Alterações ao regime dos Vistos Gold, ainda bem que se fez luz!;

Alterações ao regime dos Vistos Gold, ainda bem que se fez luz!
Na passada sexta-feira, 12 de fevereiro, foi finalmente publicado em Diário da República o Decreto-Lei n.º 14/2021, de 12 de fevereiro, que altera a Lei 23/2007, de 4 de julho, ou seja, o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.

O Governo, a oposição, a comunicação social e o publico em geral especularam ao longo de vários meses sobre as anunciadas alterações ao regime dosVistos Gold. Houve até quem anunciasse o seu fim.

A expectativa era muita, mas, no final, ainda bem que se fez luz!

O programa dos Vistos Gold é um sucesso que muito deveria orgulhar o nosso país, dado que desde 2012 já foram captados €5 672 107 919,65de investimento em Portugal. A este valor é necessário acrescentar os postos de trabalho que foram criados. Assim, em nossa opinião, aquilo que o Governo e o país deveriam debater neste momento, especialmente tendo em conta a fase que o país atravessa, é saber como podemos atrair mais investimento para Portugal e como este Regime poderia ajudar a alavancar a economia nacional.

 

Contrariamente ao que muitos davam como certo, a possibilidade de obtenção de um Visto Gold através de investimento imobiliário nas cidades de Lisboa e do Porto não foi eliminada, pelo contrário, continua a ser elegível para Autorização de Residência por Investimento e, na verdade,nem os valores mínimos de investimento foram alterados.

 

A única mudança no que respeita ao investimento imobiliário prende-se com a finalidade dada ao imóvel. Assim, desde que o imóvel seja destinado a serviços, e.g. escritórios, comércio, restauração, hotelaria,e até mesmo o alojamento local não há qualquer restrição ou impedimento ao investimento em qualquer zona do país.

 

Claro é que a exclusão se aplica apenas à aquisição de bens imóveis para habitação (permanente ou secundária). Contudo, não há qualquer impedimento caso o imóvel seja adquirido para habitação nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira ou no interior de Portugal Continental.

Muito foi dito sobre o impacto dos Vistos Gold no preço da habitação nas grandes cidades. No preâmbulo do Decreto-Lei o Governo afirma que com a adoção destas regras visa corrigir assimetrias regionais e promover o equilíbrio e a qualidade da habitação em todo o território, e entende que a mesma é uma política chave para o bem-estar da população e o dinamismo demográfico.

A correção de assimetrias regionais e a promoção do equilíbrio e qualidade da habitação são objetivos louváveis, no entanto, tal só será possível através da adoção de uma nova Portaria que não a  Portaria 208/2017, de 13 de julho,pois parece-nos que esta última é inadequada ao objetivo de captação de investimento para todo o território nacional sendo necessário nesta fase conceber um verdadeiro objeto de planeamento.

O que efetivamente se verificou foi um aumento dos valores mínimos de investimento que envolvem outras categorias de investimento que não o imobiliário, vejamos:
 

    • Transferência de capitais no montante igual ou superior a € 1 500 000;
    • Transferência de capitais no montante igual ou superior a € 500 000, que seja aplicado em atividades de investigação desenvolvidas por instituições públicas ou privadas de investigação científica;
    • Transferência de capitais no montante igual ou superior a € 500 000, destinados à aquisição de unidades de participação em fundos de investimentoou fundos de capitais de risco vocacionadospara a capitalização de empresas, que sejam constituídos ao abrigo da legislação portuguesa;
    • Transferência de capitais no montante igual ou superior a € 500 000, destinados à constituição de uma sociedade comercial ou reforço de capital em sociedade comercial já existente, com a manutenção ou criação de 5 postos de trabalho permanentes; 

Quanto à transferência de capitais no montante igual ou superior a € 500 000, que seja aplicado em atividades de investigação desenvolvidas por instituições públicas ou privadas de investigação científica, na nossa opinião, esta é a pior alteração efetuada por este Decreto-lei. Senão vejamos:

 

Esta via de investimento foi adicionada ou criada no programa de Vistos Gold em 2015 através de uma alteração legislativa.

 

Desde então, segundo dados oficiais do SEF, nenhum investidor estrangeiro obteve Visto Gold mediante esta via de investimento. Salvo melhor opinião, mais certo será dizer que nenhum investidor estrangeiro terá escolhido ou investido em qualquer instituição pública ou privada em Portugal para o desenvolvimento de investigação científica. Deste modo, arriscamos afirmar que com um aumento de € 150.000 no montante mínimo de investimento, esta via tornou-se ainda menos atrativa.

 

Assim, em contexto de pandemia e numa altura em que, segundo um estudo publicado pela Associação Académica de Coimbra sobre “O Impacto do Confinamento na Academia de Coimbra”, 74% dos alunos da Universidade de Coimbra pensaram em desistir de estudar, – onde se inserem alunos dos mais diversos ciclos de estudosou áreas de investigação -, e num momento em que todas as instituições públicas ou privadas quase que desesperam por financiamento, a alteração promovida pelo Governo, alavancada por propostas de ação concretas apresentadas pela respetiva tutela, deveria ter sido o exato oposto, ou seja, diminuir o montante de investimento com o intuito de atrair mais investidores.

 

Por fim, quanto à transferência de capitais no montante igual ou superior a € 500 000, destinados à constituição de uma sociedade comercial ou reforço de capital em sociedade comercial já existente, o aumento do valor mínimo de investimento em €150 000,00 tornou esta opção menos atrativa numa fase em que a indústria tanto precisa de investimento.

 

Segundo dados oficiais do SEF, desde a criação desta via de investimento, apenas 3 cidadãos obtiveram um Visto Gold através desta via de investimento.

 

Ora, em contexto de pandemia e numa altura em que imensas empresas enfrentam severas quebras na faturação e são obrigadas a colocar os seus trabalhadores em regime deLayoff, o aumento de € 150.000 no montante mínimo de investimento acrescido aos riscos naturalmente associados a qualquer atividade empresarial, esta via de investimentotornou-se manifestamente menos atrativa.

De facto, para ajudar o tecido empresarial português, acompanhado por propostas de ação concretas apresentadas pela respetiva tutela, na nossa opinião, o Governo poderia e deveria ter criado um incentivo a esta via de investimento tendo por exemplo aumentado o número mínimo de postos de trabalho a manter ou a criar, em vez de ter aumentado o montante mínimo de investimento.

 

Enfim, resta realçar que estas alterações não só apenas entram em vigor em 1 de janeiro de 2022, como não afetam os processos de autorização de residência já submetidos (seja de concessão ou renovação).

Joana whyte Advogada Associada da Next-Gali Macedo e Associados | Pedro Catão Pinheiro Coordenador do Departamento de Imigração da NEXT GALI MACEDO & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL, 25/02/2021
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