Hoje estou aqui, amanhã estou acolá;

Hoje estou aqui, amanhã estou acolá
Quantas já não terão sido as vezes que ouvimos estas palavras proferidas por várias pessoas, fruto da incerteza e precariedade profissionais que cada vez mais se tem vindo a abater sobre a nossa sociedade? Pois bem, para um nómada digital, aquela afirmação não é fruto de qualquer instabilidade, mas sim uma convicção refletida em breves palavras relativamente a um estilo de vida que decidiu adotar, tanto a nível pessoal como a nível profissional.
Imagine o leitor que acorda numa qualquer ilha paradisíaca, numa qualquer metrópole ou num qualquer cenário à sua escolha. E que de qualquer um dos sítios atrás referidos tem a possibilidade de não só viver o quotidiano, mas também exercer a sua atividade profissional. Para muitos de nós, esta situação será idílica, apenas possível por via da imaginação. Para um nómada digital, esta é uma realidade de vida.
Falamos aqui de pessoas que, aproveitando o facto de poderem exercer a sua atividade profissional (seja ela por conta de outrem ou em nome próprio) remotamente, apenas necessitando de uma ligação à internet, decidiram fazê-lo a partir de qualquer localização que escolhessem. Ao contrário da experiência retirada de uma viagem turística, em que podemos passar um curto espaço de tempo e conhecer um determinado local, os nómadas digitais vivem por períodos prolongados de tempo nessa localização, tornando-se parte da comunidade e do seu quotidiano. E a qualquer altura, caso assim o entendam, podem simplesmente mudar-se para outra localização, sem que a sua situação profissional sofra qualquer consequência.
Uma vez que as atividades desenvolvidas por estes profissionais são, muitas vezes, geradoras de riqueza, não só para os próprios mas também para as comunidades onde os mesmos se encontram inseridos, não admira que essas mesmas comunidades criem também programas, recursos e infraestruturas por forma a captar o interesse de potenciais profissionais que nelas se desejem instalar. Veja-se, a título de exemplo, o recente projeto “Destino Madeira”, impulsionado pela Startup Madeira e pelo Governo Regional daquela região autónoma, cuja adesão por parte do público-alvo tem sido um sucesso desde a data do anúncio. Já no território continental, destacam-se as cidades do Porto, Lisboa, Peniche, Braga, Sagres e Coimbra como principais locais de interesse para os nómadas digitais, e nas quais também já foram criadas várias iniciativas para a sua fácil e cómoda instalação.
Como atrás referimos, o nomadismo digital não implica necessariamente que os seus adotantes estejam em constante movimento. Ao invés, caracteriza-se, grosso modo, por aqueles se instalarem numa determinada localização e ali permanecerem durante um período prolongado de tempo, tornando-se assim necessário para os nacionais estrangeiros regularizarem a sua situação perante as autoridades portuguesas. Para estes casos, deverão os interessados requerer a emissão de um Visto D7, destinado a aposentados ou titulares de rendimentos, o qual lhes possibilitará também requerer a emissão de uma autorização de residência em Portugal, válida pelo período de 2 anos, renovável por um período seguinte de 3 anos, em cujo final (quando perfizer um total de 5 anos de residência) poderá o requerente adquirir uma autorização de residência permanente ou mesmo a nacionalidade portuguesa.
Para além do referido anteriormente, a autorização de residência permite ainda o reagrupamento dos membros da família do requerente, usufruir do sistema nacional de saúde, o acesso ao direito e a tribunais e, entre outros, principalmente à obtenção do Estatuto de Residente Não Habitual (RNH) perante as autoridades tributárias. Através deste último, os seus titulares terão direito, por um período de dez anos consecutivos, à isenção de rendimentos obtidos no estrangeiro, provenientes de pensões, trabalho dependente, independente, capitais, rendimentos prediais e mais-valias imobiliárias, propriedade intelectual ou industrial, bem como à tributação dos rendimentos obtidos em Portugal a taxas reduzidas, no caso de exercerem atividades de elevado valor acrescentado.
Atenta a nova realidade laboral consequente da pandemia, na qual o teletrabalho ganha cada vez mais um papel central, não é de admirar que o estilo de vida do nomadismo digital ganhe novos adeptos todos os dias, e que cada vez mais programas de incentivos por parte dos vários países e comunidades neles inseridas sejam criados para estas pessoas. O momento é de mudança, e os resultados saltam à vista: uma maior eficiência laboral, acompanhada de uma maior satisfação e felicidade pessoal dos adeptos deste estilo de vida.E porque não? Não deveria ser esse o objetivo?
Gustavo Sousa, Advogado Associado na Next-Gali Macedo e Associados, 03/06/2021
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