Preservação ou Destruição? O Futuro da Serra D’Arga e Alto-Minho;

Preservação ou Destruição? O Futuro da Serra D’Arga e Alto-Minho
O conjunto montanhoso da Serra D’Arga localizado no noroeste de Portugal continental, em pleno coração do Alto Minho, abrange áreas dos concelhos de Caminha, Vila Nova de Cerveira, Viana do Castelo e Ponte de Lima.

Com uma área aproximada de 10 mil hectares, inserida na região hidrográfica dos rios Minho e Lima, marca profundamente a paisagem de toda a região.
Há anos que o seu maciço central e respectivos vales, tem sido objecto de estudo, em várias vertentes, nomeadamente do subsolo e recursos hídricos e geológicos.
Dada a diversidade, curiosidade e interesse científico nos minérios existentes na região, muito embora, em quantidade insuficiente para uma exploração rentável e sustentável, há “aqueles” que insistem em “aguçar” o apetite de possíveis investidores e reconverter/transformar a Serra D’Arga em Euros com a “corrida” ao lítio, o “ouro branco” (e subentenda-se, a todos os outros minérios de estanho, volfrâmio, ouro, prata, nióbio e tântalo), não tendo em conta outros valores e nem a população local.
Desde 2016, com diversos pedidos de prospecção do subsolo submetidos à DGEG (área abrangida na ordem das centenas de Km2), paira sobre a Serra D’Arga a ameaça de uma possível exploração mineira, na qual se insere a extracção do afamado “lítio”, apregoado como a alternativa “verde” para substituição dos combustíveis de origem fóssil. Pese, embora, a possibilidade de existirem alternativas a breve prazo (caso haja boa vontade), mais “amigas” do ambiente e mais baratas, mas menos rentáveis (logo, menos “apetecíveis”).
Apesar de 4500 hectares estarem integrados na Rede Natura 2000, sendo uma importante classificação para a protecção e preservação de todos os valores naturais envolvidos na Serra D’Arga, surge, por outro lado, o projecto de decreto-lei que procede à regulamentação da Lei nº 54/2015, de 22 de junho, no que respeita aos depósitos minerais.
Caso este decreto-lei seja promulgado, poderá pôr em causa a preservação e continuidade da área abrangida pela Rede Natura? Se sim, a referida classificação não dará qualquer “garantia” de protecção da Serra D’Arga e área envolvente.
Só decisões tomadas em secretárias confortavelmente instaladas em gabinetes aconchegantes, mas completamente desfasadas e ignorantes da realidade da região, dos seus inestimáveis valores naturais, culturais, paisagísticos, etnográficos, imateriais e antropológicos, poderão, ousar, considerar a hipótese da sua exploração mineira.
Se tal vier a suceder, a exploração com minas a céu aberto e suas enormes crateras, terá um impacto brutal e irreversível.
Restará a destruição da paisagem, a formação de escombreiras gigantescas de detritos/rejeitados, a destruição dos habitats, a poluição do ar e solos, e consequente contaminação de nascentes e afluentes dos rios que abastecem as populações rurais e urbanas.
É obrigatório que toda a região, entre os rios, Minho e Lima, seja protegida com afinco pelas populações, pelas instituições que zelam pela conservação da natureza e património, pelas autarquias, associações e movimentos de cidadãos comprometidos com a nossa “casa-mãe”, a natureza.
Muitas questões se levantam sobre os verdadeiros riscos e oportunidades de tal exploração, para as quais urge procurar respostas e soluções verdadeiramente sustentáveis e adequadas à região.
Que interesse existe em Portugal, em várias zonas do país ameaçadas (algumas já com contratos de exploração: Argemela, Covas de Barroso e Montalegre), e nomeadamente na Serra D’Arga, em “partir” pedra?
Literalmente, partir muita pedra… com reduzida concentração em lítio, destruindo “toneladas” de montanhas, reduzindo-as a pó, “arrasando” as suas florestas e vales, poluindo e secando as nascentes, contaminando a água dos afluentes das nossas albufeiras e rios? Água (fonte de vida) que irá abastecer as populações, as actividades agrícolas, da pecuária, ligadas ao turismo e outras.
Num país de pequena dimensão como o nosso, que interesses estão por trás dessa “megalomania”? Basta analisar dados concretos e exemplificar com a lista dos países no “top” das maiores reservas de lítio a nível mundial:
1. Bolívia – 21.000.000 toneladas
2. Argentina – 17.000.000 toneladas
3. Chile – 9.000.000 toneladas
4. EUA – 6.800.000 toneladas
5. Austrália – 6.300.000 toneladas
6. China – 4.500.000 toneladas

Portugal – 60.000 toneladas
As estimativas das reservas de minério de lítio em Portugal, representam assim menos de 0,29% das reservas do 1º país no topo da lista, a Bolívia, e cerca de 0,13% das reservas das três principais reservas da América do Sul. Nestes três países, o lítio encontra-se praticamente à superfície em grandes lagos salgados, sendo o Salar de Uyuni, no sul da Bolívia, a maior reserva mundial (área total de 12 mil Km2), no qual o processo de extracção é muito mais simples e muito menos agressivo para o ambiente.
É urgente que se tenha noção de dimensão e proporção, que não “assiste” aos decisores do futuro dos nossos recursos naturais mais importantes: as florestas e os recursos hídricos, essenciais à vida.
Não poderia terminar esta crónica sem versar a singularidade e autenticidade da Serra D’Arga e sem transmitir uma mensagem de coragem e esperança.

Cenário idílico,
Palco de luz e paz,
És dos que labutaram no teu duro regaço,
Sob o frio, calor ou intempérie!
Pertences aos que caminharam nos teus duros trilhos,
Dos que reergueram a pulso a tua floresta encantada.

És também dos que respeitaram e protegeram,
As tuas ricas e viçosas pastagens,
As tuas águas puras e cristalinas,
As riquezas sabiamente escondidas no teu ventre!
És abrigo de fauna e flora únicas.

És um tesouro sagrado,
Rainha e Mãe,
Altiva e majestosa na tua imponência,
Discreta na tua beleza!

Serás sempre dos que souberam amar-te,
Preservar e proteger,
Novos e velhos, também dos que já partiram,
E que muito antes, durante séculos,
Foram-te “guardando” para as gerações vindouras.
Assim há-de manter-se!
Serás sempre nossa, Serra D'Arga!




Regina Lavandeira Escritora, 27/01/2021
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