Não residentes – representante fiscal ou registo para efeitos de IVA?
A globalização, enquanto processo mundial de desmaterialização ou de integração de informações e operações, remete-nos para um constante aumento de transações económicas cujo enquadramento fiscal importa acautelar.
Neste artigo pretendemos abordar o enquadramento em sede de IVA das operações tributáveis realizadas em território nacional por entidades não residentes. A crescente utilização da regra de inversão do sujeito passivo, que transfere a obrigação de liquidação do imposto para a entidade adquirente, e os efeitos daqui decorrentes ao nível do direito à dedução do IVA suportado elevam a necessidade de clarificação deste tema. De facto, além da indispensável clareza e segurança, fundamentais para potenciar a realização destas operações em Portugal pelas entidades não residentes, importa também garantir que as entidades residentes, enquanto adquirentes de tais operações, estão a agir corretamente no que ao IVA respeita.
As recentes FAQ disponibilizadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), no seguimento da publicação do Ofício-circulado n.º 30235/2021, de 27 de abril, demonstram a importância da matéria.
Regra da inversão
Os sujeitos passivos não residentes são aqueles que não possuem sede, estabelecimento estável nem domicílio no território nacional. No entanto, quando determinada entidade, ainda que não residente, pratique operações abrangidas pela incidência do IVA em território nacional, por exemplo a venda de um bem ou a prestação de um serviço, torna-se sujeito passivo do imposto e deve proceder ao registo para efeitos de IVA, isto é, obter o respetivo número de identificação fiscal. A exceção a esta regra ocorre quando tal entidade não é devedora do imposto por aplicação da regra da inversão, ou seja, quando a obrigação de liquidação do imposto é transferida para a entidade adquirente, que será um sujeito passivo de IVA em território nacional.
Assim, um sujeito passivo não residente, que exerça uma atividade económica em território nacional, ou seja, que aqui realize operações tributáveis, deve registar-se para efeitos de IVA quando, nos termos da lei, for o devedor do imposto. Por exemplo, quando efetua importações, exportações ou vendas a particulares no território nacional (fora do âmbito de regimes especiais de Balcão Único – OSS).
Por sua vez, um sujeito passivo não residente que apenas efetue operações pelas quais o devedor do imposto é o adquirente, por estar abrangido pelas regras da inversão do sujeito passivo [previstas nas alíneas e), g) e h) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA], não deve possuir um registo para efeitos de IVA em território nacional, nem utilizar NIF português para a realização dessas operações.
Até aqui, uma entidade não residente que já possuísse registo para efeitos de IVA em território nacional utilizava este NIF para todas as operações aqui localizadas, inclusive naquelas que seriam suscetíveis de aplicação da regra da inversão. Com as recentes informações, clarifica-se que, estando em causa uma operação abrangida pela regra da inversão praticada por um sujeito passivo não residente e aqui localizada, será a entidade adquirente quem deve proceder à liquidação do imposto, não devendo este não residente utilizar o NIF português, nem liquidar o IVA.
Representante fiscal
No que se refere ao registo para efeitos de IVA de entidades não residentes, importa distinguir se estamos perante entidades com sede ou estabelecimento estável num Estado-membro ou num país terceiro.
Quando estamos perante uma entidade de um país terceiro, que aqui pratique operações tributáveis, esta é obrigada a nomear representante fiscal. Já se esta entidade tem sede ou estabelecimento estável num Estado-membro, então a nomeação de representante é facultativa, poderá simplesmente proceder ao registo.
Um representante fiscal é um sujeito passivo do imposto no território nacional, isto é, com a sede, estabelecimento estável ou o domicílio em Portugal, munido de procuração com poderes bastantes, que cumpre todas as obrigações decorrentes do referido Código, incluindo a do registo, em representação do sujeito passivo não residente. O representante fiscal é o devedor do imposto que se mostre devido pelas operações realizadas pelo representado, sendo que o sujeito passivo não estabelecido é solidariamente responsável com o representante pelo pagamento do imposto.
Em suma, os sujeitos passivos não residentes e que não disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio noutro Estado-membro, quando pratiquem no território nacional operações tributáveis, estão obrigados à nomeação de representante fiscal, sujeito passivo do imposto no território nacional, munido de procuração com poderes bastantes.Exceto se as operações consistirem em transmissões de bens ou prestações de serviços localizadas em território nacional e a obrigação de liquidação do imposto recai sobre o sujeito passivo adquirente dos bens ou serviços por força das regras de inversão do sujeito passivo; ou transmissões de bens que sejam exclusivamente tributáveis no âmbito do regime de balcão único (OSS); ou transmissões de bens mencionadas no anexo C do Código do IVA, isentas ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 15.º do mesmo código.
A nomeação do representante fiscal cabe ao sujeito passivo não residente, e as faturas emitidas devem conter a identificação, morada e NIF do representante.
Quando um sujeito passivo não residente dispõe de representante fiscal, seja por obrigação quando tem residência num país terceiro, seja por opção quando tem residência num Estado-membro, está obrigado a comunicar tal facto ao adquirente (sujeito passivo português) antes da realização das operações. Esta comunicação é importantíssima, pois caso o sujeito passivo não residente não cumpra a obrigação de comunicação do representante fiscal ao seu adquirente, opera a inversão do sujeito passivo, tornando-se o adquirente o efetivo devedor do imposto, sem prejuízo das penalidades em que possa incorrer o representante fiscal, nomeadamente pela falta de liquidação e entrega do imposto ao Estado.
Exemplos
Vejamos o seguinte exemplo: a sociedade “XPTO”, residente em França, efetuou uma importação em Portugal, tendo procedido ao seu registo em território nacional. De seguida, vendeu tais bens à sociedade portuguesa “ABC”. Nesta fatura, emitida através do número de identificação fiscal português, a sociedade francesa liquidou IVA. Este procedimento tem vindo a ser praticado e pacificamente aceite. Contudo, verificamos que as orientações mudaram.
A sociedade francesa, estando a praticar uma operação abrangida pela regra da inversão do sujeito passivo, não deveria proceder à liquidação do IVA nem a fatura deveria ser emitida com o número de identificação fiscal português. Neste sentido, a sociedade portuguesa deve proceder à liquidação do IVA, por aplicação da regra da inversão. O imposto assim autoliquidado é suscetível do direito à dedução nos termos gerais. Atente-se que o IVA que consta na fatura, indevidamente liquidado pela sociedade francesa, não deve ser deduzido.
Um segundo exemplo que podemos considerar: a sociedade americana “XYZ” prestou serviços à sociedade portuguesa “ABC”. A sociedade americana já possuía representante fiscal emPortugal, mas não comunicou esse facto à sua cliente. A fatura foi emitida com liquidação do IVA. Neste caso, a sociedade portuguesa, estando perante a aquisição de serviços localizados em Portugal, e não tendo sido previamente informada da existência de representante fiscal, deve proceder à autoliquidação do IVA. Também nesta situação, o imposto autoliquidado é suscetível do direito à dedução nos termos gerais, sendo que o IVA que consta na fatura, indevidamente liquidado pela sociedade americana (pelo seu representante), não deve ser deduzido, uma vez que não foi previamente comunicada a existência desse representante.
Esperamos que este artigo alerte para os diferentes procedimentos que resultam da recente doutrina e informações divulgadas e que a discussão acerca do tema venha contribuir para melhores práticas.
Informação elaborada pela Ordem dos Contabilistas Certificados
As recentes FAQ disponibilizadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), no seguimento da publicação do Ofício-circulado n.º 30235/2021, de 27 de abril, demonstram a importância da matéria.
Regra da inversão
Os sujeitos passivos não residentes são aqueles que não possuem sede, estabelecimento estável nem domicílio no território nacional. No entanto, quando determinada entidade, ainda que não residente, pratique operações abrangidas pela incidência do IVA em território nacional, por exemplo a venda de um bem ou a prestação de um serviço, torna-se sujeito passivo do imposto e deve proceder ao registo para efeitos de IVA, isto é, obter o respetivo número de identificação fiscal. A exceção a esta regra ocorre quando tal entidade não é devedora do imposto por aplicação da regra da inversão, ou seja, quando a obrigação de liquidação do imposto é transferida para a entidade adquirente, que será um sujeito passivo de IVA em território nacional.
Assim, um sujeito passivo não residente, que exerça uma atividade económica em território nacional, ou seja, que aqui realize operações tributáveis, deve registar-se para efeitos de IVA quando, nos termos da lei, for o devedor do imposto. Por exemplo, quando efetua importações, exportações ou vendas a particulares no território nacional (fora do âmbito de regimes especiais de Balcão Único – OSS).
Por sua vez, um sujeito passivo não residente que apenas efetue operações pelas quais o devedor do imposto é o adquirente, por estar abrangido pelas regras da inversão do sujeito passivo [previstas nas alíneas e), g) e h) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA], não deve possuir um registo para efeitos de IVA em território nacional, nem utilizar NIF português para a realização dessas operações.
Até aqui, uma entidade não residente que já possuísse registo para efeitos de IVA em território nacional utilizava este NIF para todas as operações aqui localizadas, inclusive naquelas que seriam suscetíveis de aplicação da regra da inversão. Com as recentes informações, clarifica-se que, estando em causa uma operação abrangida pela regra da inversão praticada por um sujeito passivo não residente e aqui localizada, será a entidade adquirente quem deve proceder à liquidação do imposto, não devendo este não residente utilizar o NIF português, nem liquidar o IVA.
Representante fiscal
No que se refere ao registo para efeitos de IVA de entidades não residentes, importa distinguir se estamos perante entidades com sede ou estabelecimento estável num Estado-membro ou num país terceiro.
Quando estamos perante uma entidade de um país terceiro, que aqui pratique operações tributáveis, esta é obrigada a nomear representante fiscal. Já se esta entidade tem sede ou estabelecimento estável num Estado-membro, então a nomeação de representante é facultativa, poderá simplesmente proceder ao registo.
Um representante fiscal é um sujeito passivo do imposto no território nacional, isto é, com a sede, estabelecimento estável ou o domicílio em Portugal, munido de procuração com poderes bastantes, que cumpre todas as obrigações decorrentes do referido Código, incluindo a do registo, em representação do sujeito passivo não residente. O representante fiscal é o devedor do imposto que se mostre devido pelas operações realizadas pelo representado, sendo que o sujeito passivo não estabelecido é solidariamente responsável com o representante pelo pagamento do imposto.
Em suma, os sujeitos passivos não residentes e que não disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio noutro Estado-membro, quando pratiquem no território nacional operações tributáveis, estão obrigados à nomeação de representante fiscal, sujeito passivo do imposto no território nacional, munido de procuração com poderes bastantes.Exceto se as operações consistirem em transmissões de bens ou prestações de serviços localizadas em território nacional e a obrigação de liquidação do imposto recai sobre o sujeito passivo adquirente dos bens ou serviços por força das regras de inversão do sujeito passivo; ou transmissões de bens que sejam exclusivamente tributáveis no âmbito do regime de balcão único (OSS); ou transmissões de bens mencionadas no anexo C do Código do IVA, isentas ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 15.º do mesmo código.
A nomeação do representante fiscal cabe ao sujeito passivo não residente, e as faturas emitidas devem conter a identificação, morada e NIF do representante.
Quando um sujeito passivo não residente dispõe de representante fiscal, seja por obrigação quando tem residência num país terceiro, seja por opção quando tem residência num Estado-membro, está obrigado a comunicar tal facto ao adquirente (sujeito passivo português) antes da realização das operações. Esta comunicação é importantíssima, pois caso o sujeito passivo não residente não cumpra a obrigação de comunicação do representante fiscal ao seu adquirente, opera a inversão do sujeito passivo, tornando-se o adquirente o efetivo devedor do imposto, sem prejuízo das penalidades em que possa incorrer o representante fiscal, nomeadamente pela falta de liquidação e entrega do imposto ao Estado.
Exemplos
Vejamos o seguinte exemplo: a sociedade “XPTO”, residente em França, efetuou uma importação em Portugal, tendo procedido ao seu registo em território nacional. De seguida, vendeu tais bens à sociedade portuguesa “ABC”. Nesta fatura, emitida através do número de identificação fiscal português, a sociedade francesa liquidou IVA. Este procedimento tem vindo a ser praticado e pacificamente aceite. Contudo, verificamos que as orientações mudaram.
A sociedade francesa, estando a praticar uma operação abrangida pela regra da inversão do sujeito passivo, não deveria proceder à liquidação do IVA nem a fatura deveria ser emitida com o número de identificação fiscal português. Neste sentido, a sociedade portuguesa deve proceder à liquidação do IVA, por aplicação da regra da inversão. O imposto assim autoliquidado é suscetível do direito à dedução nos termos gerais. Atente-se que o IVA que consta na fatura, indevidamente liquidado pela sociedade francesa, não deve ser deduzido.
Um segundo exemplo que podemos considerar: a sociedade americana “XYZ” prestou serviços à sociedade portuguesa “ABC”. A sociedade americana já possuía representante fiscal emPortugal, mas não comunicou esse facto à sua cliente. A fatura foi emitida com liquidação do IVA. Neste caso, a sociedade portuguesa, estando perante a aquisição de serviços localizados em Portugal, e não tendo sido previamente informada da existência de representante fiscal, deve proceder à autoliquidação do IVA. Também nesta situação, o imposto autoliquidado é suscetível do direito à dedução nos termos gerais, sendo que o IVA que consta na fatura, indevidamente liquidado pela sociedade americana (pelo seu representante), não deve ser deduzido, uma vez que não foi previamente comunicada a existência desse representante.
Esperamos que este artigo alerte para os diferentes procedimentos que resultam da recente doutrina e informações divulgadas e que a discussão acerca do tema venha contribuir para melhores práticas.
Informação elaborada pela Ordem dos Contabilistas Certificados