O valor e a importância das demonstrações financeiras para as empresas;

O valor e a importância das demonstrações financeiras para as empresas
O problema centrado nas pequenas e micro empresas
Uma boa leitura e interpretação das demonstrações financeiras é fundamental, porque permite controlar eficazmente as contas e estar ao corrente da situação financeira da empresa.
A American Accounting Association (AAA) que, em 1966, no seu documento “Os Conceitos Básicos e os Princípios Contabilísticos como base para as Demonstrações Financeiras das Entidades” (A Statement of Basic Accounting Theory- ASOBAT- Evanston, Ill.] American Accounting Association, 1966- Hendriksen & Breda- 1999 pag. 79) escreveu: “a principal função da contabilidade é acumular e comunicar informação económica que permita juízos e decisões informadas aos seus utilizadores”.

De acordo com Silva e Souza (2011, p. 68 - Análise das demonstrações financeiras como instrumento para tomada de decisões. INGEPRO – Inovação, Gestão e Produção, Janeiro de 2011, vol. 03, no. 01 ISSN 1984-6193.) “as demonstrações financeiras são utilizadas pela gestão da entidade para prestar contas e levar informações sobre o aspeto económico-financeiro aos acionistas, credores, governo e outros interessados … e apresentam informações úteis que revelam suas operações durante um determinado período de tempo, e quando analisadas facilitam a deteção dos pontos fortes e fracos encontrados na realização da sua atividade quer operacional ou não operacional”.
É neste âmbito que a realização de estudo e análise dos resultados apurados em relação às atividades empresariais, no presente e no passado, têm como objetivo definirem-se as melhores estratégias empresariais para o futuro.
Contudo, apesar de se salientar a importância das Demonstrações Financeiras no auxílio à gestão das empresas, verifica – se, ainda, a reduzida utilização destes instrumentos. A falta de conhecimentos de contabilidade e de gestão entre pequenos/microempresários são a principal causa, e tem colocado em causa a continuidade das mesmas, tornando o tecido empresarial português frágil e vulnerável.
A maioria deste tipo de empresários concentra as suas atenções apenas em indicadores financeiros, nomeadamente, no volume de negócios, no resultado líquido e no saldo da conta bancária. Estes indicadores, revelam-se insuficientes às atividades da maioria das empresas uma vez que fornecem informações pouco úteis para a tomada de decisões, em realidades empresariais cada vez mais competitivas. Por outro lado, devido à sua dimensão mais reduzida, estas empresas encontram-se mais expostas às dinâmicas, mudanças e competitividade dos mercados, sendo a sua gestão condicionada por determinadas variáveis que, nem sempre dependem da vontade própria do seu gestor. Algumas das causas de instabilidade são: - o incomportável nível de carga fiscal e a sua permanente mudança, que gera um clima de instabilidade e insegurança;
- o preocupante nível de incumprimento das obrigações de pagamentos por parte dos clientes, com os quais tem reduzido poder negocial, gerando problemas graves de tesouraria;
- a concorrência ao nível das pequenas e micro empresas que é cada vez mais agressiva obrigando a uma maior redução das margens, por uma questão de sobrevivência.
- e ainda o facto de por vezes também necessitarem de competir com as médias e grandes empresas em situação de desigualdade tendo em conta as diferenças estruturais de ambas.
“A categoria das micro, pequenas e médias empresas (PME) é constituída por empresas que empregam menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.” In “Recomendação da Comissão relativa à definição de micro, pequenas e médias empresas, de 6 de Maio de 2003”. (INE- 2010junho28)
Segundo dados apurados pelo INE 63% das empresas são consideradas sem perfil exportador, ou seja, predominam as empresas de reduzida dimensão, que são micro ou pequenas empresas. Foram consideradas como empresas com perfil exportador, aquelas que exportam bens e serviços e que cumprem os seguintes critérios: (i) empresas em que pelo menos 50% do volume de negócios é proveniente das exportações de bens e serviços, ou; (ii) empresas em que pelo menos 10% do volume de negócios é proveniente das exportações de bens e serviços e valor de exportações de bens e serviços superior a 150 mil euros.
As empresas que não cumpriam estes critérios foram classificadas como não tendo perfil exportador. (INE- semana de 20 a 24 de Abril de 2020)
DIMENSÃO DAS PME

Assim, para aferir da dimensão de uma empresa, deve-se ter atenção aos referidos limiares, que se apresentam de seguida (Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro):
 MICRO EMPRESA:
• Menos de 10 trabalhadores efetivos;
• Volume de negócios anual ou Balanço total anual <= a 2 milhões de euros;
 PEQUENA EMPRESA:
• Menos de 50 trabalhadores efetivos;
• Volume de negócios anual ou Balanço total anual <= 10 milhões de euros;
Muitas de microempresas portuguesas são constituídas por unidades familiares que vivem de pequenos negócios, como o de um cabeleireiro, um café, uma oficina de reparação automóvel ou uma barbearia. Em regra, estas empresas possuem a gestão administrativa e financeira que é feita exclusivamente por familiares. São empresas com maior controlo dos fundadores e proprietários, ou seja, o envolvimento da família é direto. São organizações onde coexistem, pelo menos, duas instituições sociais diferentes – a Família e o Negócio. A presença (ou o envolvimento) da família na propriedade e gestão da empresa pode ser uma vantagem ou desvantagem para a competitividade da empresa, consoante seja o maior ou menor conhecimento profissional, criando assim condições paradoxais e únicas para o funcionamento deste tipo de instituição.
Na realidade a estrutura de propriedade de uma empresa tem um papel importante na determinação do seu desempenho. Tanto o comportamento no mercado, como o desempenho da empresa, são afetados pelos critérios de gestão e pelos objectivos que as empresas pretendem atingir. Numa empresa detida por um único proprietário, todos os benefícios e custos são da sua responsabilidade.
Os empresários estão continuamente a tomar decisões ao nível destas pequenas e micro empresas. Entre essas decisões, algumas podem assumir um aspeto importantíssimo para a empresa e, portanto, requerem um cuidado maior, uma análise mais profunda sobre os elementos envolvidos, uma vez que uma decisão mal tomada pode prejudicar toda a situação financeira da empresa, além de comprometer a sua própria permanência no mercado. Ou seja, por exemplo, o empresário determina a saída de recursos da empresa, esperando o seu retorno no futuro. Entre as informações importantes estão problemas relacionados com: a globalização dos mercados, a relação custo/benefício de um de terminado investimento, a relação entre saídas e entradas de capital na empresa, os encargos com o pessoal, a fiscalidade, os clientes e os fornecedores.
Para este tipo de trabalho, os contabilistas certificados realizam uma interpretação dos resultados apurados na contabilidade financeira da empresa e, a partir dessa análise e interpretação das informações contabilísticas fornecem ao gestor um conjunto de sugestões que podem ser utilizadas no processo decisório da empresa. O próprio gestor ao consultar os relatórios preparados pelo contabilista certificado, poderá ter um pouco mais de segurança e verificar qual é o caminho mais assertivo a ser seguido.
As referidas informações contabilísticas podem ser distribuídas em diversos grupos de atividades como: orçamento, fluxos de caixa, análise de investimentos, análise das Demonstrações Financeiras (DF), planeamento tributário, gestão de inventários, controlo de contas a pagar, controlo de contas a receber, controlo de bens do ativo tangível, entre outras.
O que representa cada das referidas análises contabilísticas:
Orçamento - traduz a expressão quantitativa dos planos da empresa, elaborados para o futuro.
Sabemos que as dificuldades na gestão podem surgir de diversas direções, desde a falta de recursos financeiros até a ausência de informações adequadas. Neste sentido, a utilização de instrumentos como os orçamentos, permite aos gestores voltarem o seu olhar para o futuro, de modo mais garantido e antecipar as informações dos resultados a serem alcançados pela empresa.
A preparação de um, ou vários, orçamentos para toda a empresa tende a melhorar a utilização dos recursos por ela disponíveis e a ajustá-los às atividades consideradas prioritárias.
Fluxos de caixa- evidenciam a capacidade de pagamentos em determinado período, as programações para novas compras, e a realização de investimentos.
As empresas somente terão condições de pagar a todos os seus credores, realizar novos negócios, expandir os seus produtos e dominar novos mercados se a sua gestão tiver conhecimento dos fluxos de caixa e do capital disponível para o investimento em cada setor.
Há que se considerar que a observação e o estudo das transações positivas e negativas sobre o caixa mostram sobre o impacto que determinadas decisões têm sobre o percurso financeiro da empresa.
Análise de investimento- permite uma seleção, mais rigorosa, de alternativas de investimento (contratar mão - de- obra qualificada, adquirir nova tecnologia, etc.).
Análise das demonstrações contabilísticas - analisar a tendência das variáveis financeiras e operacionais envolvidas na entidade; avaliar a sua situação económica e financeira para determinar o nível de cumprimento de metas pré-determinadas; verificar a consistência das informações financeiras com a realidade da entidade; identificar os problemas existentes, implementar medidas corretivas adequadas e servir de guia para um planeamento de gestão financeira eficiente e eficaz
Planeamento tributário- permite minimizar os gastos com impostos e cumprir com os encargos fiscais na data prevista.
Gestão de inventários - permite uma previsão sobre o que é necessário comprar e quando poderão ser realizadas as compras.
Controlo de contas a pagar – efetua-se através do monitoramento das dívidas a serem pagas.
Controlo de contas a receber- efetua-se através do monitoramento de valores a receber e de clientes em mora.
Controlo dos bens do ativo tangível- para responder aos requisitos da identificação dos bens, a data e o custo de aquisição, acréscimos e baixas a eles referentes, bem como depreciações.
O que se pode entender com estas preocupações empresariais é o facto de que todos os setores de uma empresa necessitarem de informações contabilísticas fidedignas para assegurar seu pleno funcionamento e desenvolvimento de novas ações.
Com base na análise das informações das DF, o gestor tem condições de evidenciar as eventuais modificações sofridas no exercício económico das contas. Algumas informações são aquelas que contêm as movimentações ocorridas num determinado período em diversas contas que compõem o património da empresa. Essas contas importantes são o capital, as reservas, os ajustamentos na avaliação patrimonial, imparidades, depreciações, as dívidas dos clientes, as dívidas aos fornecedores, as dívidas fiscais, além de ações da tesouraria e os prejuízos acumulados, se existirem.
Ao abordar estas questões no contexto das pequenas e microempresas, salienta-se que ainda se nota uma visão tradicionalista por parte dos empresários sobre as atividades desenvolvidas pelos contabilistas certificados. Mantém-se uma visão sobre o contabilista certificado como um profissional que deve estar preocupado, apenas, com a prestação de serviços para fins tributários ou seja, com uma função fiscal. Por outro lado, outro problema que atinge comumente os micro e pequenos empresários é a dificuldade de suportar com os custos da contabilidade. Enquanto as grandes empresas possuem um departamento de contabilidade próprio, as pequenas e microempresas contratam gabinetes de contabilidade para realizarem os serviços relativos ao fisco. Assim sendo os seus procedimentos contabilísticos são direcionados, maioritariamente, para as exigências fiscais, o que é contraditório com os reais objetivos e utilidades da contabilidade financeira e para a adequada gestão das empresas.
Há evidente relação entre a dimensão das empresas e o recurso a serviços internos ou externos de contabilidade, indiciando que as empresas de menor dimensão utilizam mais frequentemente os recursos externos evitando, desta forma, encargos adicionais com a Segurança Social, e ainda de outros encargos: férias remuneradas, e o pagamento do subsídio de “Natal”, ou seja o décimo terceiro mês. Ou seja, em termos de vantagens está o facto de haver redução de custos através do emagrecimento da estrutura de recursos humanos da empresa.
 Estas empresas não necessitarão de investir em softwares de contabilidade, pois o serviço será realizado por terceiros. Há, contudo, desvantagens a saber:
- Ao contratar os serviços de contabilistas externos (gabinetes de contabilidade, etc.) é preciso ter a noção que a empresa não será o único cliente. Sendo assim, o contabilista externo não terá as horas  horas do dia disponíveis para a empresa.
- Outro grande problema é que, a maioria dos escritórios de contabilidade trabalham de forma impessoal e atendem uma grande procura vinda de seus muitos outros clientes, ou seja, nem sempre existe a atenção ideal para uma série de detalhes fiscais e contabilísticos ligados à empresa. Neste caso, o empresário deve  manter um contacto constante com o gabinete de Contabilidade para não perder o controlo da situação financeira e fiscal.
É importante que o Gabinete de Contabilidade disponha de um manual de controlo da qualidade para garantir a regularidade da qualidade dos serviços.
Mas, a maior preocupação para o processo de gestão de micro e pequenas empresas, está demonstrado com o facto de que estas ainda se encontram distantes da utilidade das DF.  
A importância da informação contabilística para o sucesso das pequenas e micro empresas é demonstrada também por Resnik (1990: 136 - Editora McGraw-Hill e Makron Books: São Paulo, 1990), que salienta que «[u]ma das principais causas dos desastres com pequenas empresas é não manter os registros e controles contábeis apropriados, precisos e atualizados – e não usá-los para administrar a empresa».
Há também o facto dos níveis de insuficiente qualificação académica de alguns dos seus empresários-gestores, que, além de prejudicarem o progresso das empresas, implica que haja uma reduzida utilização da contabilidade enquanto ferramenta de gestão.
É grande o número de empreendedores que, após criarem as suas empresas, passam a desempenhar uma função de gestores, seja no geral ou específico. No entanto, em muitos casos, o empreendedor possui conhecimento técnico da área em que pretende atuar, mas não tem experiência de exercer um lugar de gestão. Mas, na prática os referidos gestores, dessa forma, passam a dedicar o seu tempo à solução de problemas rotineiros e acabam perdendo a visão do principal o negócio
Na verdade, as pequenas e micro empresas nascem, vivem e desenvolvem-se a partir do talento, da sensibilidade e da vontade de realizar de centenas de milhares de empreendedores. Estes são, ao mesmo tempo, seus inspiradores e principal força propulsora.
Uma das suas principais dificuldades, que são enfrentadas pelos empreendedores, na tarefa de administrar as suas empresas, refere-se à compreensão dos aspetos financeiros e contabilísticos do negócio.
A Contabilidade não pode ser encarada por estes empresários “como um mal necessário” ignorando as informações e os valores das DF.
Sabemos que as Pequenas e Médias Empresas (PME) e as microempresas constituem um segmento de extrema importância quer a nível europeu quer a nível nacional, porque representam a quase totalidade do tecido empresarial português e a maior fonte potencial de emprego e crescimento e, ainda, se revelam bastantes importantes, apresentando-se como agentes económicos fundamentais na criação de negócios inovadores. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), atualizados em 2020 FEV 13, em 2018 havia em Portugal 1.276.965 pequenas e médias empresas. Neste total a maioria eram micro empresas 96% (1.227.831). As pequenas empresas totalizavam 42.290 e as médias empresas 6.844.
Contudo, a economia portuguesa, ao longo dos anos, vem sofrendo vários abalos devido à sua fragilidade, e à sua falta de competitividade. O tecido empresarial português vive em situação de “extrema fragilidade, particularmente visível nas pequenas e médias empresas ”, está descapitalizado e é dos mais endividados e com menos autonomia financeira da Europa. Os dados revelam que a maioria das micro e pequenas empresas nacionais apenas recorre a financiamento de curto-prazo, sobretudo por dificuldades de tesouraria.
É fundamental que os contabilistas certificados das pequenas e micro empresas devam incluir nos seus serviços a consultoria contabilística e financeira, com o intuito de colmatar as carências de gestão que se deparam aos gestores. Assim sendo, compete, eventualmente, aos contabilistas certificados incentivar os gerentes a valorizar o papel da contabilidade na tomada de decisão das empresas. É necessário que a informação financeira seja desejável e útil para as pessoas responsáveis pela gestão das empresas.
 
JOÃO ALEXANDRE COELHO
Professor Universitário Doutorado em Administração Pública. Outras habilitações académicas: Mestrado em Gestão (especialização em Auditorias da Qualidade); Licenciado em Economia; Licenciado em Auditoria Contabilística; Bacharel em Contabilidade. Ex- Técnico Oficial de Contas. Professor Universitário desde Outubro de 2000.




JOÃO ALEXANDRE COELHO Economista, 08/02/2021
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