Venda das barragens da EDP não supunha a existência de benefícios fiscais;

De acordo com José Maria Pires, professor do ISG
Venda das barragens da EDP não supunha a existência de benefícios fiscais
A venda das barragens da EDP à Engie não supunha a existência de quaisquer benefícios fiscais, tendo em conta o formato de que se revistiu a operação. Por sua vez, o cimento que constitui as barragens não deixa de estar sujeito a tributação, independentemente de quem assume a sua propriedade, defendeu o docente José Maria Pires, durante os Serões de Fiscalidade ISG, sob o tema “O planeamento fiscal e o negócio da venda das barragens”.
O negócio em causa tem duas vertentes, uma política e outra de carácter mais técnico. Acontece que as duas vertentes não podem ser dissociadas. “Este é um negócio em que intervêm três partes, o alienante, o adquirente e o Estado. Este tem de intervir no negócio porque envolve bens do domínio público. Por sua vez, o Estado foi alertado, através do ministro do Ambiente, que deveria impor como condição para o negócio se realizar que fossem respeitadas as obrigações que a lei, teoricamente, estabelece para este tipo de situações.” José Maria Pires lembrou que desde 1959 que a lei exige que, quando o concessionário de uma qualquer concessão feita pelo Estado ou pelas autarquias cede a dita concessão, incidia um imposto de 10% de Sisa. Ora, esta norma passou precisamente nos mesmos moldes para a atual legislação.
Neste caso, o que acontece é que a concessão das barragens do Douro Internacional não é um contrato estabelecido para exploração de cada uma das barragens. “É um contrato feito antes da construção das barragens, em que o Estado concede à então concessionária o direito de explorar a riqueza produzida pelas águas do Rio Douro. A empresa ficou livre de fazer os estudos e as construções que entendeu necessários para essa exploração. Este foi o direito transmitido.” Ora, o docente universitário sublinhou que na altura foi chamada a atenção do referido ministro que só deveria aceitar a transmissão no caso de se cumprirem as obrigações fiscais que a lei estabelece para situações deste tipo. Isso não foi feito e não se pode voltar atrás.
A segunda questão que se coloca é saber se neste negócio se está perante uma reestruturação empresarial. As reestruturações não são tributadas, mas há dois regimes de reestruturações, os regimes geral e especial dos benefícios fiscais. Para que uma reestruturação usufrua destes benefícios fiscais é necessário que se cumpram determinados requisitos.
 
Ausência de especialização
 
O primeiro requisito é que essas operações conduzam ao aumento de produtividade das empresas, mediante a rentabilização e a competitividade, por duas vias, a especialização e o aumento de capacidade. “A EDP vende algumas das suas barragens na bacia do Douro Internacional, pelo que dificilmente se pode entender que há uma especialização em resultado desta operação. Do ponto de vista formal, a lei tem duas formas de cisão, uma para constituir uma nova empresa e outra para que a fatia cindida se integre numa empresa já existente. Esta segunda opção não teve lugar. Foi constituída uma nova empresa. E esta nova empresa, quando foi constituída, era para extinguir. Não há benefícios fiscais para empresas que vão morrer”, adiantou José Maria Pires.
Do ponto de vista literal da lei, a EDP jogou com as duas modalidades. Ora, a lei só se aplica a uma opção. “De facto, não estamos perante um ramo de atividade, mas um conjunto de ativos que foi vendido e não se cumpriu o requisito de estas explorações continuarem a ser desenvolvidas da mesma forma que eram antes da operação. Além disso, as barragens em causa não têm autonomia para serem geridas autonomamente, como exige a lei. De salientar ainda que, antes da realização do negócio, ambas as entidades tinham a noção de que se tratava de uma transação.
guilherme osswald (guilherme@vidaeconomica.pt), 14/10/2021
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