Portugal é atrativo para a instalação de centros de serviços partilhados;

Elrick Valette, responsável da EOTIM Portugal, afirma
Portugal é atrativo para a instalação de centros de serviços partilhados
A equipa da EOTIM Portugal (Elrick Valette, em pé ao centro da foto).
“Portugal, que tem uma política agressiva de reconquista económica, é rapidamente limitado pelas suas próprias fronteiras. Daí o desenvolvimento de serviços pensados para a exportação. Os centros de serviços são a melhor opção para tal”, afirma Elrick Valette, responsável da EOTIM Portugal.
“Os centros de serviços partilhados têm vontade de estabelecer os seus centros mais perto da sua clientela, em países com uma cultura semelhante à dos interlocutores. Portugal reúne estas condições”, acrescenta.
Vida Económica - Tem havido em Portugal uma expansão na atividade de centros de serviços partilhados?
Elrick Valette - É um eufemismo! Pegando no exemplo de sucesso mais flagrante, o maior call center de Portugal estabeleceu-se no início dos anos 2000, com 200 colaboradores. Em 2014, ou seja, quase 10 anos depois, ele conta com mais de 4000 e em 2020 mais de 10 000 colaboradores. A recessão de 2010 foi um verdadeiro fator e revelador deste tipo de centro de competências para a política económica portuguesa.
Existem mais de 15 centros de atividades partilhadas, com mais de 800 colaboradores na zona da grande Lisboa. E estes centros de competências não estão limitados geograficamente. Porto, Braga, Guimarães ou mesmo as ilhas portuguesas têm a sua quota-parte de empresas no seu seio.
Apesar da crise sanitária, os centros de serviços partilhados conseguiram manter a sua atividade. Mas a sua expansão relâmpago foi amplamente travada pelo mercado económico abrandado em certos setores, como o turismo, falando do mais visível.
Por outro lado, mesmo se os projetos estão suspensos, a vontade de crescimento continua presente e espera apenas o recomeço destas atividades para voltar em força.

VE - Quais são as vantagens que Portugal oferece em comparação com outros países?
EV - Portugal soube trazer-se à ribalta e aproveitar o pós-Primavera Árabe para se trazer para o primeiro plano no palco dos centros de serviços partilhados. Preenche as condições ideais para o desnvolvimento deste tipo de atividade.
A sua situação política é estável. Foi feito um grande trabalho nesse sentido pela política portuguesa para sair da crise e propor às empresas e aos particulares benefícios fiscais interessantes.
Os centros de serviços partilhados tiveram também experiências mitigadas nos países mais pobres (Índia, China, Filipinas…) e têm vontade de estabelecer os seus centros mais perto da sua clientela, em países com uma cultura semelhante à dos interlocutores. Portugal reúne estas condições. País pertencente à União Europeia, de fácil acesso, com aeroportos ativos (quase 300 voos por dia e 31 milhões de passageiros em 2019 para o aeroporto de Lisboa), Portugal é um verdadeira placa giratória da economia europeia.  
O seu “pool” de emprego muito internacionalizado permite também encontrar facilmente nativos de muitos países. Lisboa é a segunda cidade mais cosmopolita da Europa depois de Amsterdão.
Finalmente, o clima, a cultura e o estilo de vida tranquilo dos portugueses são um verdadeiro trunfo que atrai mais do que turistas.
 “É fácil convencer os estrangeiros a virem trabalhar para cá “, afirmava ao “Público” o diretor da Teleperformance Portugal, João Cardoso, em 2014.

VE - Que fatores determinam a predominância de empresas francesas na contratação deste tipo de serviços?
EV - Os dois fatores mais importantes que atraíram as empresas francesas para Portugal para contratação deste tipo de serviços são a história comum dos dois países e os benefícios económicos.
Não nos podemos esquecer que, sob o regime de Salazar, a população portuguesa conheceu uma forte migração para os países fronteiriços. França recebeu nessa época uma vaga de imigração portuguesa que se estabeleceu e integrou em todo o território francês. Algumas décadas mais tarde, os lusodescendentes estão motivados a conhecer as suas origens e estão imersos numa dupla cultura. Esta vontade deu lugar a um movimento inverso e, assim, a uma imigração de franceses em Portugal.
Mas, antes de Salazar, a história de Portugal e França estava já bem estabelecida. A dinastia de Borgonha está nos livros de História portuguesa e desempenha um papel importante na “reconquista” dos territórios aos mouros (séculos XI e XII). E vários outros exemplos poderiam ser invocados se o assunto de hoje fosse diferente.
Para além das vantagens de implementação acima mencionadas, podemos igualmente falar de um salário mínimo inferior ao de França. Assim, para um salário equivalente, encontrará colaboradores mais experientes. Ou, para as mesmas competências, um salário mais baixo.
Hoje em dia, este ponto é menos marcado em Lisboa, devido a um custo de vida elevado em rápido crescimento, causado principalmente pelo forte aumento das rendas. Mas o delta ainda não foi alcançado e as outras cidades de Portugal são ainda muito interessantes neste ponto.

“Customer Advisor” é o perfil mais procurado

VE - Quais são os perfis mais solicitados em termos de colaboradores?
EV - O perfil mais procurado continua a ser o de “Customer Advisor”. Sendo os call centers a parte mais representativa dos centros de serviços partilhados, a maioria dos perfis procurados não requer competências técnicas, mas sim sobretudo competências linguísticas e uma forte vontade.
Mas com o freio Covid, encontramos agora novas competências emergentes, tais como gestão, vendas ou contabilidade. Os cargos estratégicos estão cada vez mais sujeitos à reflexão sobre a externalização por razões económicas.

VE - A maior parte dos serviços prestados em Portugal representam exportações porque se destinam a França e outros mercados?
EV - Temos de nos colocar num contexto demográfico para responder corretamente.
Portugal tem uma população de 10,24 milhões de habitantes (e está em declínio desde 2019). O que corresponde quase à população da aglomeração de Paris (10,7 milhões de habitantes).
Para uma superfície de 92 mil km2, o equivalente da maior região francesa, com 84 mil km2.
A partir deste pressuposto, podemos deduzir que Portugal, que tem uma política agressiva de reconquista económica, é rapidamente limitado pelas suas próprias fronteiras. Daí o desenvolvimento de serviços pensados para a exportação. Os centros de serviços são a melhor opção para tal, dados os elementos vistos acima. Portugal tem também ligações comerciais privilegiadas com outros países (e antigas colónias), como o Brasil, Angola...

VE - O maior potencial de crescimento está nos serviços contratados de forma direta pelas grandes empresas ou nos serviços prestados por empresas especializadas a várias organizações?
EV - O maior potencial a nível de volume de negócios continuam a ser os serviços contratados por grandes empresas.
Mas a tendência para o desenvolvimento de serviços por empresas especializadas não deve ser negligenciada na mudança de qualidade das competências que traz consigo.
O “pool” de emprego, especialmente em Lisboa, é composto principalmente por jovens licenciados. A média de idades dos funcionários dos call centers é de 25 anos e são frequentemente recém-licenciados ou com pouca experiência profissional e estão muitas vezes fora da sua área de especialidade. Com as empresas especializadas, as competências requeridas são mais exigentes. Isto melhora o “pool” de emprego e abre, portanto, novas perspectivas de desenvolvimento em termos de atividade.
Susana Almeida, 01/07/2021
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