição do locado”.
Neste contexto, proíbe-se expressamente o assédio não só por parte do senhorio, mas também por parte de quem o represente ou de um terceiro interessado na aquisição ou comercialização do imóvel arrendado.
Intimações e injunções dirigidas ao senhorio
Em acréscimo e sem prejuízo da responsabilização civil, criminal ou contraordenacional do senhorio, nos termos gerais, a Lei 12/2019 confere ao arrendatário a faculdade de intimar o senhorio à pratica ou à omissão de certos atos, nomeadamente a cessar a prática de atos suscetíveis de causar prejuízo para a saúde do arrendatário e para as pessoas que com este vivam em economia comum, ou a corrigir deficiências do locado que constituam risco grave para a saúde e segurança de pessoas e bens, ou que impeçam a fruição do locado e o acesso ao mesmo.
Salvo justificação em contrário, o senhorio deverá, no prazo de 30 dias a contar da receção da intimação, demonstrar mediante comunicação enviada ao arrendatário a adoção das medidas necessárias para corrigir os problemas indicados pelo arrendatário. Em caso de falta de resposta do senhorio, ou de manutenção injustificada das situações denunciadas pelo arrendatário, este poderá requerer uma injunção contra o senhorio para correção da situação e exigir-lhe o pagamento diário de J20,00. Note-se que esta sanção pecuniária é elevada para J30,00 por dia quando o arrendatário tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60%.
Lei 13/2019
Por sua vez, a Lei 13/2019 enuncia como objetivo a introdução de medidas para correção de situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios e reforço da segurança e estabilidade do arrendamento urbano, bem como para proteção de arrendatários em situação de especial fragilidade.
Alterações às Regras do Arrendamento Urbano constantes do Código Civil
Redução do montante de indemnização em caso de mora
Em caso de mora do locatário no pagamento da renda, o locador tinha direito a exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que lhe era devido, salvo se o contrato fosse resolvido pelo locador com base na falta de pagamento. Com a aprovação da Lei 13/2019, o montante da indemnização foi reduzido para 20% do valor em dívida.
Forma do contrato
O artigo 1069.º, n.º 1, do Código Civil estipula a obrigatoriedade de o contrato de arrendamento ser celebrado por escrito. Contudo, a nova redação do n.º 2 do referido artigo prevê a proteção do arrendatário quando a falta de redução a escrito do contrato de arrendamento não lhe seja imputável. Assim, nesse caso, o arrendatário poderá provar a existência de um contrato de arrendamento não escrito, demonstrando que utilizou o locado sem oposição do senhorio e que pagou a respetiva renda por um período mínimo de seis meses.
Duração do contrato
Uma das principais alterações da Lei 13/2019 prende-se com a definição de um prazo de duração mínima dos contratos de arrendamento para fins habitacionais (solução que já anteriormente vigorou no ordenamento jurídico português, mas que tinha sido abandonada por forma a flexibilizar a celebração dos contratos de arrendamento). Com efeito, prevê-se agora que o contrato de arrendamento para fins habitacionais não poderá ser celebrado por prazo inferior a um ano. Tal limite não será, contudo, aplicável “aos contratos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios, designadamente por motivos profissionais, de educação e formação ou turísticos, neles exarados”, recuperando-se, também aqui, conceitos anteriormente vigentes no nosso ordenamento jurídico.
Extinção do contrato de arrendamento
Oposição à renovação
Com a nova redação do n.º 3 do artigo 1097.º do Código Civil, a oposição à primeira renovação do contrato de arrendamento para fins habitacionais, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data. Todavia, tal regra não será aplicável se o senhorio necessitar do locado para nele habitar, ou para habitação dos seus descendentes em primeiro grau.
No caso de contratos de arrendamento para fins não habitacionais, dispõe o n.º 4 do artigo 1110.º do Código Civil que o senhorio não pode opor-se à renovação do contrato durante os primeiros cinco anos da sua vigência.
Cremos tratar-se de soluções que poderão desincentivar a colocação de imóveis, por parte dos respetivos proprietários, no mercado de arrendamento, pelo que importará acompanhar e medir de forma atenta os seus efeitos.
Denúncia
Alarga-se de dois para cinco anos o prazo geral de pré-aviso para denúncia, por parte do senhorio, de contratos de arrendamento que, nos termos da lei, se considerem celebrados por duração indeterminada. Acresce que esta denúncia deverá ser confirmada, sob pena de ineficácia, através de nova comunicação do senhorio efetuada com a antecedência máxima de 15 meses e mínima de um ano relativamente à data da sua efetivação, o que torna mais exigente e burocrático o processo de denúncia do contrato de arrendamento.
Além disso, foi restringida a possibilidade de denúncia, pelo senhorio, dos contratos de duração indeterminada com fundamento na realização de obras de remodelação ou restauro profundo. Em particular, as referidas obras só poderão justificar a denúncia do contrato desde que delas resulte um local com características diferentes do locado, onde não seja possível manter o arrendamento.
No caso de arrendamentos para fins não habitacionais, se o senhorio denunciar o contrato de arrendamento com pré-aviso de cinco anos ou para realização de obras de remodelação ou restauro profundo, ficará obrigado a indemnizar separadamente o arrendatário e os trabalhadores do estabelecimento pelos prejuízos que resultem da cessação do contrato de arrendamento.
De referir, ainda, que a inobservância dos prazos de pré-aviso para oposição à renovação e denúncia do contrato de arrendamento para fins habitacionais, por parte do arrendatário, não o obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta quando for motivada por uma situação de desemprego involuntário, de incapacidade permanente para o trabalho ou por morte do arrendatário ou de pessoa que com este viva em economia comum há mais de um ano.
Outras Alterações
NRAU
A Lei 13/2019 efetuou, também, alterações à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano. Destaca-se, em particular, a concretização do procedimento de injunção previsto na Lei 12/2019, tendo sido criado, junto da Direção-Geral da Administração da Justiça, o Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), destinado a assegurar a tramitação da injunção em matéria de arrendamento.
RJOPA
Por último, a Lei 13/2019 alterou também as disposições do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto. Neste contexto, recorde-se que o senhorio não pode, atualmente, denunciar o contrato quando pretenda realizar obras de remodelação ou restauro profundos, que resultem em local com “características equivalentes às do locado” (alínea b) do artigo 1101.º do Código Civil).
Conclusões
As alterações ao regime jurídico do arrendamento urbano, especialmente as operadas pela Lei 13/2019, têm um impacto significativo no instituto do arrendamento urbano, diminuindo a liberdade das partes na definição do regime contratual (que era particularmente acentuada nos contratos de arrendamento para fins não habitacionais) e alterando materialmente pontos essenciais do regime, como a duração mínima dos contratos de arrendamento para fins habitacionais.
Por outro lado, estas alterações poderão ter um impacto significativo no mercado de arrendamento urbano, nomeadamente na vontade dos proprietários em arrendar os seus imóveis, não só em face das imposições acrescidas do regime do arrendamento urbano, mas também por via da possível perda de competitividade do instituto do arrendamento em face de formas alternativas de obtenção de rendimentos prediais (como a exploração de estabelecimentos de alojamento local).