Setor imobiliário tem condições para superar a crise
O investimento na habitação continuará a ser prioritário, o que leva a pensar que o setor imobiliário tem condições para resistir à crise e até manter uma tendência de crescimento nos próximos anos. Será uma das poucas exceções, com a maioria das atividades económicas a passar por sérias dificuldades. Mas restam oportunidades em aberto, até porque chegará o momento de uma forte retoma, adiantou Miguel Maya à “Vida Judiciária”, CEO do Millennium bcp.
Em tempos de crise, em momentos de elevada imprevisibilidade, as pessoas procuram encontrar referências e pontos de suporte que permitam uma nova estabilidade, uma nova normalidade. Estamos a viver uma crise económica, que, tendo tido origem numa crise sanitária, tomou dimensões únicas nas vidas profissionais. Esta crise ocorre num momento em que o mundo já se defrontava com mudanças climáticas, com implicações muito relevantes para a estabilidade da economia.
As previsões económicas efetuadas por diferentes instituições de referência são preocupantes, no sentido dos múltiplos riscos decorrentes de uma quebra abrupta do PIB, do aumento significativo do desemprego, do défice orçamental gerado e do enorme peso da dívida pública. Mas há simultaneamente nestas previsões sinais encorajadores. Quem vê apenas os aspetos negativos e as ameaças assusta-se, em lugar de entender os riscos, e perde a perspetiva de que esta crise traz também consigo enormes oportunidades, por exemplo decorrentes de uma resposta ao nível dos estímulos financeiros e fiscais que permitirá, algures no tempo, uma forte recuperação, como aliás fica também saliente nas previsões disponíveis.
Passado o impacto inicial, a economia começa a dar sinais de recuperação. O sentimento empresarial, após uma queda sem precedentes, recupera nos principais blocos económicos, o mercado acionista supera já os valores pré-crise, com exceção saliente do setor financeiro, onde todos os riscos parecem ficar depositados, ao que não é alheio o facto de termos no nosso balanço o crédito à economia, aos agentes económicos que vão sobreviver, mas também aos muitos que vão desaparecer.
Há sinais claros de retoma em Portugal, mas os riscos são significativos
Em Portugal, evidenciam-se sinais claros de retoma, mas o desempenho é muito marcado pelas características específicas do modelo de desenvolvimento económico, não só pelo facto de o peso do turismo ser muito forte – sendo este um setor que vai demorar mais tempo a recuperar –, mas também pela situação específica do mercado ibérico, pelos elevados rácios de endividamento do país e das empresas e pelas restrições orçamentais que resultaram da anterior crise e que ainda nos condicionam.
Os riscos com que nos deparamos são significativos e o impacto imediato é já bem visível e gravoso, sendo que o impacto estrutural vai depender da duração da crise sanitária e da reação positiva ou de acomodação dos agentes económicos.
As insolvências e o desemprego influenciam a capacidade produtiva. Há já uma efetiva destruição de capital, tangível e intangível (competências, relações, redes); mas há simultaneamente o reforço da posição de alguns operadores e o surgimento de novos players.
A inovação, a capacidade empresarial e o funcionamento das instituições do Estado serão determinantes no desenho do que será o tecido empresarial e a sociedade portuguesa no pós-pandemia.
O prolongamento da crise, chamem-lhe segunda vaga ou o que quer que seja, será obviamente muito negativo, sendo já visível o aumento expressivo de casos positivos desde o início de agosto, sendo que, embora não acredite que venha a haver um novo confinamento, a confiança e a atividade económica podem ser negativamente impactadas, atrasando a retoma.
A recuperação será mais lenta em alguns setores que estão a ser mais afetados pela crise
Há múltiplos setores muito afetados, mas em dois deles o impacto está a revelar-se particularmente significativo e nos quais a retoma será mais lenta: a indústria automóvel e o turismo, sendo que o turismo tem implicações muito relevantes ao nível do investimento imobiliário, já visível na suspensão de grande parte dos projetos de hotéis para 2020.
Se Portugal perder a notação de “investment grade”, haverá consequências bastante negativas para todos os setores, com relevância acrescida para o setor do investimento imobiliário. Basta imaginar as “yields” requeridas pelos investidores, os custos de financiamento, a diminuição da procura por parte dos particulares, a perda de confiança na economia portuguesa.
O setor empresarial português tem fragilidades conhecidas, tais como a reduzida capitalização e excessiva alavancagem, que vão ser exacerbadas pela presente crise e que terão implicações no nível da viabilidade de múltiplas empresas. É necessário sermos realistas e admitir que muitas empresas vão desaparecer em múltiplos setores. Esse realismo, esse pragmatismo é necessário até para alocar os escassos recursos disponíveis e requer uma rede social reforçada.
O setor imobiliário está bem posicionado para vencer a crise
Nem todos os setores estão a sentir a crise da mesma forma e as atuações empreendidas e a empreender vão posicionar alguns setores como prováveis vencedores. Um deles pode ser claramente o setor do investimento imobiliário.
Grandes perturbações, como é o caso das pandemias, têm historicamente implicações duradouras ao nível dos comportamentos. Condicionam investimento, consumo, a tomada de risco. Condicionam, não eliminam. O importante é perceber a “nova dinâmica” tantas vezes referida como “nova normalidade”. O setor do investimento imobiliário tem seguramente múltiplas oportunidades nos próximos anos.
A pandemia não está a ter um efeito negativo no preço do imobiliário residencial, nem em Portugal, nem ao nível do mercado europeu e norte-americano, assim como o crédito à habitação abrandou, mas não se evaporou. As pessoas têm a noção de que a crise resulta da pandemia e têm perspetivas de forte retoma económica após a disponibilização de uma vacina.
As previsões relativas à evolução do produto e do emprego levam a que o investimento na habitação permaneça como prioritário. As taxas de juro muito baixas, por um horizonte temporal mais dilatado, estimulam a canalização da poupança para o investimento, com destaque para o investimento imobiliário. A oferta em Portugal continua a não ser excessiva, pelo que não se perspetiva um ajustamento estrutural em baixa ao nível dos preços. Haverá certamente em alguns produtos e segmentos do mercado, mas tal resultará de alterações de padrões e comportamentos e não diretamente da crise que estamos a viver.
O facto de os preços terem subido nos últimos anos foi sobretudo o efeito da recuperação da anterior crise, não existindo uma bolha transversal no imobiliário em Portugal. Estou mais conservador e menos entusiasta relativamente aos espaços comerciais e aos escritórios. Esta crise funciona como um acelerador de tendências e assistimos a um forte aumento de interações digitais e provavelmente a modelos de trabalho diferentes dos do passado, com maior componente de teletrabalho e localizações físicas mais disseminadas.
Complexidade do contexto recomenda prioridade na extensão de moratórias para alguns setores de atividade
Face à elevada dívida pública e às demais limitações que Portugal tem, uma das prioridades deveria efetivamente passar por estender as moratórias para as empresas em alguns setores de atividade, especialmente para as que não podem armazenar o que produzem: ninguém compra as viagens não realizadas em 2020 nem as dormidas de hotel não verificadas – são “cash-flows” que se perderam.
A extensão das moratórias assegura não só que as empresas continuem a ter menores necessidades de tesouraria até recuperarem os “cash-flows” para uma situação de normalidade, como se salvaguarda uma menor necessidade de apoios públicos suportados no Orçamento do Estado, condição indispensável para não agravar ainda mais as contas públicas.
O Millennium bcp está muito bem preparado e determinado no apoio à economia
O Millennium bcp está profundamente empenhado em apoiar a economia e o investimento. Nós estamos na mesma mesa dos restantes agentes económicos – e é uma mesa redonda. Somos um banco sistémico e o nosso principal ativo é o crédito à economia. Se a economia estiver mal, nós estaremos seguramente mal. Pelo que é imperativo estarmos saudáveis para poder ajudar. Os voluntarismos, apoiar tudo e todos sem critério e rigor, são absolutamente desastrosos. Rapidamente, seriamos contaminados, adoeceríamos e deixaríamos de servir a economia.
Quer em termos de solvabilidade, quer em termos de liquidez, o Millennium bcp está bem preparado. Dispomos de rácios quer de capital quer de liquidez muito superiores aos requisitos de capital regulamentar. Temos ativos disponíveis para nos financiarmos no BCE, superiores a 21 mil milhões de euros.
Neste momento em que já temos alguma visibilidade sobre as variáveis críticas que suportam as decisões de investimento, é nosso dever contribuir ativamente para a retoma identificando as oportunidades de geração de valor. As empresas e os empresários podem contar com o Millennium bcp.