Remuneração convencional do capital social;

Remuneração convencional do capital social
Desde o início desta crise, causada pela pandemia de Covid-19, a principal preocupação dos empresários tem sido a de garantir que as suas empresas sobrevivam às dificuldades atuais, preservando assim o emprego. Contudo, não basta que as empresas sobrevivam, é também preciso que mantenham a sua solidez e a sua capacidade para impulsionar a recuperação, à medida que se restabelecerem, gradualmente, condições de regresso à atividade. Para que tal aconteça, é importante que as empresas tenham acesso a apoios do Estado e a financiamentos. 
 
Neste artigo, abordamos o benefício fiscal designado de “remuneração convencional do capital social” que incentiva o financiamento das empresas pelos sócios/acionistas.
 
Aumento da percentagem 
de remuneração
 
Nesta época em que ainda se apuram resultados e se fazem balanços ao ano que terminou (2019), importa avaliar alternativas à simples distribuição dos lucros apurados pelas empresas. 
Os empresários têm ao seu dispor um benefício fiscal com a remuneração convencional do capital social, que visa precisamente incentivar o financiamento das empresas através de capitais próprios, em detrimento do recurso a capitais alheios.
Este incentivo prevê uma dedução ao lucro tributável de uma importância que resulta da aplicação de uma determinada percentagem ao aumento (ou constituição) de capital social e aplica-se a sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas, empresas públicas e demais pessoas coletivas de direito público ou privado com sede ou direção efetiva em território português, desde que o seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos.
Aquando do início da sua aplicação em 2014, este benefício resultava da aplicação da taxa de 5% ao montante das entradas realizadas por sócios pessoas singulares na constituição da sociedade ou aumento de capital, tendo sofrido, ao longo destes anos, alterações quer quanto à percentagem de remuneração quer quanto às modalidades do aumento de capital adotadas.
Com as alterações introduzidas pela Lei do Orçamento do Estado para 2017, a percentagem de remuneração aumentou para 7%, com o limite de 2 milhões de euros, e foi alargada para a constituição da sociedade ou aumentos de capital por entregas em dinheiro e através da conversão de suprimentos ou de empréstimos de sócios. Posteriormente, foi esclarecido que, ainda que os suprimentos tivessem sido realizados em data anterior, desde que se comprovasse a entrada efetiva de capital, estes seriam viáveis para a utilização do benefício fiscal.
Como medida de simplificação para o aumento de capital por conversão de suprimentos, basta uma declaração de conformidade do Contabilista Certificado, tendo sido prescindido o relatório de um Revisor Oficial de Contas. 
Com a Lei do Orçamento do Estado para 2018, manteve-se a percentagem e limite, estendendo-se a aplicação do benefício às entregas em dinheiro ou através da conversão de créditos, ou do recurso aos lucros do próprio exercício no âmbito da constituição de sociedade ou do aumento do capital social.
O benefício fiscal com a remuneração convencional do capital social pode ser utilizado nas entradas de capital no momento da constituição da sociedade e também em aumentos de capital realizados posteriormente à sua constituição.
Este benefício fiscal da remuneração convencional do capital social deixou de estar sujeito às regras europeias aplicáveis em matéria de auxílios “de minimis”.
É imposta, como cláusula antiabuso, a condição de a sociedade beneficiária não proceder à redução de capital com restituição aos sócios, quer no período de tributação em que sejam realizadas as entradas relevantes para efeitos do benefício fiscal com a remuneração convencional do capital social, quer nos cinco períodos de tributação seguintes.
Caso a sociedade beneficiária reduza o seu capital social com restituição aos sócios, quer no período de tributação em que sejam realizadas as entradas quer nos cinco períodos de tributação seguintes, deverá considerar, como rendimento do período de tributação em que ocorra a redução do capital com restituição aos sócios, o somatório das importâncias deduzidas a título de remuneração convencional do capital social, majorado em 15%.
Outra cláusula antiabuso prende-se com o impedimento de utilização do benefício fiscal em cascata a várias sociedades do mesmo grupo económico. Assim, se determinada sociedade utiliza o benefício fiscal e esta mesma sociedade, detendo uma participação noutra, proceder também a aumento de capital, esta segunda sociedade não poderá utilizar novamente o benefício fiscal na parte correspondente ao montante das entradas realizadas que tenham beneficiado do presente regime. 
Atualmente, o benefício fiscal com a remuneração de capital social traduz-se numa dedução ao lucro tributável das empresas que se constituam ou que procedam a aumento do seu capital social. A dedução é de 7% do montante das entradas de capital, com o limite de 2.000.000,00 euros, utilizável no período de tributação em que tal operação se realize e nos 5 períodos de tributação seguintes. 
 
Deliberação de aumento 
de capital
 
A título de exemplo, uma sociedade que, relativamente à aprovação de contas de 2019, delibere um aumento de capital, com recurso aos lucros desse exercício, no valor de 20.000,00 euros, poderá deduzir aos lucros tributáveis apurados em 2019, 2020, 2021, 2022, 2023 e 2024 o valor de 1400,00 euros. Relativamente aos referidos exercícios, poderá usufruir de um benefício fiscal total de 8400,00 euros.
Poderá ser utilizada a modalidade do aumento de capital com recurso aos lucros gerados no próprio exercício, desde que o registo do aumento de capital se realize até à entrega da declaração de rendimentos relativa ao exercício em causa. O aumento de capital deve estar registado na Conservatória antes da submissão da Modelo 22.
De notar que as obrigações fiscais, relativas à entrega da declaração periódica de rendimentos de IRC (declaração Modelo 22) do período de tributação de 2019, podem ser cumpridas até 31 de julho de 2020, para todos os sujeitos passivos sem quaisquer acréscimos ou penalidades, de acordo com o Despacho n.º 104/2020 XXII do SEAF, de 9 de março. 
Por outro lado, uma entidade que tenha efetivamente realizado aumentos de capital em anos anteriores e que não tenha utilizado este benefício, estando ainda dentro do limite referente aos 5 períodos de tributação, poderá ainda utilizar este benefício referente aos exercícios que faltarem para completar esse período.
Tratando-se de um benefício meramente fiscal, este deverá ser considerado no campo 774 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 e, consequentemente, preenchido o campo 409 do quadro 04 do anexo D da referida declaração fiscal aquando do apuramento do lucro tributável do período.
Eulália Pereira Consultora da Ordem dos Contabilistas Certificados comunicacao@occ.pt, 02/07/2020
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