Exportações portuguesas para a Guiné-Bissau crescem 40%;

Fim da instabilidade cria novas oportunidades de investimento
Exportações portuguesas para a Guiné-Bissau crescem 40%
A Guiné-Bissau tem todas as condições para ser a plataforma de entrada na África Ocidental. Esta é uma das conclusões do debate organizado pelo Instituto Superior de Gestão, com o apoio da “Vida Económica”, onde foram debatidas as oportunidades e perspetivas para a Guiné-Bissau. Os embaixadores de Portugal e da Guiné destacaram a evolução política positiva e a expectativa de crescimento sustentável.
“Há um ano atrás, a Guiné-Bissau ainda estava com as forças de manutenção de paz das Nações Unidas, que saíram ao fim de 20 anos” – recordou José Velez Caroço. O embaixador de Portugal em Bissau referiu que nos últimos 12 meses foi assumido o papel legítimo da Guiné-Bissau no mundo, no contexto das Nações e nas diferentes organizações internacionais, desempenhando o seu papel no quadro externo. “Tem-se assistido à desejada consolidação político-institucional do país, em que, durante muitos anos, a preocupação foi muito focada, e bem, nessa dimensão mais política” – disse José Velez Caroço durante o debate moderado por Teresa Alves de Sousa. Para o diplomata português, a evolução da Guiné-Bissau está a ser positiva  ao  passar desse olhar mais político, que foi predominante no passado, para um olhar económico. O patamar seguinte é a consolidação de uma pacificação política no quadro desejado e no desenvolvimento sustentável do país.

País jovem com recursos naturais

“A Guiné-Bissau tem um mercado vastíssimo” – afirmou Hélder Vaz Lopes. O embaixador da Guiné em Lisboa garantiu que, ao contrário do que se possa pensar, não se trata de um país pobre em recursos. “É um país com uma riqueza natural inigualável, com muitos recursos naturais e minerais,  e pedras preciosas. Tem das maiores reservas de água da África de Leste. É um país com um rico potencial humano. Cerca de 63% da população tem menos de 25 anos. É um país muito jovem. Tem imenso potencial para a exploração petrolífera. O mesmo se diga relativamente à agricultura, havendo capacidade de exportação para o Mundo inteiro e tem essa disponibilidade. O Porto de Buba é um projeto importantíssimo para tornar o desenvolvimento de todos estes setores numa realidade” - disse o diplomata guineense.

Agenda nacional para a diversidade e inclusão

“A Guiné tem mais de 90 ilhas, estando algumas delas ainda por habitar” – afirmou Martilene dos Santos. O gestor e coordenador de quadros do PAIGC destacou a importância do ensino e formação, referindo o contributo do Grupo Lusófona em termos de desenvolvimento de “soft-skills” e “hard-skills”  do povo guineense.
Segundo referiu, o que falta são novas abordagens. “São precisas pessoas na política que tragam confiança para a Guiné e o povo guineense. Não podemos continuar a insistir em soluções esgotadas. Tem de haver compromisso e capacidade para servir o povo. É preciso trabalhar todos os dias para que a política tenha a capacidade de servir. Tem de haver uma agenda nacional que aposte na diversidade, na inclusão, na pertença. Só assim poderemos fazer da Guiné Bissau um país melhor, com emprego e investimentos e bons sistemas de saúde, educação e justiça”. acrescentou.

Segurança pública e crescimento económico

“A Guiné-Bissau é um país onde se podem realizar negócios o que se comprova pelo aumento das nossas exportações” – referiu Tiago Bastos. O diretor da AICEP no Senegal e Guiné-Bissau  explicou que em 2015, as prestações de bens e serviços eram 80 milhões de euros e em 2019, antes da pandemia,  atingiram 115 milhões, o que foi um aumento significativo de mais de 40%. Relativamente aos indicadores económicos, prevê-se um crescimento de 6,1% em 2021. O FMI é mais conservador e tem uma previsão de crescimento de 3,3% para 2021.
Para Tiago Bastos, a Guiné deve ser vista como um país seguro. “Bissau é uma cidade mais segura certamente do que Lisboa e Porto, tirando alguns aspetos como a questão da saúde. Também uma segunda nota que me parece evidente e importante: eu arriscaria dizer que o povo que mais gosta de Portugal é o povo guineense. Tem um carinho e um afeto muito grandes, o que também é importante para a realização dos negócios” – acrescentou.
 
Investimento em capital humano é determinante
 
“A Guiné-Bissau é um caso de extraordinário potencial. A natureza ali foi prodigiosa” – disse Diogo Lacerda Machado.  O presidente do Banco da África Ocidental considera que a Guiné-Bissau tem todas as condições para ser a nossa plataforma de chegada para toda a África Ocidental. Há solidariedade social. As pessoas são genuinamente boas. “Assisti a algumas ruturas da ordem constitucional, mas o povo da Guiné-Bissau mostrou sempre uma enorme capacidade de viver harmoniosamente, apesar da instabilidade. O povo é fantástico. Este é um momento de uma nova esperança para a Guiné-Bissau. A Guiné-Bissau recuperou completamente a sua soberania no final de 2019 e mantém-na até agora e tem revelado que merecia essa recuperação e que pode funcionar normalmente” - salientou. Sempre que houve instabilidade política, nunca houve instabilidade social, apesar de toda a diversidade étnica e religiosa, que acaba por ser uma riqueza para a Guiné-Bissau.
Para Diogo Lacerda Machado, o investimento no capital humano é o mais importante. “Os portugueses são extraordinariamente bem recebidos na Guiné-Bissau. Temos uma ligação indissolúvel” – sublinhou.
Segundo referiu, a Guiné-Bissau é um país caracterizado por um grande liberalismo económico. “É, porventura, dos países mais liberais. Justamente, da relativa fragilidade política resulta uma enorme capacidade para recriar uma estabilidade social, conseguindo-se investir com segurança, ter recursos fantásticos e repatriar os dividendos. É uma enorme oportunidade para os investidores portugueses” - afirmou. A criação de postos de trabalho pelos empresários portugueses é uma enorme oportunidade
O Banco da África Ocidental pretende ser um exemplo. Na estrutura normal do Banco, não há um único expatriado. “Eu confio absolutamente na estrutura que temos na Guiné- Bissau. São pessoas extraordinárias, competentes, capazes, que gostam de trabalhar no Banco. Encontrámos lá recursos capazes, competentes, que apoiam os investimentos dos empresários portugueses.
Temos de ter a capacidade de financiar investimentos mais estruturantes para a Guiné-Bissau. A Guiné-Bissau reúne todas as condições para ser a nossa porta de entrada para a economia africana” – concluiu.  

Melhoria das infraestruturas possibilita aumento de exportações de produtos locais

“A capacidade da Euroatlantic, não só de passageiros como de carga, é considerável” – disse José Caetano Pestana. O diretor da  Euroatlantic referiu que, quando a companhia aérea começou a voar para Bissau, sempre teve o objetivo de poder retirar carga de Bissau, ou seja, transportar produtos guineenses para a Europa. Mas a Guiné tem de criar áreas de alfândega, áreas de não acesso público, fazer a montagem de equipamentos de rastreio. “Atualmente, as mangas que nós vemos caídas no chão não podem ser exportadas para Portugal, porque não há laboratórios de certificação, o aeroporto não está preparado para a expansão de carga aérea. O peixe e o camarão que chegam a Portugal, muitas vezes são comprados por barcos espanhóis, certificados nas Ilhas Canárias e depois descarregados em Lisboa” – comentou José Caetano Pestana. Atualmente, a Euroatlantic faz uma ligação semanal entre Lisboa e Bissau.

Oferta de medicamentos ainda é reduzida

A Saluspharma é um grupo farmacêutico de importação e distribuição de medicamentos, não apenas medicamentos portugueses, embora grande parte dos acionistas e dos produtos que nós comercializamos sejam de empresas com presença forte na área farmacêutica em Portugal e em Cabo Verde. Também estamos a servir esta comunidade e este país nestas áreas da saúde e desde 2016 temos feito um caminho de crescimento e de participação. “Hoje, o mercado guineense, também com a contribuição da Salespharma, dispõe de medicamentos mais acessíveis, de uma panóplia muito mais alargada” – disse Paulo Real. Para o diretor-geral da Saluspharma, o mercado guineense tem carências e necessita de regulamentação e alguma certificação, o que irá acontecer no futuro a médio prazo. Na Guiné existem apenas 16 farmacêuticos para um país de quase dois milhões de habitantes. As clínicas e os apoios de outras estruturas são muitas vezes assegurados por organizações não-governamentais, utilizando produtos com qualidade certificada.

Portugueses são bem acolhidos

“É realmente fantástico sentirmos a alegria com que nós, portugueses, somos recebidos na Guiné-Bissau” - afirmou Alexandre Correia. Para este jornalista, frequentemente fala-se deste país pelos piores motivos, o que cria visões muito distorcidas da realidade. “Ao ouvir o que foi falado sobre os investimentos e todo este potencial, o que eu vejo sempre que chego à Guiné-Bissau, para além do entusiasmo e da amabilidade enormes, é toda uma diversidade cultural e o convívio social que são notáveis. “É uma coisa rara, a estabilidade social que se sente. Eu já estive em Bissau em momentos de alguma tensão política e militar, mas isso não era percetível na rua. Vivia-se com total normalidade e sempre com segurança” - concluiu.
Susana Almeida, 31/12/2021
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