PARTILHA EM VIDA - Impugnação pauliana

ASSUNTO: Responsabilidade da lquidação do IVA devido
Referências: Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.10.2012
Fonte: site do TRP - www.dgsi.pt
Sumário: I- A remissão genérica para documentos, apesar de incorreta, não integra nulidade da sentença por falta de fundamentação, a qual só ocorre quando é absoluta, e por não ser subsumível à previsão do art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC. II- A partilha em vida constitui uma verdadeira doação e assume, por isso, natureza gratuita, pelo que a procedência da impugnação não exige o requisito da má fé. III- O crédito do Estado pelo IVA constitui-se no momento em que decorre o prazo legal para o seu pagamento, sem que seja efetuado, e não com o ato tributário de liquidação adicional que for posteriormente notificado ao sujeito passivo, pelo que, sendo aquele momento anterior ao ato impugnado, a procedência da impugnação pauliana não depende da alegação e prova do dolo. IV- O cônjuge do devedor comerciante também é responsável pela dívida decorrente da falta de pagamento daquele imposto, ainda que não tenha participado nas transações que o originaram, desde que não estejam casados no regime da separação de bens, por se tratar de dívida comercial e se presumir o proveito comum do casal, e, mesmo que não fosse responsável, tal facto jamais obstaria à procedência integral da ação de impugnação em face dos efeitos do ato impugnado. V- O prazo normal da prescrição das dívidas tributárias é de oito anos e começa a correr, quanto ao IVA, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, devendo ser considerados os factos interruptivos, suscetíveis de influir no decurso desse prazo, previstos na lei vigente à data em que ocorreram (cfr. art.ºs 48.º, n.º 1 e 49.º da LGT e art.º 12.º, n.º 2, do Código Civil). Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. O Ministério Público, em representação da Fazenda Pública - Estado Português, intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra os réus B.... e mulher, C...., D..... e E...... Pediu (após alteração que foi deferida) que: a) seja declarado que o crédito do autor relativo ao IVA dos anos de 1999 e 2000 e juros compensatórios, estes contados até 25/08/03, ascendia a ¤ 825.918,07 e 205.237,91, respetivamente, e é anterior à escritura de partilha em vida impugnada, celebrada no Cartório Notarial de Amarante, em 21/07/03; b) seja declarado que os réus outorgaram a escritura com conhecimento das dívidas de imposto e da proximidade da sua cobrança; c) seja declarado que a partilha em vida é um negócio gratuito: uma doação; d) seja declarado que os réus B..... e mulher não possuem, por via do negócio jurídico impugnado, património fundiário ou outro suscetível de garantir o cumprimento da obrigação em dívida; e) seja declarado que o autor se encontra impossibilitado de satisfazer integralmente o seu crédito, a não ser no património objeto da partilha em vida/doação; f) seja declarada procedente a presente ação de impugnação da partilha em vida e, por via disso, seja o autor autorizado a executar no património dos donatários, os réus D..... e E....., os bens imóveis necessários e suficientes à satisfação do seu crédito; g) de forma a ver-se pago do seu crédito por via da venda executiva subsequente à penhora dos bens transmitidos em exclusividade e sem concorrência de outros; h) seja declarado que pode usar dos meios cautelares necessários a garantir a disponibilidade executiva sobre o património que adveio aos réus donatários da partilha em vida. Como fundamento, alegou que o réu B..... é devedor de IVA ao Estado, num total de ¤ 825.918,07, acrescido de juros compensatórios; por escritura de doação e partilha os réus B..... e mulher declararam doar aos restantes réus, seus filhos, os imóveis melhor descritos na petição inicial; todos os réus atuaram com o propósito de prejudicarem a Fazenda Nacional, tornando impossível a cobrança, sendo certo que conheciam aquele crédito; quiseram obstar à penhora dos prédios; e os primeiros réus não possuem quaisquer outros bens. Os réus apresentaram a contestação, invocando: a nulidade da citação; a ilegitimidade passiva dos réus por preterição de litisconsórcio passivo, dado que não foi demandado o marido da ré E....., casados em comunhão de adquiridos; a ineptidão da petição inicial. No mais, os réus impugnaram os factos alegados pelo autor, concluindo pela improcedência da ação e pela sua absolvição dos pedidos. O autor apresentou réplica, deduzindo incidente de chamamento à demanda - intervenção principal passiva - do marido da ré E.... e reduzindo e alterando o pedido. Foi admitida a intervenção do chamado, tal como requerido pelo autor, não tendo o chamado deduzido contestação. Foi proferido despacho saneador, tendo sido admitida a alteração do pedido e julgadas improcedentes as exceções dilatórias invocadas pelos réus. O processo prosseguiu a tramitação normal, tendo, a final, sido proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, decidindo-se: a) declarar que o crédito do autor Fazenda Pública - Estado Português relativo ao IVA dos anos de 1999 e 2000 e juros compensatórios, estes contados até 25/08/03, ascendia a ¤ 825.918,07 e 205.237,91, respetivamente, e é anterior à escritura de partilha em vida impugnada, celebrada no Cartório Notarial de Amarante, em 21/07/03; b) declarar que o réu B..... outorgou a escritura com conhecimento das dívidas de imposto e da proximidade da sua cobrança; c) declarar que a partilha em vida é um negócio gratuito: uma doação; d) declarar que os réus B..... e mulher C...... não possuem, por via do negócio jurídico impugnado, património fundiário ou outro suscetível de garantir o cumprimento da obrigação em dívida; e) declarar que o autor se encontra impossibilitado de satisfazer integralmente o seu crédito, a não ser no património objeto da partilha em vida/doação; f) julgar procedente a impugnação da partilha em vida e, por via disso, autoriza-se o autor a executar no património dos donatários, os réus D..... e E....., os bens imóveis a eles doados nessa escritura necessários e suficientes à satisfação do seu crédito, de forma a ver-se pago do seu crédito por via da venda executiva subsequente à penhora dos bens transmitidos; g) declarar que o autor pode usar dos meios cautelares necessários a garantir a disponibilidade executiva sobre o património que adveio aos réus donatários da partilha em vida; h) absolver os réus do demais peticionado. Discordando desta decisão, dela interpuseram recurso os réus, de apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: A) A douta sentença sob recurso é nula por falta de especificação dos concretos fundamentos da decisão em matéria de facto (al. b) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC). B) A douta sentença é igualmente nula nos termos do invocado preceito legal ao levar ao probatório como se de facto se tratasse "Dá-se aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais o teor das certidões de fls. 329 a 398 dos autos", sem a especificação dos concretos factos que pretende dar como provados com tais documentos e respetivos motivos. C) A douta sentença incorre em erro de julgamento em matéria de facto no que respeita aos seguintes concretos pontos: i) "o réu B..... exercia a atividade de comércio de automóveis" (ponto 1.º da base instrutória e ponto 2.º, primeira parte, do probatório); ii) o réu B..... "foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003 e fim em 19 de maio de 2003", no que respeita à data do fim (2.º da base instrutória e 2.º, segunda parte, do probatório); iii) "Por carta registada em 22 de maio de 2003, o réu B..... foi informado da conclusão da ação inspetiva que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000", no que respeita à data (3.º da base instrutória e 3.º do probatório); iv) "Em 25 de agosto de 2003, foi efetuada a liquidação do IVA, estando em falta por parte do réu B..... ¤ 825.918,07, acrescido de juros compensatórios no total de ¤ 205.237,91" (4.º da base instrutória e do probatório). D) Da prova produzida (não especificada na douta sentença para cada um dos factos dados como provados), deveria a douta sentença e deve o Tribunal de recurso, após a reapreciação da prova gravada, extrair como consequências: i) não dar como provado que "o réu B..... exercia a atividade de comércio de automóveis"; ii) dar como provado que o réu B..... "foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003 e fim em 29 de julho de 2003"; iii) dar como provado que "Por carta datada de 22 de julho de 2003, registada em 23 de julho de 2003 e recebida em 29 de julho de 2003, o réu B..... foi informado da conclusão da ação inspetiva que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000"; iv) não dar como provado que "Em 25 de agosto de 2003, foi efetuada a liquidação do IVA, estando em falta por parte do réu B..... ¤ 825.918,07, acrescido de juros compensatórios no total de ¤ 205.237,91". E) A partilha em vida impugnada, em face da existência de diferentes atribuições patrimoniais entre os intervenientes (nomeadamente a favor dos RR. B..... e C....), constitui negócio oneroso e não negócio gratuito nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 612.º do Código Civil. F) A douta sentença, ao decidir de modo diferente, interpretou e aplicou erradamente o invocado preceito legal. G) Mesmo que se considere existir crédito do Estado sobre o R. B....., esse crédito, para os efeitos previstos no art.º 610.º do Código Civil, só pode considerar-se constituído com a notificação da liquidação, pelo que é posterior ao ato impugnado. H) Sendo o crédito a que se refere a douta sentença posterior à partilha impugnada, a procedência da impugnação pauliana estava dependente da alegação e da prova do dolo, o que não foi feito. I) A douta sentença sob recurso incorre em erro de julgamento ao decidir que a R. C....., apesar de não demonstrado que tivesse participado nas transações que deram lugar à existência de IVA a pagar ao Estado, responde por essa dívida nos termos do art.º 1691.º, n.º 1, al. d), do C. Civil e do art.º 15.º do Código Comercial, porquanto: - não foi feita prova de que "O réu B..... exercia a atividade de comércio de automóveis"; - não foi feita prova nem o Tribunal deu como provado que o mesmo "exercia profissionalmente o comércio". - as dívidas de IVA por operações tributáveis praticadas por um dos cônjuges não são "dívidas contraídas no exercício do comércio" nos termos e para os efeitos daqueles preceitos do Código Civil e do Código Comercial. J) Mesmo que subsistissem razões para que a ação procedesse, tal só poderia suceder no que respeita à meação do R. B..... nos bens partilhados e não na meação da R. C..... K) O Tribunal da ação é competente para conhecer incidentalmente da questão da prescrição da dívida de IVA para aferir dos requisitos da impugnação pauliana, sendo esse conhecimento oficioso. L) A dívida de IVA imputada ao R. B..... encontra-se prescrita, pelo que inexiste crédito exigível a fundamentar a pretensão formulada na impugnação pauliana. M) A douta sentença, ao julgar procedente a ação, violou o preceituado, nomeadamente, nos art.ºs 610.º e 612.º do Código Civil. Nestes termos e nos demais de direito, com o expresso pedido de reapreciação da prova gravada, deve ser concedido provimento ao presente recurso, declarando-se nula a douta sentença com as legais consequências, ou, quando assim se não entenda, revogando-se a mesma douta sentença e julgando-se a final improcedente a ação. O autor contra-alegou, concluindo pela improcedência da apelação. Após os vistos legais, cumpre decidir. II. Questões a resolver: - Nulidade da sentença: - falta de especificação dos fundamentos da decisão de facto; - genérica remissão para documentos; - Impugnação da decisão sobre a matéria de facto; - No que respeita ao mérito da ação, estão em causa requisitos da impugnação pauliana, discutindo-se: - se o ato é oneroso ou gratuito; - a anterioridade do crédito; - a responsabilidade da 1ª ré; - a prescrição da dívida tributária. III. Importa começar pela apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto e das demais questões que a essa decisão possam dizer respeito. 1. Os Recorrentes impugnam a decisão sobre a matéria de facto, no que respeita às respostas aos quesitos 1º a 4º. Estes quesitos, que tiveram resposta inteiramente positiva, eram deste teor: 1º O réu B..... exercia a atividade de comércio de automóveis? 2º E foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003 e fim em 19 de maio de 2003? 3º Por carta registada em 22 de maio de 2003, o réu B..... foi informado da conclusão da ação inspetiva que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000? 4º Em 25 de agosto de 2003, foi efetuada a liquidação do IVA, estando em falta por parte do réu B..... ¤ 825.918,07? Os Recorrentes sustentam que: - Os factos dos quesitos 1º e 4º deveriam ter sido considerados não provados; - Quanto ao quesito 2º: deveria dar-se como provado apenas que o réu B..... "foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003 e fim em 29 de julho de 2003"; - Quanto ao quesito 3º, deveria dar-se como provado que "Por carta datada de 22 de julho de 2003, registada em 23 de julho de 2003 e recebida em 29 de julho de 2003, o réu B..... foi informado da conclusão da ação inspetiva que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000". No que respeita ao facto do quesito 1º, estava em causa saber se o réu B..... exercia a atividade de comércio de veículos automóveis. Apesar do que se diz na alegação de recurso, a resposta positiva a tal facto parece indiscutível, não suscitando qualquer dúvida. Para assim concluir bastaria a convicção gerada pela prova documental e testemunhal produzidas; não é indiferente, também, a posição assumida pelo referido e demais réus na ação. Vejamos. Desde logo, importa referir o depoimento de F...., chefe de repartição de finanças, que afirmou que conhecia o réu apenas a título pessoal (não pelo exercício de funções); foi numa conversa tida com esse réu, sobre outros assuntos, que este lhe referiu que se "dedicava ao comércio de automóveis"; "à importação e comércio de automóveis". Acrescentou essa testemunha que teve conhecimento da dívida já na fase de execução; tem a ver com o IVA respeitante à importação de automóveis; "com base nas faturas constantes da contabilidade". A testemunha G.... é inspetor tributário e procedeu, no caso, a "todas as diligências de inspeção". Estas incidiram principalmente sobre elementos da contabilidade do réu B...... Afirmou que este "era comerciante de automóveis", acrescentando não ter "nenhuma dúvida de que todos os factos apurados se apoiaram em documentos". A testemunha H..... não participou diretamente na inspeção, limitando-se a sancionar o relatório final. Com base neste e nos respetivos elementos documentais, afirmou que o réu se dedica ao "comércio de veículos automóveis"; "comprava no mercado comunitário". A par dessa prova, importa ainda notar que os relatórios da inspeção são claros na identificação da atividade desenvolvida pelo réu - "comércio de veículos automóveis" - daí decorrendo (como foi igualmente afirmado em julgamento) que essa ação se inseriu numa atuação mais vasta, justificada pelas anomalias verificadas nas aquisições intracomunitárias. A inspeção incluiu uma análise integral das faturas de aquisição constantes da contabilidade, bem como das respetivas faturas de venda. Análise que permitiu naturalmente uma conclusão segura sobre a atividade do réu e a correspondente qualificação. O próprio facto de ter contabilidade organizada na referida área de atividade é esclarecedor. Perante esses elementos, seria de esperar que se o réu discordasse dessa qualificação da atividade o manifestasse, desde logo, perante a Autoridade Tributária (AT). Não o fez, porém. Com efeito, apesar das sucessivas tomadas de posição do réu - na sequência do relatório da inspeção, na reclamação graciosa, no recurso hierárquico, na impugnação judicial - nunca o réu pôs em questão que exercesse a referida atividade de comércio de veículos automóveis. Significativa é também a posição assumida na contestação. Por um lado, os réus C....., António e E..... apenas impugnaram o art. 1º da p.i. (onde também era alegada "a atividade de comércio de automóveis") "no que respeita às relações entre a AT e o R. B....." (art. 37º da contestação), concretizando depois o desconhecimento dessas relações (arts. 55º e segs). Por seu turno, o réu B..... confessou expressamente que exercia a atividade económica de comércio de veículos automóveis - arts. 38º, 57º e 58º. Assim, em rigor, apenas o alegado no art. 66º (os filhos não sabem da concreta atividade económica desenvolvida pelo pai, embora esta alegação se enquadre ainda na impugnação do conhecimento da relação do pai com a AT) terá impedido que o facto em questão fosse, desde logo, considerado assente. Todavia, tendo em conta a posição assumida pelo próprio réu B..... perante a AT e nesta ação e a prova documental e testemunhal acima referidas, parece-nos indiscutível concluir que esse réu exercia realmente a atividade de comércio de veículos automóveis, não merecendo, pois, qualquer censura a resposta positiva ao quesito 1º. No que respeita à resposta ao quesito 2º, os Recorrentes discordam apenas de que se tenha considerado provado que a ação inspetiva terminou em 19.05.2003, pretendendo que, nesta parte, se julgue provado que tal ocorreu em 29.07.2003, data em que o réu B..... foi notificado do relatório final da inspeção. Esta resposta está conexionada com a do quesito seguinte, que alude à notificação da conclusão da ação inspetiva, que se considerou efetuada com a comunicação de 22/5 e que os Recorrentes pretendem ver alterada para 29/7. Não se vê grande utilidade nestes factos (e, bem assim, no do quesito 4º), no que concerne às indicadas datas, como se depreende do que adiante será dito na apreciação do mérito sobre a existência e anterioridade do crédito do autor. De todo o modo, não existe razão para que as respostas não traduzam objetivamente o que se passou na realidade, sem necessidade de recorrer aqui, indevidamente, a qualificações que são necessariamente conclusivas ("fim da inspeção"; "conclusão da ação inspetiva"). Assim e porque as respostas assentam sobretudo na prova documental junta aos autos (cfr. fls. 12 e segs), a respetiva redação é alterada nestes termos: Quesito 2º - Provado apenas que: e foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003, tendo o referido réu sido notificado, por carta remetida a 22.05.2003, do "Projeto de Conclusões do Relatório de Inspeção" para, querendo, exercer o direito de audição. Quesito 3º - Provado apenas que, depois de uma tentativa frustrada, por o réu não ter reclamado nos CTT a carta que lhe foi enviada em 03.07.2003, o réu foi notificado, em 29.07.2003, do relatório final da ação inspetiva, que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000. Por último, os recorrentes insurgem-se contra a resposta ao quesito 4º, no que respeita à data em que foi efetuada a liquidação. Sem razão, porém. Desde logo, a impugnação, como vem formulada, não conduziria a que o facto fosse considerado simplesmente como não provado, uma vez que apenas se põe em causa a data da liquidação. Todavia, importa notar que a liquidação há de ser necessariamente anterior à reclamação graciosa contra a mesma deduzida, estando documentado nos autos a data em que a mesma foi apresentada (30.01.2004 - fls. 81). Por outro lado, nos factos provados da sentença proferida na impugnação judicial - al. X) e segs (fls 212) - alude-se a prova documental que demonstra a notificação ao réu, por carta de 22.09.2003, das liquidações efetuadas em 25.08.2003, como o réu acabou por reconhecer. Não vemos, por isso, razão para alterar a resposta a este quesito. 2. Sustentam os Recorrentes que a sentença é nula por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão - art. 668º nº 1 b) do CPC - acrescentando que "a decisão sobre a matéria de facto não especifica quais as concretas provas que levaram a que se desse como demonstrados os diferentes assentes". Aí incluem igualmente a "genérica remissão, sem especificação de concretos factos" que consta do facto provado nº 6. Parece, contudo, que aquela alegação confunde o regime de fundamentação das duas decisões que refere, envolvendo-as num mesmo regime e imputando-lhes um mesmo vício. No entanto, este vício é privativo da sentença, como decorre do normativo citado. O juiz deve especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão, sendo nula a sentença quando falte essa indicação. Mas desde há muito que se entende, de modo pacífico, que é necessária a absoluta falta de fundamentação[1], o que não ocorre, manifestamente, no caso. Por outro lado, esse vício não se identifica com a falta de exame crítico das provas, referido no art. 659º nº 3 do CPC, também invocado no recurso e que parece aí confundido com a análise crítica das provas, prevista no art. 653º nº 2 do mesmo diploma. Com efeito, na decisão sobre a matéria de facto são dados como provados os factos cuja verificação está sujeita à livre apreciação do julgador, que decide segundo a sua prudente convicção (art. 655º nº 1), com base na análise crítica das provas apresentadas, mostrando e explicando através desta as razões que objetivamente o determinam a ter (ou não) por provado determinado facto. Na fase da sentença, o exame crítico tem apenas por objeto os factos provados através dos meios legais indicados no art. 659º nº 3 (acordo das partes, documento ou confissão), de harmonia com as respetivas normas do direito probatório. Ou seja, identificado e delimitado um facto, constante, designadamente do documento, da declaração confessória ou da resposta a articulado, deve determinar-se se esse facto é abrangido pela força probatória do respetivo meio de prova, em função do regime legal deste[2]. É claro que se são apenas atendíveis factos que constavam dos Factos Assentes e que resultaram da decisão sobre a matéria de facto, não haverá lugar a exame crítico, por não existirem provas que a este devam ser submetidas[3]. No caso, verifica-se que o Sr. Juiz considerou na sentença um "facto" que não constava dos Factos assentes nem da decisão sobre a matéria de facto, dando "por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais o teor das certidões de fls. 329 a 398 dos autos" (nº 6). Antecipando razões - para a questão a seguir invocada pelos Recorrentes, que incluem também esta remissão na nulidade invocada - deve dizer-se que o método é cómodo mas incorreto, como tem sido reiteradamente decidido nos tribunais superiores. Os documentos não são factos, mas simples meios de prova de factos e, por isso, na fixação da matéria de facto há que indicar os factos provados pelos documentos, não bastando "dar como reproduzidos" estes documentos. Essa é a regra, mas tem de haver razoabilidade: haverá casos em que será difícil e até inútil proceder à especificação invocada pelos Recorrentes. Ora, parece-nos ser essa a situação com que deparamos nos autos: o documento é constituído precisamente por uma certidão (repetida) de uma sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel e que julgou improcedente a impugnação deduzida pelo réu B...... É indiscutível que o Sr. Juiz podia considerar o teor de tal documento, atendendo à sua força probatória plena - cópia certificada que tem o valor do original, que é um documento autêntico - arts. 387º, 383º e 371º do CC - a isto se restringindo o exame crítico acima referido, que o Sr. Juiz dispensou, certamente, por a questão não suscitar qualquer dúvida. Tendo em conta a extensão do documento e a complexidade do seu conteúdo, não se vê que a sua inclusão nos factos provados desta ação pudesse ser feita senão através de uma remissão genérica para o teor de tal documento. Assim, a redação do facto nº 6 passa a ser a seguinte: Por sentença proferida em 12.03.2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, foi julgada improcedente a impugnação judicial da decisão que negou provimento ao recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento da reclamação graciosa das liquidações adicionais de IVA e correspondentes juros compensatórios, respeitantes aos anos de 1999 e 1º trimestre de 2000, nos valores de 677.729,58¤ e 148.188,49¤, na importância total de 1.031.155,98¤, conforme certidão de fls. 366 a 398, aqui dada por integralmente reproduzida. No que respeita à fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, prevista no art. 653º nº 2 do CPC, ela concretiza-se na análise crítica das provas e na especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador. Afigura-se-nos que, no caso, a motivação da decisão satisfaz perfeitamente a exigência legal, tendo o Sr. Juiz indicado a prova documental e testemunhal que foi relevante para a sua convicção e justificando suficientemente as respostas dadas aos pontos de facto controvertidos. Não existe, pois, falta de fundamentação da decisão de facto. De qualquer modo, a existir tal falta, a mesma não seria subsumível na previsão do art. 668º nº 1 b), mas antes do art. 712º nº 5 do CPC, onde se prescreve meio diferente de sanar o vício. Porém, a solução aí prevista não poderia ser imposta oficiosamente, sendo certo que os Recorrentes a não requereram. IV. Os factos provados, considerando as alterações introduzidas no ponto anterior, são os seguintes: 1. Pela escritura de partilha em vida de fls. 71, cujo teor se dá por repetido, celebrada em 21 de julho de 2003, os réus B..... e mulher C.... declararam doar a seus filhos, os réus D..... e E....., como adiantamento das respetivas quotas hereditárias, os prédios identificados na relação de fls. 76, cujo teor se dá por repetido. 2. O réu B..... exercia a atividade de comércio de automóveis 3. E foi objeto de uma ação inspetiva no âmbito do IVA, que teve início em 23 de janeiro de 2003, tendo o referido réu sido notificado, por carta remetida a 22.05.2003, do "Projeto de Conclusões do Relatório de Inspeção" para, querendo, exercer o direito de audição. 4. Depois de uma tentativa frustrada, por o réu não ter reclamado nos CTT a carta que lhe foi enviada em 03.07.2003, o réu foi notificado, em 29.07.2003, do relatório final da ação inspetiva, que registava IVA em falta, no total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000. 5. Em 25 de agosto de 2003, foi efetuada a liquidação do IVA, estando em falta por parte do réu B..... ¤ 825.918,07, acrescido de juros compensatórios no total de ¤ 205.237,91. 6. Com a escritura referida em 1, o Estado ficou impossibilitado de reaver, no todo ou em parte, o IVA referido em 4, já que ao réu B..... não são conhecidos outros bens para além de uns depósitos bancários que não se mostraram suficientes para o pagamento de quantia não superior a ¤ 10.000,00. 7. Por sentença proferida em 12.03.2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, foi julgada improcedente a impugnação judicial da decisão que negou provimento ao recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento da reclamação graciosa das liquidações adicionais de IVA e correspondentes juros compensatórios, respeitantes aos anos de 1999 e 1º trimestre de 2000, nos valores de 677.729,58¤ e 148.188,49¤, na importância total de 1.031.155,98¤, conforme certidão de fls. 366 a 398, aqui dada por integralmente reproduzida. V. A impugnação pauliana consiste na faculdade que a lei concede aos credores de atacarem judicialmente certos atos válidos ou mesmo nulos celebrados pelos devedores em seu prejuízo[4] - art. 610º do CC (como os preceitos adiante citados sem outra indicação). Nos termos desta disposição legal e art. 612º, essa impugnação depende da verificação simultânea destes requisitos: - a existência de determinado crédito; - que esse crédito seja anterior à celebração do ato ou, sendo posterior, tenha sido o ato realizado dolosamente visando impedir a satisfação do direito do futuro credor; - resultar do ato a impossibilidade para o credor de obter a satisfação plena do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade; - que tenha havido má fé, tanto da parte do devedor como do terceiro, tratando-se de ato oneroso, entendendo-se por má fé a consciência do prejuízo que o ato causa ao credor. De realçar que ao credor incumbe o ónus de prova da existência e anterioridade do seu crédito, bem como o montante das dívidas - desde que se problematize a existência de outras dívidas - cabendo ao devedor ou ao terceiro interessado na manutenção do ato a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor - art. 611º[5]. No caso, a prova produzida não deixa dúvidas sobre a existência do crédito de que o autor é titular sobre o réu B....., crédito este proveniente de IVA devido pelas transações levadas a cabo por esse réu no exercício da sua atividade de comércio de automóveis, perfazendo o IVA em falta o total de ¤ 825.918,07, sendo ¤ 677.729,58 do ano de 1999 e ¤ 148.188,49 do ano de 2000. Os Recorrentes, não pondo claramente em causa a existência desse crédito, suscitam, como se referiu, estas questões: - se o ato é oneroso ou gratuito; - a anterioridade do crédito; - a responsabilidade da 1ª ré; - a prescrição da dívida tributária. 1. Os recorrentes defendem que o ato impugnado é oneroso, em face da existência de diferentes atribuições patrimoniais entre os intervenientes, nomeadamente a favor dos RR. B..... e C..... Na sentença recorrida afirmou-se, sobre esta questão, o seguinte: (...) Entende-se que, ao contrário do defendido pelos réus, o ato impugnado - partilha em vida - é um negócio gratuito e não oneroso. Com efeito, nos termos do art. 2029º do CC, não é havido como sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou de parte deles a algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados. Resulta do artigo citado a previsão de uma doação entre vivos, tratando-se de uma partilha dos bens doados por via do próprio contrato de doação, em que as tornas funcionam como meio de composição dos respetivos quinhões, sendo certo que a doação é um negócio gratuito (cfr. art. 940º do CC) - neste sentido cfr. acórdão do STJ de 8/11/2007, in www.dgsi.pt (...). A ser assim, como entendemos que é, não é necessária a má fé do devedor e dos terceiros, procedendo a impugnação pauliana ainda que um ou outro tivessem agido de boa fé (cfr. art. 612º do CC)". Apesar das doutas alegações dos Recorrentes, subscreve-se esta fundamentação, que tem claro apoio nas disposições legais citadas. É esse também o entendimento francamente predominante na doutrina. Com efeito, como referem Pires de Lima e Antunes Varela[6], "no fundo, não há, neste caso, senão uma doação (entre vivos) feita pelo ascendente a todos os herdeiros legitimários. Apenas sucede que alguns recebem bens, enquanto outros só percebem verdadeiras tornas - o valor da quota (em bens) que caberia a cada um deles, se os bens doados tivessem sido atribuídos a todos eles, na proporção que a lei fixa os seus quinhões legitimários. Mas todos ficam, afora isso, em igualdade de condições, no próprio momento em que é feita a doação". E acrescentam: "O ato admitido no artigo 2029º é, pois, uma doação em vida (uma partilha em vida, como se lhe veio a chamar na epígrafe oficial da disposição, mas não uma partilha da herança), com a particularidade de os bens doados ficarem a pertencer exclusivamente a algum ou alguns herdeiros legitimários, cabendo aos outros as tornas respetivas". No mesmo sentido, afirma Pereira Coelho[7] que os bens são doados em vida, não são deixados pelo doador e não fazem pois parte da sua herança. A partilha não é da herança, mas de determinados bens presentes. E, como qualquer doação em vida, a doação produz aqui imediatamente os seus efeitos, podendo, pois, o beneficiário ou beneficiários da liberalidade dispor dos bens doados ainda em vida do doador". Refere também Oliveira Ascensão que "a partilha em vida é uma doação verdadeira e própria, sujeita às regras da doação"; "o contrato é de doação como qualquer outro"[8]. A partilha em vida constitui, assim, uma verdadeira doação entre vivos, que apenas se distingue das doações em geral por ter como donatários exclusivos algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários do doador e exigir como elemento integrante o consentimento dos outros presumidos herdeiros legitimários e o pagamento ou a constituição da obrigação de pagamento do valor que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados[9]. Constituindo o ato impugnado uma verdadeira doação e assumindo, por isso, natureza gratuita, a procedência da impugnação não exige o requisito da má fé (consciência do prejuízo que o ato causa ao credor), como prescreve o art. 612º. 2. Sustentam também os Recorrentes o crédito do autor, para os efeitos previstos no art. 610º, só pode considerar-se constituído com a notificação da liquidação, pelo que é posterior ao ato impugnado. E sendo posterior, a procedência da impugnação estava dependente da alegação e prova do dolo, o que não foi feito. Afigura-se-nos que não têm razão também quanto a esta questão, entendendo-se, como na sentença recorrida, que crédito se constituiu no momento em que decorreu o prazo legal para o pagamento daquele IVA, sem que tal pagamento tivesse sido efetuado, e não com o ato tributário de liquidação adicional que, na sequência da ação inspetiva, veio a ser notificado ao sujeito passivo do imposto. Nos termos do art. 36º nº 1 da Lei Geral Tributária (LGT), a relação jurídica tributária constitui-se com o facto tributário. "O facto tributário é, assim, o pressuposto legal, de caráter fáctico, que determina o nascimento da obrigação tributária. Um facto material produz efeitos tributários sempre que se enquadre num tipo legal de imposto. Nos tipos legais de imposto podem distinguir-se dois elementos: o objetivo e o subjetivo. O elemento objetivo corresponde ao facto ou aos factos que o legislador previu como determinando o nascimento do imposto. O elemento subjetivo traduz a conexão entre o elemento objetivo (factos) e o sujeito passivo"[10]. O IVA é um imposto geral sobre a despesa (aplica-se a todas as operações económicas), plurifásico (aplica-se a todas as fases do circuito económico) e sem efeitos cumulativos (incide apenas sobre o aumento de valor que os bens passam a ter em cada fase)[11]. Estão sujeitos a este imposto, designadamente, as transmissões e as importações de bens - art. 1º a) e b) do CIVA. O facto gerador e a exigibilidade do imposto vêm previstos nos arts. 7º e 8º deste diploma: em regra, o imposto é devido e torna-se exigível no momento em que os bens são postos à disposição do adquirente, no momento do despacho aduaneiro ou da realização da venda (importações) ou no momento da emissão da fatura. O montante do imposto exigível deve ser pago periodicamente, acompanhando as declarações periódicas (no caso, trimestrais) - arts. 27º e 41º do CIVA. Da factualidade provada decorre que o réu B..... procedeu a incorreta declaração e liquidação do IVA, relativamente a operações comerciais que realizou nos anos de 1999 e 2000. Deveria ter pago no trimestre subsequente a cada uma das operações o imposto que se veio a apurar estar em falta. Daí que se tenha considerado que incorreu nas correspondentes infrações fiscais. Daí também a justificação para o cálculo de juros compensatórios, uma vez que, por culpa sua, retardou a liquidação e pagamento de parte do imposto devido - art. 35º da LGT. O imposto em falta deveria ter sido pago nos anos de 1999 e 2000. Entende-se, por conseguinte, como se referiu, que o crédito do Estado se constituiu no momento em que decorreu o prazo legal para o pagamento do aludido imposto, sem que tal pagamento tivesse sido efetuado, sendo, consequentemente, anterior ao ato aqui impugnado, não dependendo a procedência da impugnação da alegação e prova do dolo - art. 610º a). 3. Discordam ainda os Recorrentes da decisão de considerar a ré C.... responsável pela dívida, nos termos dos arts. 1691º nº 1 d) e 15º, este do CCom. Acrescentam que mesmo que subsistissem razões para que a ação procedesse, tal só poderia suceder no que respeita à meação do réu B..... nos bens partilhados e não na meação daquela ré. Mais uma vez, sem razão, parece-nos. Na sentença recorrida, afirma-se o seguinte: "Relativamente à ré C...., mulher do mencionado devedor B....., não está efetivamente demonstrado que a mesma tivesse participado naquelas transações que deram lugar à existência de IVA a pagar ao Estado. Resulta do teor do documento de fls. 69 a 75 dos autos (certidão), que as referidas pessoas são casadas no regime da comunhão geral de bens. Nos termos do art. 1691º, n.º 1, al. d), do CC, são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer um deles no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre os cônjuges o regime da separação de bens. De harmonia com o disposto no art. 15º do Cód. Comercial, as dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do seu comércio. "É comerciante quem exerce profissionalmente o comércio, sendo este um tipo de atividade económica que essencialmente se caracteriza por ser uma atividade de interposição nas trocas, isto é, de mediação entre a oferta e a procura" - neste sentido cfr. Ferrer Coreia, in "Lições de Direito Comercial", Lisboa, 1994, p. 76. No caso concreto e face à matéria apurada, conclui-se que, à data dos factos em apreço, o réu B..... exercia profissionalmente o comércio de automóveis e, como tal, era comerciante, sendo que a dívida do mencionado réu em causa nestes autos foi contraída no exercício do seu comércio. Sendo assim, como entendemos que é, pela mencionada dívida responde também a ré C...., porquanto se presume o proveito comum do casal, sem que tal presunção se mostre ilidida, e não vigora no casamento o regime da separação de bens". E acrescenta-se ainda: "Todavia, mesmo que assim não se entendesse, o que não se concede, sempre perfilharíamos o entendimento vertido nos acórdãos do STJ e da RP, respetivamente de 18/04/02 e 19/03/09, segundo o qual não obsta à impugnação pauliana de doação ou partilha em vida de bem comum dos doadores a circunstância de a dívida ser da responsabilidade de um deles apenas. Com efeito e passando a citar o primeiro dos acórdãos citados, "pela nova redação dada ao n.º 1 (...)" do art. 1696º, n.º 1, do CC "(...) pelo art. 4º do DL n.º 329-A/95, de 12 de dezembro (...) deixou de haver dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges sujeitas à moratória prevista na redação anterior do n.º 1 daquele preceito. Adjetivando este novo regime, o n.º 1 do art. 825º do CPC, na redação dada por aquele DL n.º 329-A/95, de 12 de dezembro, veio permitir ao credor, na execução movida contra um dos cônjuges, a nomeação de bens comuns à penhora determinados, desde que peça a citação do cônjuge do executado para requerer a separação de bens. Se nenhum dos cônjuges (...) requerer a separação de bens, no prazo previsto no n.º 2 do art. 825º do CPC, a execução prosseguirá nos bens penhorados. (...) Assim, podendo o credor nomear à penhora bens comuns do casal na execução movida contra o cônjuge devedor, desde que requeira a citação do cônjuge não devedor para requerer a separação, esses bens constituem em princípio a garantia patrimonial do crédito. Garantia que pode ficar definitivamente assente, se não vier a ser requerida a partilha ou se nesta eles vierem a caber ao executado»". O entendimento da primeira parte deste excerto é, a nosso ver, correto. Com efeito, nos termos do art. 13º nº 1 do CCom, são comerciantes as pessoas que, tendo capacidade para praticar atos do comércio, fazem deste profissão. É assim comerciante quem habitual, regular e sistematicamente praticar atos de comércio[12]. De harmonia com o disposto no art. 15º do mesmo diploma legal, as dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do comércio. E conforme dispõe o art. 1691 nº 1 d), responsabilizam ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre os cônjuges o regime de separação de bens. Como ensina Antunes Varela[13], estabelece-se nestes preceitos uma dupla e articulada presunção: as dívidas comerciais de qualquer dos cônjuges, desde que comerciante, presumem-se realizadas no exercício da sua atividade comercial; e, desde que presuntivamente realizadas no exercício do comércio do devedor, presumem-se contraídas em proveito comum do casal. No caso, à luz do que fica exposto, o réu não pode deixar de ser considerado como comerciante. Exercia a atividade de comércio de veículos automóveis, mantendo para tal uma contabilidade organizada. A dívida peticionada é comercial, uma vez que decorre da atividade comercial exercida pelo Réu, o que se presume. Sendo realizada no exercício do comércio do Réu, e não vigorando entre os cônjuges o regime de separação de bens - facto da al. c) - presume-se que a dívida foi contraída em proveito comum do casal. Ora, presumindo-se que a dívida foi contraída em proveito comum, é evidente que o Autor não precisaria de provar esse facto - arts. 350º nº 1 e 344º do CC. O ónus da prova impendia sobre os Réus: estes é que deveriam demonstrar que a dívida não foi contraída em proveito comum. Constata-se, porém, que não o fizeram, nada alegando nesse sentido. Daí que se entenda que a dívida é também da responsabilidade da ré. Parece-nos, porém, que esta conclusão não assume a relevância que os Recorrentes lhe atribuem: é que, mesmo que a ré não fosse considerada responsável pela dívida, tal facto não obstaria à procedência integral da ação (e não apenas pela meação do réu, como se defende no recurso). Com efeito, a impugnação, já o afirmámos[14], "não supõe um título inválido", "nem acarreta a invalidade superveniente do título"[15]. "Não se trata de uma ação de declaração de nulidade, uma vez que os atos impugnados continuam válidos", "nem de uma ação de anulação da transmissão, dado que a procedência da impugnação não faz reverter os bens alienados ao património do devedor"[16]. O ato sujeito à impugnação pauliana "não tem vício genético algum, sendo totalmente válido": "a impugnação é uma ação pessoal, onde se faz valer apenas um direito de crédito de um dado credor"; o ato, mesmo que impugnado com êxito, mantém-se válido e eficaz, continuando os bens alienados a pertencer ao adquirente, apenas respondendo, dentro do seu património, pelas dívidas do alienante[17]. Na sentença, na segunda parte do excerto acima transcrito, admitiu-se que a ação pudesse proceder, mesmo que a ré mulher não seja considerada responsável, reconhecendo-se neste caso ao autor o direito de executar os bens adjudicados à ré mulher até à medida do que se mostrar necessário à cobrança dos seus créditos, sem prejuízo do disposto no art. 825º do CPC. Esta decisão acolhe uma das soluções que têm sido adotadas sobre a questão de saber que bens são abrangidos pela impugnação na hipótese de serem alienados bens comuns e de a dívida ser da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges[18]. Tal entendimento parte da extinção da moratória (que era prevista no art. 1696º do CC), operada pelo art. 4º do DL 329-A/95 e da redação introduzida por este diploma ao art. 825º do CPC, que passou a permitir que, na falta ou insuficiência de bens próprios do cônjuge devedor, sejam imediatamente penhorados bens comuns do casal, devendo o cônjuge do executado ser citado para requerer, querendo, a separação de bens. Assim, se o cônjuge do executado apresentar esse requerimento, a execução fica suspensa ate à partilha; sendo os bens penhorados adjudicados ao cônjuge devedor, a execução prosseguirá nesses bens; se os bens penhorados forem adjudicados ao outro cônjuge, o exequente terá de nomear outros bens que tenham cabido ao cônjuge devedor. Como sublinha J. Cura Mariano[19], em vez da admissibilidade da simples penhora da meação do devedor no património comum, permite-se deste modo que, em execução movida contra apenas um dos cônjuges se penhorem bens comuns do casal e daí que a impugnação pauliana possa ter também por objeto um ato relativo a esses bens na totalidade[20]. Decorre desta síntese que a sentença não deveria, nesta parte, merecer a censura feita pelos Recorrentes. É que, na perspetiva da decisão - e, realce-se, na hipótese subsidiária que estamos a analisar, de poder admitir-se que ela não é também responsável pela dívida - a ré não seria compelida a pagar e a condenação só iria refletir-se efetivamente sobre o seu património se ela nada requeresse ao ser citada nos termos do art. 825º do CPC. Porém, tendo presente os efeitos do ato impugnado, parece-nos que a solução deve ser diferente. Dissemos atrás, citando Paula Costa e Silva, que a impugnação não supõe um título inválido, nem acarreta a invalidade superveniente do título. Assim, no caso de impugnação de ato de alienação de bem comum por ambos os cônjuges, acrescenta a mesma Autora[21], "aquele bem que, antes da transmissão, fora um bem comum do casal, com a transmissão, que se considera válida, valendo o título contra o credor, deixou de ter esta qualidade por referência ao património em que anteriormente estava integrado". Compreende-se, pois, que, "depois da transmissão, não poderá falar-se de partilha do património comum do casal transmitente a fim de se verificar a qual dos dois cônjuges é deferido o bem transmitido. O bem já não integra o património destes cônjuges, mas o património de terceiro". Afirma-se também no Acórdão do STJ de 15.03.2005[22], com apoio na referida anotação, que a impugnação pauliana pressupõe que o contrato de alienação seja válido, pelo que o bem é de terceiro. Nessa medida, procedendo a impugnação pauliana, é um bem de terceiro a restituir mas sem perder a natureza de bem de terceiro, o que, se por um lado, inviabiliza poder proceder apenas em parte, torna, por outro, inaplicável o regime do art. 825º do CPC (já não há lugar a falar em bens comuns do casal, em se tratar de bem integrado na comunhão conjugal). Como afirmámos, não se questionando a validade do ato impugnado, os bens pertencem aos réus adquirentes, uma vez que adquiriram os bens, sendo agora seus proprietários. Pertencendo assim a esses réus, não se tratando, portanto, de bens comuns, torna-se inaplicável o art. 825º do CPC, uma vez que nada há a partilhar para se saber se os bens viriam a caber ao cônjuge devedor do credor impugnante. Com a procedência da impugnação, o autor ficará munido de título que lhe permite atingir o património dos réus adquirentes, estendendo-se a penhora aos bens transmitidos pelo ato impugnado; quer dizer, obtida a impugnação, o autor pode executar diretamente o património dos referidos réus, obrigados à restituição, não lhe sendo concedida uma pretensão à restituição dos bens ao património do devedor. A pretensão do autor contra esses réus não será, assim, uma pretensão de entrega dos bens; essa pretensão dirige-se à satisfação do seu crédito através do produto da venda dos bens; não através de execução para entrega de coisa certa, mas de execução para pagamento de quantia certa[23]. Não há que curar aqui das consequências que daí decorrem para os intervenientes[24]; interessa apenas concluir que, mesmo a admitir que a ré Emília não seja responsável pela dívida ao autor, esta circunstância não constituiria obstáculo à procedência integral da impugnação. 4. Por fim, invocam os Recorrentes a prescrição da dívida tributária. Na sentença afirmou-se que o tribunal não pode conhecer desta questão, competindo tal conhecimento às instâncias competentes para aquelas matérias. Parece-nos, porém, que não será essa a razão que nos levará a decidir conhecer ou não da questão, uma vez que a competência do tribunal comum se pode estender às questões - e, por isso, também às exceções, como a prescrição - que os réus suscitem como meio de defesa - art. 96º do CPC. Saliente-se que a prescrição é, no âmbito do direito fiscal, de conhecimento oficioso - art. 175º do CPPT[25]. O problema é o da utilidade em decidir aqui dessa questão, uma vez que a decisão, seja ela qual for, não fará caso julgado fora do processo, não vinculando, por isso, a Autoridade Fiscal. Acresce que uma eventual decisão de procedência da exceção poderia causar sérios embaraços (a ser seguido entendimento diferente por essa AT). Não parece, porém, que tal situação venha aqui a ocorrer, por ser evidente que a exceção de prescrição não pode proceder, nada impedindo, por isso, que se tome posição sobre a questão. Vejamos. Na redação inicial da LGT dispunha o artigo 48º: 1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu. 2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários. 3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5º ano posterior ao da liquidação. E o artigo 49º: 1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação. 3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso. Os nºs. 1 e 3 deste artigo 49º passaram, com a Lei 100/99, de 26/6, a ter esta redação: 1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso. A Lei 55-B/2004, de 30/12, alterou depois o nº 1 daquele artigo 48º da LGT, o qual ficou com a redação seguinte: 1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. A Lei 53º-A/2006, de 29/12, veio alterar o art. 49º da LGT, tendo sido revogado o seu nº 2, alterada a redação do seu nº 3 e aditado o atual nº 4, passando a ter esta redação: 1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 2 - Revogado. 3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar. 4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida. Decorre destas normas que, no caso, o prazo de prescrição aplicável é o previsto no artigo 48º, nº 1, da LGT - oito anos - e começou a correr a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. Devem, porém, ser considerados os factos interruptivos da prescrição, suscetíveis de influir no decurso do prazo, previstos na lei vigente à data que ocorreram - nº 2 do artigo 12º do CC[26]. No caso, porque se verificam vários factos a que é atribuído efeito interruptivo da prescrição (reclamação graciosa, citação, recurso hierárquico e impugnação judicial), pela atual redação do art. 49º, nº 3 da LGT a interrupção da prescrição teria lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar, ou seja, os factos com potencial efeito interruptivo que ocorram após a primeira interrupção deixariam de ter tal efeito. Porém, essa nova redação apenas entrou em vigor em 01.01.2007, sendo uma norma sobre os efeitos de factos, pelo que só se aplica após a sua entrada em vigor (art. 12º, nº 2 do CC). "Por isso, as causas de interrupção da prescrição que ocorreram anteriormente produziram os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência. Isto significa, assim, que as causas de interrupção da prescrição que ocorreram a partir de 1-1-2007 só têm efeito interruptivo se, antes de elas ocorrerem, não ocorreu qualquer outra com idêntico efeito; mas, as que ocorreram anteriormente têm o seu efeito interruptivo próprio, de eliminar para a prescrição o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso do prazo de prescrição até ao termo do processo ou até à paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte"[27]. No caso dos autos, o primeiro facto interruptivo da prescrição ocorreu em 29.01.2004, data em que foi apresentada a reclamação graciosa, daí decorrendo, como se referiu, a inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido e obstando ao decurso do prazo de prescrição enquanto o processo estivesse pendente ou não estivesse parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte[28]. A decisão de indeferimento da reclamação foi notificada em 03.03.2005. Em 10.04.2005 surge nova causa de interrupção com a interposição de recurso hierárquico, que foi julgado improcedente por decisão notificada em 30.03.2007. Os autos não fornecem quaisquer elementos que permitam afirmar que este recurso esteve parado por mais de um ano (para além do decurso de um período de tempo que seria suficiente para tal). Admitindo que sim, como os Recorrentes alegam, e, na hipótese mais favorável para estes, que essa paragem ocorreu logo depois de o recurso ser apresentado, este facto teria por consequência a cessação do efeito interruptivo do recurso, "degradando-se" em mera suspensão, voltando a correr o prazo uma vez completado um ano de paragem e somando-se ao prazo posteriormente decorrido o que tiver decorrido até à data da autuação. Ora, antes da autuação do recurso hierárquico, apenas há que contar o período que vai de 03.03.2005 (indeferimento da reclamação graciosa) até 10.04.2005; o tempo decorrido após o ano de paragem, iniciou-se em 10.04.2006. Daí resulta claramente que não decorreu ainda o prazo de prescrição e que este não se completará antes de 03.03.2014 (na hipótese apontada, mais favorável aos recorrentes, de o recurso hierárquico ter estado parado por mais de um ano e logo após o seu início). VI. Em face do exposto, julga-se a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pelos apelantes. Porto, 11 de outubro de 2012 Os Desembargadores, Fernando Manuel Pinto de Almeida Trajano Amador Seabra Teles de Menezes e Melo Mário Manuel Batista Fernandes NOTAS: [1]Cfr. Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V, 139 e 149; Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed., 687; Lebre de Freitas, CPC Anotado, Vol. 2º, 669. [2]Cfr. Alberto dos Reis, Ob. Cit., 32 e 33 e Lebre de Freitas, Ob. Cit., 643 e Ação Declarativa Comum, 284 e 285. Cfr. também, entre outros, o Ac. do STJ de 10.05.2005, em www.dgsi.pt, e o trabalho do ora relator, A Fundamentação da sentença cível, publicado no site desta Relação. [3]Cfr. o citado Ac. do STJ de 10.05.2005. [4]Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10ª ed., 857 e segs.. [5]Ac. do STJ de 10.11.98, BMJ 481-449. [6] CC Anotado, Vol. VI, 20 [7] Direito das Sucessões (1992)32. [8] Direito Civil - Sucessões, 106 e 497. [9] Cfr. Capelo de Sousa, Lições de Direito das Sucessões, 2ª ed., 51; no mesmo sentido Cristina Dias, Lições de direito das sucessões, 33. [10] Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Lopes de Sousa, LGT Comentada e anotada,136. [11] Cfr. N. Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, 240. [12] Cfr. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, I, 184; Ac. do STJ de 1.7.93, CJ STJ I, 2, 178. [13] Direito da Família, 1º Vol. 4ª ed., 401; cfr. também Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, I Vol., 2ª ed., 412 e A. Lopes Cardoso, Da Responsabilidade dos Cônjuges por Dívidas Comerciais, em Temas de Direito da Família, 173 e 174. [14] Acórdão desta Relação de 14.07.2008, em www.dgsi.pt. [15] Paula Costa e Silva, Cadernos de Direito Privado, nº 7 (julho/dezembro de 2004), 54. [16] Menezes Leitão, Garantias das Obrigações, 102. [17] P. Romano Martinez e P. Fuzeta da Ponte, Garantias de Cumprimento, 3ª ed., 20 e 21. [18] Cfr. os Acórdãos do STJ de 09.01.2003, de 21.01.2003 e de 14.12.2006, em www.dgsi.pt. [19] Ob. Cit., 101. [20] Na outra solução, a que anteriormente aderimos (Ac. desta Relação de 06.05.2004, em www.dgsi.pt), e que é defendida pelos Recorrentes, a impugnação só pode visar a alienação da quota do cônjuge devedor no bem comum, uma vez que o outro cônjuge não é responsável pela dívida. Daí que os réus devessem ser condenados a ver declarada a procedência da impugnação pauliana relativamente à quota parte do bem alienado, mas conferindo-se ao autor o direito à imediata restituição desse bem na medida necessária à satisfação do seu crédito - cfr. os Acórdãos do STJ de 24.10.2002 e de 05.06.2003, em www.dgsi.pt. [21] Ob. Cit., 60. [22] Em www.dgsi.pt. [23] Paula Costa e Silva, Ob. Cit., 56 e 57. [24] Cfr., em relação aos adquirentes, o disposto no art. 617º nº 1. Tratando-se de ato gratuito, não se vê que compensações poderiam ser obtidas pela ré Emília (cfr. art. 1697º nº 2). [25] "A prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva, de conhecimento oficioso em qualquer grau de jurisdição, até ao trânsito em julgado da decisão final sobre o objeto da causa" - Acórdão do STA de 11.03.2009, em www.dgsi.pt. [26] J. Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, 2ª ed., 101; cfr. os Acórdãos do STA de 26.04.2012 e de 08.02.2012, em www.dgsi.pt. [27] J. Lopes de Sousa, Ob. Cit., 72 e 73; também os Acórdãos do STA de 23.11.2011, de 07.03.2012 e de 30.05.2012, em www.dgsi.pt. [28] Estando já interrompido o prazo, a citação no processo de execução, entretanto instaurada, é inócua para este efeito. ANOTAÇÃO Questão decidenda: O Tribunal da Relação do Porto, no dia 11 de outubro de 2012, procurou dar solução definitiva, entre outras, à seguinte questão: - Apurar de se verificam requisitos da impugnação pauliana, discutindo-se: - se o ato é oneroso ou gratuito; - a anterioridade do crédito; - a responsabilidade da 1ª ré; - a prescrição da dívida tributária. Solução jurídica: A questão em apreço consiste aferir-se se se verificam os requisitos da impugnação pauliana. 1. Os recorrentes defendem que o ato impugnado é oneroso, em face da existência de diferentes atribuições patrimoniais entre os intervenientes, nomeadamente a favor dos RR. B..... e C..... A partilha em vida constitui uma verdadeira doação entre vivos, que apenas se distingue das doações em geral por ter como donatários exclusivos algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários do doador e exigir como elemento integrante o consentimento dos outros presumidos herdeiros legitimários e o pagamento ou a constituição da obrigação de pagamento do valor que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados. Constituindo o ato impugnado uma verdadeira doação e assumindo, por isso, natureza gratuita, a procedência da impugnação não exige o requisito da má fé. Sustentam também os Recorrentes o crédito do autor, para os efeitos previstos no art. 610º, só pode considerar-se constituído com a notificação da liquidação, pelo que é posterior ao ato impugnado. E sendo posterior, a procedência da impugnação estava dependente da alegação e prova do dolo, o que não foi feito. Entende a Relação do Porto que crédito se constituiu no momento em que decorreu o prazo legal para o pagamento daquele IVA, sem que tal pagamento tivesse sido efetuado, e não com o ato tributário de liquidação adicional que, na sequência da ação inspetiva, veio a ser notificado ao sujeito passivo do imposto. O IVA é um imposto geral sobre a despesa (aplica-se a todas as operações económicas), plurifásico (aplica-se a todas as fases do circuito económico) e sem efeitos cumulativos (incide apenas sobre o aumento de valor que os bens passam a ter em cada fase). Estão sujeitos a este imposto, designadamente, as transmissões e as importações de bens - art. 1º a) e b) do CIVA. Da factualidade provada decorre que o réu B..... procedeu a incorreta declaração e liquidação do IVA, relativamente a operações comerciais que realizou nos anos de 1999 e 2000. Deveria ter pago no trimestre subsequente a cada uma das operações o imposto que se veio a apurar estar em falta. Daí que se tenha considerado que incorreu nas correspondentes infrações fiscais. Daí também a justificação para o cálculo de juros compensatórios, uma vez que, por culpa sua, retardou a liquidação e pagamento de parte do imposto devido - art. 35º da LGT. O imposto em falta deveria ter sido pago nos anos de 1999 e 2000. Entende-se, por conseguinte, como se referiu, que o crédito do Estado se constituiu no momento em que decorreu o prazo legal para o pagamento do aludido imposto, sem que tal pagamento tivesse sido efetuado, sendo, consequentemente, anterior ao ato aqui impugnado, não dependendo a procedência da impugnação da alegação e prova do dolo - art. 610º a). 3. Discordam ainda os Recorrentes da decisão de considerar a ré C.... responsável pela dívida, nos termos dos arts. 1691º nº 1 d) e 15º, este do CCom. Acrescentam que mesmo que subsistissem razões para que a ação procedesse, tal só poderia suceder no que respeita à meação do réu B..... nos bens partilhados e não na meação daquela ré. Mais uma vez, sem razão. Nos termos do art. 13º nº 1 do CCom, são comerciantes as pessoas que, tendo capacidade para praticar atos do comércio, fazem deste profissão. É assim comerciante quem habitual, regular e sistematicamente praticar atos de comércio. De harmonia com o disposto no art. 15º do mesmo diploma legal, as dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do comércio. E conforme dispõe o art. 1691 nº 1 d), responsabilizam ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre os cônjuges o regime de separação de bens. Como ensina Antunes Varela, estabelece-se nestes preceitos uma dupla e articulada presunção: as dívidas comerciais de qualquer dos cônjuges, desde que comerciante, presumem-se realizadas no exercício da sua atividade comercial; e, desde que presuntivamente realizadas no exercício do comércio do devedor, presumem-se contraídas em proveito comum do casal. No caso dos autos, o réu não pode deixar de ser considerado como comerciante. Exercia a atividade de comércio de veículos automóveis, mantendo para tal uma contabilidade organizada. A dívida peticionada é comercial, uma vez que decorre da atividade comercial exercida pelo Réu, o que se presume. Sendo realizada no exercício do comércio do Réu, e não vigorando entre os cônjuges o regime de separação de bens - facto da al. c) - presume-se que a dívida foi contraída em proveito comum do casal. Ora, presumindo-se que a dívida foi contraída em proveito comum, é evidente que o Autor não precisaria de provar esse facto - arts. 350º nº 1 e 344º do CC. O ónus da prova impendia sobre os Réus: estes é que deveriam demonstrar que a dívida não foi contraída em proveito comum. Constata-se, porém, que não o fizeram, nada alegando nesse sentido. Daí que se entenda que a dívida é também da responsabilidade da ré. Porém, mesmo que a ré não fosse considerada responsável pela dívida, tal facto não obstaria à procedência integral da ação (e não apenas pela meação do réu, como se defende no recurso). O ato sujeito à impugnação pauliana "não tem vício genético algum, sendo totalmente válido": "a impugnação é uma ação pessoal, onde se faz valer apenas um direito de crédito de um dado credor"; o ato, mesmo que impugnado com êxito, mantém-se válido e eficaz, continuando os bens alienados a pertencer ao adquirente, apenas respondendo, dentro do seu património, pelas dívidas do alienante. No  caso de impugnação de ato de alienação de bem comum por ambos os cônjuges, "aquele bem que, antes da transmissão, fora um bem comum do casal, com a transmissão, que se considera válida, valendo o título contra o credor, deixou de ter esta qualidade por referência ao património em que anteriormente estava integrado". Compreende-se, pois, que, "depois da transmissão, não poderá falar-se de partilha do património comum do casal transmitente a fim de se verificar a qual dos dois cônjuges é deferido o bem transmitido. O bem já não integra o património destes cônjuges, mas o património de terceiro". Afirma-se também no Acórdão do STJ de 15.03.2005[22], que a impugnação pauliana pressupõe que o contrato de alienação seja válido, pelo que o bem é de terceiro. Nessa medida, procedendo a impugnação pauliana, é um bem de terceiro a restituir mas sem perder a natureza de bem de terceiro, o que, se por um lado, inviabiliza poder proceder apenas em parte, torna, por outro, inaplicável o regime do art. 825º do CPC (já não há lugar a falar em bens comuns do casal, em se tratar de bem integrado na comunhão conjugal). Não se questionando a validade do ato impugnado, os bens pertencem aos réus adquirentes, uma vez que adquiriram os bens, sendo agora seus proprietários. Pertencendo assim a esses réus, não se tratando, portanto, de bens comuns, torna-se inaplicável o art. 825º do CPC, uma vez que nada há a partilhar para se saber se os bens viriam a caber ao cônjuge devedor do credor impugnante. Com a procedência da impugnação, o autor ficará munido de título que lhe permite atingir o património dos réus adquirentes, estendendo-se a penhora aos bens transmitidos pelo ato impugnado; quer dizer, obtida a impugnação, o autor pode executar diretamente o património dos referidos réus, obrigados à restituição, não lhe sendo concedida uma pretensão à restituição dos bens ao património do devedor. A pretensão do autor contra esses réus não será, assim, uma pretensão de entrega dos bens; essa pretensão dirige-se à satisfação do seu crédito através do produto da venda dos bens; não através de execução para entrega de coisa certa, mas de execução para pagamento de quantia certa. Interessa, pois, concluir que, mesmo a admitir que a ré Emília não seja responsável pela dívida ao autor, esta circunstância não constituiria obstáculo à procedência integral da impugnação. Os Recorrentes invocam a prescrição da dívida tributária. A prescrição é, no âmbito do direito fiscal, de conhecimento oficioso - art. 175º do CPPT. O problema é o da utilidade em decidir aqui dessa questão, uma vez que a decisão, seja ela qual for, não fará caso julgado fora do processo, não vinculando, por isso, a Autoridade Fiscal. Acresce que uma eventual decisão de procedência da exceção poderia causar sérios embaraços (a ser seguido entendimento diferente por essa AT). Não parece, porém, que tal situação venha aqui a ocorrer, por ser evidente que a exceção de prescrição não pode proceder, nada impedindo, por isso, que se tome posição sobre a questão. Na redação inicial da LGT dispunha o artigo 48º: 1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu. 2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários. 3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5º ano posterior ao da liquidação. E o artigo 49º: 1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação. 3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso. Os nºs. 1 e 3 deste artigo 49º passaram, com a Lei 100/99, de 26/6, a ter esta redação: 1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso. A Lei 55-B/2004, de 30/12, alterou depois o nº 1 daquele artigo 48º da LGT, o qual ficou com a redação seguinte: 1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. A Lei 53º-A/2006, de 29/12, veio alterar o art. 49º da LGT, tendo sido revogado o seu nº 2, alterada a redação do seu nº 3 e aditado o atual nº 4, passando a ter esta redação: 1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 2 - Revogado. 3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar. 4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida. Decorre destas normas que, no caso, o prazo de prescrição aplicável é o previsto no artigo 48º nº 1 da LGT - oito anos - e começou a correr a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. Devem, porém, ser considerados os factos interruptivos da prescrição, suscetíveis de influir no decurso do prazo, previstos na lei vigente à data que ocorreram - nº 2 do artigo 12º do CC No caso, porque se verificam vários factos a que é atribuído efeito interruptivo da prescrição (reclamação graciosa, citação, recurso hierárquico e impugnação judicial), pela atual redação do art. 49º, nº 3 da LGT a interrupção da prescrição teria lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar, ou seja, os factos com potencial efeito interruptivo que ocorram após a primeira interrupção deixariam de ter tal efeito. Porém, essa nova redação apenas entrou em vigor em 01.01.2007, sendo uma norma sobre os efeitos de factos, pelo que só se aplica após a sua entrada em vigor (art. 12º, nº 2 do CC). "Por isso, as causas de interrupção da prescrição que ocorreram anteriormente produziram os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência. Isto significa, assim, que as causas de interrupção da prescrição que ocorreram a partir de 1-1-2007 só têm efeito interruptivo se, antes de elas ocorrerem, não ocorreu qualquer outra com idêntico efeito; mas, as que ocorreram anteriormente têm o seu efeito interruptivo próprio, de eliminar para a prescrição o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso do prazo de prescrição até ao termo do processo ou até à paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte". No caso dos autos, o primeiro facto interruptivo da prescrição ocorreu em 29.01.2004, data em que foi apresentada a reclamação graciosa, daí decorrendo, como se referiu, a inutilização de todo o período de prescrição anteriormente decorrido e obstando ao decurso do prazo de prescrição enquanto o processo estivesse pendente ou não estivesse parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte. A decisão de indeferimento da reclamação foi notificada em 03.03.2005. Em 10.04.2005 surge nova causa de interrupção com a interposição de recurso hierárquico, que foi julgado improcedente por decisão notificada em 30.03.2007. Os autos não fornecem quaisquer elementos que permitam afirmar que este recurso esteve parado por mais de um ano (para além do decurso de um período de tempo que seria suficiente para tal). Daí resulta claramente que não decorreu ainda o prazo de prescrição e que este não se completará antes de 03.03.2014 (na hipótese apontada, mais favorável aos recorrentes, de o recurso hierárquico ter estado parado por mais de um ano e logo após o seu início). Decisão do Acórdão: A decisão tomada pelos Juízes Desembargadores acabou por ser sumariada, no Acórdão, do seguinte modo: I- A remissão genérica para documentos, apesar de incorreta, não integra nulidade da sentença por falta de fundamentação, a qual só ocorre quando é absoluta, e por não ser subsumível à previsão do art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC. II- A partilha em vida constitui uma verdadeira doação e assume, por isso, natureza gratuita, pelo que a procedência da impugnação não exige o requisito da má fé. III- O crédito do Estado pelo IVA constitui-se no momento em que decorre o prazo legal para o seu pagamento, sem que seja efetuado, e não com o ato tributário de liquidação adicional que for posteriormente notificado ao sujeito passivo, pelo que, sendo aquele momento anterior ao ato impugnado, a procedência da impugnação pauliana não depende da alegação e prova do dolo. IV- O cônjuge do devedor comerciante também é responsável pela dívida decorrente da falta de pagamento daquele imposto, ainda que não tenha participado nas transações que o originaram, desde que não estejam casados no regime da separação de bens, por se tratar de dívida comercial e se presumir o proveito comum do casal, e, mesmo que não fosse responsável, tal facto jamais obstaria à procedência integral da ação de impugnação em face dos efeitos do ato impugnado. V- O prazo normal da prescrição das dívidas tributárias é de oito anos e começa a correr, quanto ao IVA, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, devendo ser considerados os factos interruptivos, suscetíveis de influir no decurso desse prazo, previstos na lei vigente à data em que ocorreram (cfr. art.ºs 48.º, n.º 1 e 49.º da LGT e art.º 12.º, n.º 2, do Código Civil). O QUE DIZ A LEI Código Civil Artigo 610.º Requisitos gerais  Os atos que envolvem diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes: a) Ser o crédito anterior ao ato ou, sendo posterior, ter sido o ato realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor; b) Resultar do ato a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade. Artigo 611.º Prova  Incumbe ao credor a prova do montante das dívidas, e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do ato a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor. Artigo 612.º Requisito de má fé  1- O ato oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má fé; se o ato for gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro agissem de boa fé. 2- Entende-se por má fé a consciência do prejuízo que o ato causa ao credor.  Artigo 613.º Transmissões posteriores ou constituição posterior de direitos  1- Para que a impugnação proceda contra as transmissões posteriores é necessário: a) Que relativamente à primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade referidos nos artigos anteriores; b) Que haja má fé tanto do alienante como do posterior adquirente, no caso de a nova transmissão ser a título oneroso. 2- O disposto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à constituição de direitos sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro. Artigo 614.º Créditos não vencidos ou sob condição suspensiva  1- Não obsta ao exercício da impugnação o facto de o direito do credor não ser ainda exigível. 2- O credor sob condição suspensiva pode, durante a pendência da condição, verificados os requisitos da impugnabilidade, exigir a prestação de caução. Artigo 615.º Atos impugnáveis  1- Não obsta à impugnação a nulidade do ato realizado pelo devedor. 2- O cumprimento de obrigação vencida não está sujeito a impugnação; mas é impugnável o cumprimento tanto da obrigação ainda não exigível como da obrigação natural. Artigo 616.º Efeitos em relação ao credor  1- Julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os atos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei. 2- O adquirente de má fé é responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem como dos que tenham perecido ou se hajam deteriorados por caso fortuito, salvo se provar que a perda ou deterioração se teriam igualmente verificado no caso de os bens se encontrarem no poder do devedor. 3- O adquirente de boa fé responde só na medida do seu enriquecimento. 4- Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido. Artigo 617.º Relações entre devedor e terceiro  1- Julgada procedente a impugnação, se o ato impugnado for de natureza gratuita, o devedor só é responsável perante o adquirente nos termos do disposto em matéria de doações; sendo o ato oneroso, o adquirente tem somente o direito de exigir do devedor aquilo com este se enriqueceu. 2- Os direitos que terceiro adquira contra o devedor não prejudicam a satisfação dos direitos do credor sobre os bens que são objeto da restituição.   Artigo 618.º Caducidade  O direito de impugnação caduca ao fim de cinco anos, contados da data do ato impugnável.
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