A IES – o que começou por pretender “harmonizar” criou custos de contexto elevados;

A IES – o que começou por pretender “harmonizar” criou custos de contexto elevados
A “Informação Empresarial Simplificada” (IES), é uma obrigação declarativa que cumpre o objetivo de servirsimultaneamente5 entidades: Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA), Banco de Portugal (BP), Instituto Nacional de Estatística (INE), Instituto de Registos e Notariado (IRN) e Direção Geral das Atividades Económica (DGAE), todas com o mesmo propósito de receberem a informação contabilística anual das empresas.
Esta obrigação é, normalmente, cumprida até 15 de julho de cada ano, 45 dias após o prazo limite do encerramento de contas, que ocorre, normalmente, até 31 de março de cada ano.
O objetivo inicial seria o de “harmonizar” o processo de prestação de contas das empresas para os diversos destinatários e não “simplificar”, porque de simples nada tem, nem é expectável que venha a ser, porque esse não é o objetivo.
A introdução da IES consistiu numa inovação, na época, ao gerar um processo desmaterializado de prestação de contas, com uma substancial redução de custos para os diversos beneficiários, uma vez que concentra, num só momento declarativo, a entrega dos documentos de prestação de contas, e informação acessória, promovendo assim também uma redução de custos e procedimentos para as sociedades, e os seus contabilistas, ao entregar de um só vez a informação anual.
Contudo, este processo foi sendo desvirtuado, ao longo do tempo, a dois níveis:
  1. Não contemplando, nas suas atualizações, toda a informação necessária para os diversos destinatários, o que vem obrigando ao pedido adicional de informação por parte de entidades como o INE; e
  2. Foram introduzidas validações que contrariam outras disposições legais, nomeadamente de natureza contabilística, ao “exigir” na validação dos dados, a montante do preenchimento dos anexos, o cumprimento de certas condições que extravasam o objetivo de representar o processo de prestação de contas, tal como aprovado na Assembleia Geral das sociedades e de acordo com a normalização contabilística.
As validações necessárias para entrega da “IES”

O processo de entrega da “IES”, passa pela necessidade de validação de centenas de campos e regras obrigatórias, nos diversos anexos (21), sem o cumprimento das quais a declaração não pode ser enviada.
A maioria dos campos do Anexo A[1], correspondem a desagregações da informação constante nos mapas principais (demonstrações financeiras) e, por isso, necessários ao detalhe da informação para entidades como a ATA, o BP ou o INE.No que respeitaàs centenas de regras impostas nos formulários não resultam de qualquer imposição legal. Algumas regras fazem sentido, na medida em que correspondem a meros exercícios de cálculo para confirmações. Contudo, outras regras, as que obrigam a que certo tipo de informação tenha de corresponder com condições de agregação de rubricas contabilísticas para efeitos de elaboração automática do Balanço ou da Demonstração de Resultados, além de não fazerem sentido, não resultam de qualquer imposição legal, o que, em certos casos, perverte as responsabilidades que são atribuídas, por Lei, às Administrações das Sociedades[2] e aos Contabilistas Certificados[3].
As regras sobre agregações, via plano de contas fiscal, vulgo “taxonomias”[4], previstas para a entrega da IES a partir de 2022, com os procedimentos previstos no Decreto-Lei n.º 48/2020, de 3 de agosto, gera custos de contexto desnecessários e fazem recuar o avanço da contabilidade para uma era mais moderna do relato financeiro cerca de 12 anos, aos tempos do “POC”.
Esquematicamente, o que se pretende é o seguinte:


Sobre este tema, emitiu a Comissão de Normalização Contabilística (CNC) um parecer, em 14 de abril de 2021, a pedido do Parlamento (Comissão de Orçamento e Finanças), sobre as alterações que se pretendiam à legislação entretanto publicada, do qual extraímos o seguinte:
“Importa referir que tanto a implementação da IES como a do SAF-T (PT) da Contabilidade para as entidades empresariais inicialmente foram desenvolvidas à margem da CNC, tendo sido realizadas reuniões pontuais do Grupo da IES com a CNC, quer na altura da implementação inicial da IES, quer em 2018 e 2019, no âmbito de alterações ao SAF-T da Contabilidade (Taxonomias) vs. IES face a inconsistências observadas pela CNC na arrumação das contas dos balancetes com as rubricas das demonstrações financeiras entre o SNC e o SAF-T da Contabilidade vs. IES. Já a Taxonomia para as Entidades Públicas Reclassificadas foi preparada pela CNC”, recomendando que “seja harmonizada a informação referente à submissão da IES, para que, para além do preenchimento dos respetivos campos informáticos de forma coerente com o SNC, esta informação seja a que é refletida nos elementos da prestação de contas aprovados, reforçando assim a garantia da correta integridade da informação vertida nas demonstrações financeiras”.
Bastante elucidativo sobre um verdadeiro “atropelo” de um grupo de trabalho sobre um órgão normalizador, criado por Lei, e agregador de um conjunto vasto de organismos representativos da contabilidade, da profissão, ao ensino e às instituições públicas.
Resumir a preparação e apresentação das demonstrações financeiras a um mero exercício de agregação de contas é demasiado redutor para o efetivo valor da contabilidade, e não há razões que a desmaterialização o justifique.
O IASB também já publicou taxonomias para as IAS/IFRS[5] e não reduz o relevante contributo da contabilidade à mera agregação de contas, que, neste contexto, nem existem.

O depósito legal de contas

Para todos os efeitos legais, a prestação de contas é deliberada em Assembleia de sócios/acionistas, exceto nos casos especiais previstos, como a deliberação unânime por escrito ou nos termos do n.º 2 do art.º 263.º doCSC, sob proposta de gerência/administração, atravésdos documentos previstos em Legislação própria, no caso Português o Sistema de Normalização Contabilística (SNC), aprovado pelo Dec. Lei n.º 158/2009, e republicado pelo Dec. Lei n.º 98/2015, exceto para as empresas sujeitas ao Regulamento 1606/2002 da EU, que aplicam as normas internacionais de contabilidade, designadas por IAS/IFRS.
Estes documentos, após a sua aprovação, são sujeitos a registo comercial[6], por depósito, através dos meios eletrónicos previstos em legislação especial, da informação constante dos seguintes documentos:
  1. Ata de aprovação das contas do exercício e da aplicação dos resultados;
  2. Balanço, demonstração de resultados e anexo ao balanço e demonstração de resultados;
  3. Demonstração dos resultados;
  4. Demonstração das alterações no capital próprio/património líquido;
  5. Demonstração de fluxos de caixa;
  6. Anexo às demonstrações financeiras;
  7. Certificação legal das contas;
  8. Parecer do órgão de fiscalização, quando exista.
 
Assim, podemos concluir que os meios eletrónicos devem respeitar o conteúdo e forma dos documentos que foram aprovados e nunca introduzir alterações que lhes possa provocar desconformidades.
Os modelos oficiais de depósito por meios eletrónicos consistem na IES (Informação Empresarial Simplificada)[7], e os formulários devem respeitar a estrutura legal definida na normalização contabilística eas demonstrações financeiras efetivamente aprovadas pelos sócios/acionistas, para que os possa substituir.
Isto é, a declaração IES, só substitui os documentos em papel, se respeitarem o seu conteúdo e forma, dado que esta consiste numa declaração, e deve respeitar averdade material contida nos documentos de prestaçãode contas devidamente aprovados pelos sócios/acionistas, e nunca deverá ser objeto de depósitos em que este requisito formal seja cumprido.
Com os “novos” procedimentos definidos no Dec. Lei n.º 87/2018, de 31 de outubro, e os formulários e campos contido na Portaria n.º 31/2019, de 24 de janeiro, o processo de prestação de contas, a partir de 2022, será o seguinte:

 


[1] Entidades residentes que exercem, a título principal, atividade comercial, industrial ou agrícola e entidades não residentes com estabelecimento estável
[2]Art. 65.º do Código das Sociedades Comerciais
[3]Art. 10.º do Anexo I da Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro, que aprova o Estatuto da OCC
[4] Portaria n.º 302/2016, de 2 de dezembro
[5]https://www.ifrs.org/issued-standards/ifrs-taxonomy/ifrs-taxonomy-2021/
[6]Art. 42.º do CRC
[7]Decreto-Lei n.º 8/2007, de 17 de janeiro, alterado pelos Decretos-Lei nºs 73/2008, de 16 de
abril,
José Araújo Contabilista Certificado n.º 5 Consultor e formador, 08/06/2022
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