O caminho para o progresso é o Estado “sair da frente”;

Alexandre Mota, presidente do Instituto Ludwig Von Mises Portugal, afirma
O caminho para o progresso é o Estado “sair da frente”
"Sem liberdade económica não há liberdade", afirma Alexandre Mota.
“Menos Estado, menos impostos, menos despesa pública, menos regulações, menos corporativismo, mais indivíduo, mais sociedade civil, mais prosperidade.” Só assim se poderá encontar o caminho do progresso. Esta é a opinião de Alexandre Mota, presidente do Instituto Ludwig Von Mises Portugal.
O Instituto Ludwig Von Mises Portugal – um “think tank” liberal é uma associação que defende os valores da Liberdade, da Propriedade e da Paz. Os seus participantes inspiram-se em Mises, um economista da chamada “Escola Austríaca”.
Vida Económica - O que é o Mises Portugal, o que defende e o que pretende?
Alexandre Mota - O Instituto Ludwig von Mises Portugal é um “think tank” liberal, português, na linha dos vários institutos Mises congéneres em todo o mundo. Temos como lemas a liberdade, a propriedade e a paz e pretendemos revolucionar as ideias em Portugal. É um objetivo difícil, mas de outra forma não seria tão excitante.
 
VE - Numa palavra, como definiria o vosso ideal?
AM - Liberdade. Liberdade significa que cada indivíduo é livre de traçar os seus objetivos de vida sem coerção por parte de outros, quer diretamente, quer por intermédio do Estado. Portugal é um país com uma muito razoável liberdade cívica (felizmente), mas com seríssimas restrições à liberdade económica, consubstanciadas em impostos, taxas, regulações, etc. O nosso ideal passa pelo primado da liberdade individual em todas as suas vertentes. Sem liberdade económica não há liberdade.
 
VE - Portugal é um país desigual: a desigualdade não vos preocupa?
AM -
Preocupa-nos a pobreza. A desigualdade preocupa-nos quando é estimulada por privilégios, corporativismo, lobismo, em suma, por uma relação simbiótica com o poder do Estado, que distorce a livre concorrência e a coroação dos melhores no livre mercado. Já a desigualdade decorrente de diferentes competências, méritos e sortes não nos preocupa de todo. É a natureza das coisas num processo competitivo. A existência de regras gerais, iguais para todos, promove a igualdade de partida – pedra basilar do liberalismo. A distribuição coerciva de riqueza promove a igualdade à chegada – pedra basilar do socialismo.
 
A ordem espontânea dos indivíduos livres
 
VE - São muito críticos das políticas desenvolvimentistas. Não defendem o progresso económico?
AM - Queremos o progresso económico, mas a forma de o alcançar é radicalmente diferente do que tem sido a receita intervencionista. O caminho para o progresso é o Estado “sair da frente”. Menos Estado, menos impostos, menos despesa pública, menos regulações, menos corporativismo, mais indivíduo, mais sociedade civil, mais prosperidade. O caminho do progresso não obedece a uma ordem planeada pelo Estado, mas sim à ordem espontânea de indivíduos livres. Livres em toda a linha, sobretudo na linha económica. Surgiu a ideia que ser livre é poder dizer mal do governo, mas ser livre é muito mais que isso.
 
VE - São contra o Estado Social?
AM - Não somos contra o altruísmo social, aliás apreciamos que a sociedade, ao nível das famílias, das comunidades locais, regionais ou nacionais, ajude os mais necessitados. Somos contra, entre outras coisas, o universalismo dos direitos sociais e a monopolização do Estado das funções sociais espontâneas e voluntárias de uma sociedade. Essa é a tragédia do Estado Social – um exemplo das consequências negativas de ideias com boas intenções.
É uma enorme hipocrisia todos os partidos portugueses defenderem o Estado social. Estão a tentar enganar toda a gente. Querem salvar uma fraude? Para nós, o Estado social é não só eticamente atacável como é factualmente um desastre pendente.
O problema do Estado Social é que assenta na ideia de redistribuição da riqueza e essa ideia é basicamente errada porque, no limite, retira os incentivos à criação de riqueza. Se a redistribuição fosse uma coisa boa, Portugal seria uma das sociedades mais prósperas do mundo no início do século XX porque poucos países tiveram acesso a tanta riqueza como nós. Tivemos vários séculos de políticas de redistribuição e de capitalismo de estado e o resultado foi ficarmos relativamente mais pobres face a outros em que a iniciativa privada predominou.
 
VE - Relativamente aos chamados temas fraturantes colocados pela Esquerda, qual o vosso posicionamento? Por exemplo: casamento “gay”, eutanásia, drogas e aborto.
AM - Se indivíduos livres do mesmo sexo decidem casar, são livres de o fazer. Se um homem quer acabar com a sua vida ou ingerir drogas, é livre de o fazer. Podemos não gostar; uma sociedade livre não é um mar de rosas, mas estes temas remetem para a responsabilização individual, para o livre arbítrio. Que moralidade tem um Estado - que envia “carne para canhão” para guerras ilegítimas - para penalizar atitudes que são do foro íntimo?
No que diz respeito ao Aborto, a questão é mais complexa. Alguns de nós defendem uma lógica “pro-choice”, remetendo para os direitos da propriedade da mãe sobre o feto; outros de nós defendem uma lógica “pro-life”, assente na ilegitimidade do aborto porque se trata da violação de uma vida humana, ainda que em formação. É um assunto complexo. Tenho a minha opinião pessoal, mas não é relevante como representante do Mises Portugal.
 
VE -  São críticos do chamado “crony capitalism”, que definem como capitalismo de Estado. Consideram que um arranjo livre de mercado não comporta riscos?
AM - O livre mercado comporta riscos. Os indivíduos enganam-se, as empresas enganam-se e os arranjos espontâneos podem não nos agradar na plenitude. São, todavia, mais justos porque resultam da livre conjugação de vontades de milhões de indivíduos que pagam pelos próprios erros.
A experiência das sociedades capitalistas mostra, apesar de todos os intervencionismos prejudiciais, que quanto mais livre uma sociedade for, mais próspera será no futuro. Nesta matéria, em Portugal, a palavra liberdade foi usurpada por organizações que visam o socialismo. Ora, isto é um paradoxo. O socialismo é o contrário da liberdade e não é por podermos dizer isto sem sermos presos que devemos querer a “refeição pela metade”. Queremos o máximo de liberdade e o mínimo de coerção do governo. Há que parar o caminho para o socialismo, que é “o caminho para a servidão”, título da grande obra de F.Hayek.
 
VE - A crise de 2008 foi culpa da desregulação dos mercados?
AM - A culpa da crise de 2008 foi de um conjunto de fatores. O mais importante foi a ilusão de controlo por parte da FED (a situação repete-se hoje no que diz respeito ao BCE e FED).
 Iludidos por uma taxa de inflação baixa, a qual resultara do aumento da oferta de produtos asiáticos a baixo preço, a FED manteve as taxas de juros artificialmente baixas durante muito tempo, incentivando uma bolha do crédito e preços artificiais no imobiliário e em outros setores. Quando os investimentos mal sinalizados pela política da FED - que dera os sinais errados ao nível de poupança disponível - se revelaram insustentáveis, o sistema quase ruiu.
O principal culpado da crise foram os bancos centrais (a FED à cabeça, mas todos os outros seguiram um política de easy Money insustentável).
Adicionalmente, a grande razão da escalada da crise financeira em 2008, foi paradoxalmente não a desregulação mas uma regulação excessiva e mal feita, nomeadamente as novas regras contabilísticas que geraram a obrigatoriedade de mark-to- market. Parecendo uma boa ideia em termos de transparência, introduziu um enorme grau de volatilidade nos ativos bancários.
 
VE - Na vossa opinião quais deveriam ser as funções dos Estados e como se posicionam relativamente à democracia?
AM - O governo deve proteger a liberdade, a vida, a propriedade e as leis. A democracia é, para a maioria de nós, liberais, o melhor arranjo político, como meio para atingir a liberdade. No entanto, a democracia tem defeitos, e para não se tornar na ditadura da maioria terá que ter poderes limitados. Constitucionalmente limitados. O curioso (e perigoso) é que conseguimos tornar realidade as distopias mais negras de George Orwell, mantendo a ilusão de democracia.

“Na poupança está a raiz do investimento sustentável”
 
 
“Uma ideia errada que pende sobre os liberais clássicos é de que somos insensíveis face à pobreza. Nada mais errado. Na nossa perspetiva, há cinco coisas que alguém que quer ajudar genuinamente os pobres poderá fazer:
a. Não defender políticas que levem ao empobrecimento dos ricos na crença que isso ajudará os pobres; as políticas redistributivas tendem a perpetuar a pobreza, quer porque criam uma ilusão de bem-estar garantido, quer porque atacam a formação de poupança que é o cimento do progresso e da prosperidade.
b. Ensinar pelo exemplo; cultivando a poupança, o brio, a austeridade e a responsabilização, quer na sua família, quer nas organizações em que participa. Não roubar, nem defender o roubo legal pelo Estado; não basear a sua riqueza em privilégios estatais.
c. Poupar, assegurando assim que as gerações vindouras terão margem de manobra para os infortúnios. Poupar, porque é na poupança que está a raiz do investimento sustentável e por consequência o progresso económico e social.
d. Caso queira continuar a ensinar a pescar em vez de dar o peixe, a sua obrigação é dar a sua herança a alguém muito produtivo que fará do mundo um lugar melhor para todos os pobres viverem.
e. Por último, é livre de dar o seu dinheiro aos pobres – um ato digníssimo. Ser altruísta com o dinheiro dos outros é fácil. Já arregaçar mangas, trabalhar e produzir aquilo que quer ver distribuído e depois dá-lo de livre vontade, é bem mais difícil. Se for genuinamente amigo dos pobres, fá-lo-á com grande entusiasmo e pode até contagiar outros com o seu entusiasmo.”

 

Susana Almeida, 16/10/2014
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