Transporte aéreo e os direitos dos passageiros – Regulamento (ce) n.º 261/2004, de 11 de fevereiro ;

Transporte aéreo e os direitos dos passageiros – Regulamento (ce) n.º 261/2004, de 11 de fevereiro


Andreia Delgadinho

Advogada e Associada JALP
A União Europeia, atenta ao princípio da livre circulação (artigo 3.º, n.º 2, do Tratado da União Europeia e artigo 45.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União), tal como à importância dos direitos dos consumidores, instituiu o Regulamento n.º 295/91, que estabelecia regras comuns referentes a um sistema de indemnização por recusa de embarque de passageiros nos transportes aéreos regulares.
No entanto, em 2001, o legislador europeu entendeu que o diploma em causa deveria ser substituído. Após três anos, surgiu o atual Regulamento 261/2004, publicado a 17 de Fevereiro de 2004 e que entrou em vigor em 2005.
Este Regulamento tem como finalidade/objeto assegurar um elevado nível de proteção dos direitos dos consumidores, através da estipulação de um conjunto de regras comuns para a indemnização e a assistência dos passageiros dos transportes aéreos em várias hipóteses: recusa de embarque, cancelamento ou atraso dos voos.
Ou seja, o Regulamento reconhece direitos a estes consumidores nas situações de recusa de embarque contra sua vontade, atraso de voos e cancelamento.
No entanto, não se aplica aos passageiros com viagens gratuitas ou com tarifa reduzida não disponível, directa ou indiretamente ao público.
O âmbito de aplicação deste diploma pode dividir-se em três partes (artigo 3.º do Regulamento): âmbito territorial (art. 3.º, n. º 1), pessoal (art.º 3, n.º 2) e corporativo (art. 3.º, n.º 3).
No que concerne ao âmbito territorial, o regulamento aplica-se:
1- A passageiros que partem de um aeroporto localizado no território de um país da União Europeia a que os Tratados se aplicam;
2- A passageiros que partem de um aeroporto localizado num país que não pertence à União Europeia com destino a um aeroporto situado no território de um país da União Europeia a que os Tratados da União se aplicam, se a transportadora aérea operadora do voo for uma transportadora aérea da UE, exceto quando tenham sido prestados ao consumidor benefícios, indemnização e que lhes tenha sido prestada assistência no país terceiro, se a transportadora aérea operadora do voo em causa tenha sido uma transportadora comunitária (com licença de exploração válida emitida por um Estado Membro da União Europeia).
No âmbito pessoal, o Regulamento é aplicável a passageiros que possuam uma reserva confirmada para um voo e se apresentem para embarque com a antecedêncida exigida pela respetiva transportadora aérea (exceto se forem previamente informados de um cancelamento) e a passageiros que tenham sido transferidos por uma transportadora aérea ou eventualmente um operador turístico do voo para o qual possuíam uma reserva para outro voo.
Quanto ao âmbito corporativo, o Regulamento 261/2004 aplica-se a qualquer companhia aérea que forneça transporte aéreo, a passageiros abrangidos pelos n.os 1 e 2 do artigo 3.º, estando incluídos voos charter, domésticos e internacionais operados por qualquer companhia aérea, seja convencional ou de baixo custo (as designadas de «low-cost»).
As companhias aéreas que operem fora do Espaço Económico Europeu, independentemente da sua nacionalidade, deverão respeitar as normas legais em vigor no espaço europeu quando prestam os seus serviços nesse Espaço.
No setor do transporte aéreo, as maiores queixas dos consumidores que se têm registado ficam-se a dever, nomeadamente, a cancelamentos, atrasos, recusas de embarque (por exemplo, casos por overbooking e problemas com a sua bagagem). Por isso, iremos agora abordar os direitos dos consumidores nestes casos.

A recusa de embarque (artigo 4.º)
Esta recusa, definida na alínea j) do artigo 2.º como recusa de transporte de passageiros num voo, apesar de estes terem apresentado toda a documentação, decorre essencialmente da prática de overbooking pelas transportadoras aéreas.
A União Europeia não proibiu a prática de recusa de embarque, mas tentou de algum modo minimizar os seus efeitos pelo conteúdo do art. 4.º.
Caso a transportadora aérea tenha motivos razoáveis para prever que irá recusar o embarque para qualquer voo, deverá apelar a voluntários que aceitem as suas reservas pela contrapartida de benefícios, direito a reembolso ou reencaminhamento.
No cancelamento do voo aéreo, os passageiros têm direito (artigo 5.º do Regulamento):
1 - Assistência - refeições e bebidas em proporção razoável com o tempo de espera; alojamento na eventualidade de se tornar necessária a estadia por uma ou mais noite ou uma estadia adicional à prevista pelo passageiro; transporte gratuito entre o aeroporto e o local de alojamento; duas chamadas telefónicas gratuitas, dois telexes, duas mensagens, via fax ou por correio electrónico. Exceto se o passageiro for informado previamente no prazo de 14 dias de antecedência do prazo do voo, se tiver sido reencaminhado para um horário próximo ao que estava originalmente marcado.
2 – Direito a reembolso ou reencaminhamento;
3 – Direito a indemnização (artigo 7.º), salvo se:
i) tiverem sido informados do cancelamento pelo menos duas semanas antes da hora programada de partida, ou
ii) tiverem sido informados do cancelamento entre duas semanas e sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até duas horas antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até quatro horas depois da hora programada de chegada, ou
iii) tiverem sido informados do cancelamento menos de sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até uma hora antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até duas horas depois da hora programada de chegada.
A transportadora aérea operadora não é obrigada a pagar uma indemnização, nos termos do artigo 7.º, se se puder provar que o cancelamento se ficou a dever a circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis.
No que concerne ao ónus da prova relativamente à questão de saber se e quando foi o passageiro informado do cancelamento, este recai sobre a transportadora aérea operadora.
Na hipótese de cancelamento, os consumidores têm o direito de serem esclarecidos sobre eventuais transportes alternativos.
Para efeitos de cálculo do valor da indemnização que se tem vindo a referir, este, está dependente da distância do voo (art.º 7.º):
1 - 250 euros para todos os voos até 1500 quilómetros;
2 - 400 euros para todos os voos intracomunitários com mais de 1500 quilómetros e para todos os outros voos entre 1500 e 3500 quilómetros;
3- 600 euros para todos os voos não abrangidos pelos n.ºs 1 e 2.
No caso de estarmos perante voos com escala, a distância para efeitos indemnizatórios é determinada com base no último destino a que o passageiro chegará com atraso em relação à hora programada de chegada do voo.
Ou seja, o Regulamento, dispõe que deve ser aplicado o método da rota ortodrómica para cálculo das distâncias. Método este tradicionalmente utilizado na aviação para medição da distância aérea.
No entanto, as transportadoras têm a possibilidade de reduzir 50% da indemnização se oferecem ao passageiro a hipótese de reencaminhamento para o seu destino final, um voo alternativo (artigo 7.º, n.º 3).
Esta redução só se aplica se a hora de chegada não exceder duas horas, face à hora programada (voos até 1500 Km), três horas (voos intracomunitários com mais de 1500 km e para outros voos entre 1500 km e 3500 km) ou quatro horas (para restantes situações).
Importa referir que o consumidor, para fazer valer o seu direito de reembolso e/ou de indemnização, deverá reclamar, num formulário específico, junto da transportadora aérea. Se, no prazo de seis semanas a contar da data da recepção da referida reclamação, não houver resposta ou se for insatisfatória face aos seus direitos, o passageiro pode remeter a reclamação à entidade nacional competente do país onde ocorreu o incidente, com o objetivo de esta analisar o cumprimento do Regulamento 261/2004.
No caso de Portugal, a entidade fiscalizadora e para a qual deve ser enviado o formulário da reclamação é a ANAC – Autoridade Nacional da Aviação Civil.

Atrasos (art.6.º)
O Regulamento dispõe que, quando, por motivos razoáveis, a transportadora aérea preveja que em relação à hora programada de partida um voo se vai atrasar, o consumidor tem direito a receber assistência, nos seguintes casos de atrasos:
- Duas horas, em viagens até 1500 km;
- Três horas, viagens superiores a 1500 km dentro EEE, ou viagens entre 1500 e 3500 km que esteja em causa um aeroporto fora do EEE;
- Quatro horas, viagens superiores a 3500 Kms que envolvam um aeroporto fora do EEE.
Caso o voo se atrasar, pelo menos, cinco horas e se o passageiro não pretender seguir viagem, este tem direito ao reembolso do seu bilhete e a ser transportado de volta para o local de partida inicial.
Por fim, se o passageiro chegar ao destino final com um atraso de três ou mais horas, este tem direito a uma indemnização entre 250 e 600 euros.
No entanto, e face à pandemia Covid-19 que assolou o Mundo, o Conselho da União Europeia emitiu uma Recomendação que faz uma abordagem coordenada das restrições à liberdade de circulação em resposta à Covid-19. Esta estabeleceu um enquadramento para os seguintes aspetos e que se passam a citar: «aplicação de critérios e limiares comuns para decidir se se são ou não introduzidas restrições à liberdade de circulação, um mapeamento do risco de transmissão da Covid-19 com base num critério de cores convencionado e uma abordagem coordenada das eventuais medidas que podem ser adequadas a ser aplicadas às pessoas que se deslocam nessas zonas».
Em Portugal, todos os consumidores, antes de viajar, devem consultar o portal das Comunidades Portuguesas, pelo link: https://portaldascomunidades.mne.gov.pt/pt/covid-19-viagens-para-portugal
Caso pretenda viajar para o estrangeiro, antes de se deslocar, o consumidor deverá conhecer as regras em vigor no país para onde se desloca, bem como nos países onde passará em trânsito.
Para isso, os viajantes deverão ser consultar os Conselhos aos Viajantes, constantes no Portal das Comunidades Portuguesas. Acresce que os viajantes podem descarregar a aplicação «Registo de Viajantes» para situações de emergência, por forma a facilitar a atuação das autoridades nacionais nos casos reportados, com o objetivo de auxiliar e orientar os passageiros no sentido da resolução do seu conflito.
29/11/2021
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