Estado e instituições públicas devem ser mais cooperantes com os operadores económicos;

Vida Económica e Anceve promovem debate sobre exportações de pequenos produtores
Estado e instituições públicas devem ser mais cooperantes com os operadores económicos
A união de pequenos produtores, seja através do agrupamento de várias marcas, seja pela criação de uma marca única que reúna diversos produtores, foi tida como uma opção válida para ganhar dimensão e exportar.
As dificuldades colocadas pelas instituições públicas continuam a ser os grandes obstáculos às empresas exportadoras de vinhos, sobretudo de pequena e média dimensão.
O pequeno-almoço debate promovido pela Vida Económica, com a colaboração da ANCEVE - Associação Nacional dos Comerciantes e Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas, reuniu um conjunto de operadores, sob o tema das exportações de produtores de pequena e média dimensão.
No arranque do debate, Miguel Flores de Almeida, administrador das Caves do Casalinho, resumiu o sentimento geral: “Já não chegava às empresas, sobretudo as de menor dimensão, terem colaboradores pagos por si ao serviço do INE, Banco de Portugal, Finanças e IVV” como, acrescenta, “no caso das alfândegas estão a dificultar-nos a vida”.
Aquele operador refere que “75% da nossa faturação é exportação – e uma grande parte são produtos sujeitos a IEC, desde logo aguardentes. Temos uma forte presença em Angola e França com uma marca própria de aguardentes e o que temos sentido por parte da Alfândega é cada vez mais dificultar o processo”.
Paulo Amorim, presidente da direção da ANCEVE, assinala as dificuldades “de estrutura das organizações que rolam por si próprias, quase à revelia da vontade dos gestores”.
Referindo que os novos órgãos sociais daquela associação “têm como missão apoiar os pequenos produtores, tirando partir das valências do Portugal 2020 para, com algum ‘know-how’ que temos, ajudar os pequenos e médios produtores a exportar”, Paulo Amorim afirma que “Portugal precisa de criar massa crítica na exportação e isso não se consegue só com vinhos de valor acrescentado”.

Unir pequenos produtores

Na sua opinião, “ainda não ganhámos a batalha da distribuição – do valor acrescentado e da qualidade/preço – para ter capacidade de negociação com os grandes importadores”. Uma das soluções, advoga, pode passar pelo apoio à união entre “pequenos produtores”.
Na sua perspetiva, a ViniPortugal “deveria tentar calçar os sapatos dos pequenos e médios produtores ao nível da estratégia, pois o tecido empresarial é feito pelas PME. Foi o que fez com grande sucesso a APICCAPS no setor do calçado e deveria ser replicado pelo setor dos vinhos”, resume.
Também uma microempresa produtora do Douro mas já com resultados na exportação, a Parceiros na Criação (PNC), responsável pelos vinhos h’Our, sente essa dispersão: “No Douro temos três instituições, com três tutelas diferentes, que fazem quase a mesma coisa e temos que passar pelas três para tratar a mesma questão”, resume João Nápoles de Carvalho.
Miguel Almeida volta ao exemplo da aguardente para explicar que “sobre este produto, que é vendido para o mercado angolano num contentor com um custo de 35 mil euros, recai um IEC de 60 mil euros”. Mesmo que “o imposto não seja cobrado, pois fica em processo suspensivo”, o operador “está obrigado a prestar uma garantia desse valor”. O processo “demora entre três a quatro semanas, em que o produtor tem que ter a sua própria garantia bancária ou conseguir uma provisória”.
Rui Moreira, CCO da Casa Angola Internacional, adianta por outro lado que “os custos de alterações legislativas não são apresentados; deveria haver melhor qualidade legislativa e estabilidade, para que o operador não tenha que tomar decisões com base numa situação que depois pode mudar”.

Estratégias de exportação
Presente em 18 mercados de forma direta e outros dois indiretamente, as Caves do Casalinho basearam a sua estratégia de exportação no que Miguel Almeida designou por “parcerias estratégicas descomplicadas”, ou seja, “temos que criar parcerias para estar em vários mercados e olhar para a distribuição como parceiros de negócio”.
Baseada na região dos vinhos verdes, com 35 hectares de vinhas próprias, a empresa Caves do Casalinho desde logo pensou em “olhar para outras regiões e parceiros de negócio no Alentejo e Douro”. O objetivo foi “criar produtos para segmentos A e B, não temos nada inferior a cinco euros”, disse. Angola, EUA e China são prioritários e Europa “é hoje um mercado menor, muito difícil, exceto na Alemanha, onde temos crescido sobretudo com vinhos do Douro”.
João Nápoles de Carvalho, que lançou a sua própria empresa em 2010 a partir da propriedade com 12,5 hectares e cerca de 10 mil garrafas/ano, afirma ter “começado este ano a olhar com mais atenção para a exportação”. Isto porque, “para quem está a começar, faz todo o sentido olhar em termos estratégicos para o exterior, depois de consolidar o mercado nacional”.
Com presença nos mercados de França, Alemanha e Suíça, “com distribuidores”, a estratégia passa por ganhar volume. “Pus-me a pensar como iria com esta quantidade ir lá para fora. Entendemos juntar mais três produtores de três regiões diferentes, também pequenos produtores, mas que juntos produzem cerca de 200 mil garrafas e capacidade para aumentar”.
Assim, com a Quinta do Lagar Novo (Lisboa), Monte da Raposinha (Alentejo) e Herdade do Cebolal (Costa Alentejana), “estamos em fase de criar um agrupamento, todos num mesmo segmento de alta qualidade, para ganharmos algum volume capaz de criar valor”.        
A visão dos distribuidores
Na ótica do distribuidor, a exportação “é a área que mais cresce”, disse António Correia Lopes. No caso da Arcol, a exportação representa cinco milhões de euros numa faturação de 70 milhões.
Portugal, “como país pequeno, é visto como um mercado de qualidade”, disse. “Os clientes não querem milhões de garrafa, mas nichos de produção, com quantidades pequenas, genuinidade, com qualidade e garantia de continuidade”.
O total das vendas da Casa Angola destina-se aos mercados externos, resumiu Rui Moreira. Assim sendo, “desenvolvemos uma marca – ViniPorto – e começámos a criar vinhos para mercados específicos em que trabalhamos, continuando assim a apoiar os pequenos produtores com quem já trabalhávamos”, disse o CCO da Casa Angola.
Este projeto arrancou “a pensar nos mercados e emergentes na Ásia, um trabalho persistente que começou a dar frutos passados cinco anos mas com resultados interessantes, ao ponto que hoje temos vendas na casa dos 350 mil litros de vinhos”.
Também no âmbito da união de produtores, a Arcol encabeça um projeto iniciado há menos de um ano que já resultou em 200 mil garrafas vendidas de um vinho do Dão chamado Atitude. Este resulta da colaboração entre a Arcol e um produtor, que se rodeia de outros produtores da região, num total de 17 micro produtores. António Lopes mostra-se ainda disponível para receber mais produtores.
Trata-se de um “produto de volume, que na exportação sai a 1,75 euros, com selo de garantia da região” nas versões branco, tinto e rosé. Este destina-se a mercados como Ásia e Palop e Europa, sobretudo mercado da saudade, “muito recetivo a esta tipologia de vinhos”. A Arcol está “em fase de lançamento de outros vinhos com esta marca de outras regiões, mas também espumantes”.

Marc Barros (marcbarros@vidaeconomica.pt), 14/05/2015
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