A obrigação (ou não) de estar vacinado para trabalhar;

A obrigação (ou não) de estar vacinado para trabalhar
Fruto dos tempos em que vivemos, levanta-se, agora, uma nova questão: se uma entidade patronal pode, ou não, reservar-se o direito de só contratar trabalhadores que já estejam vacinados?
A esta questão, surge outra, a de saber se um trabalhador já com contrato é obrigado (ou não) a estar vacinado para poder prestar normalmente o seu trabalho na sua empresa.
Ora, com esta questão da obrigatoriedade, ou não, da vacinação, levantam-se outras questões, tal como a violação do princípio de igualdade ou do direito ao trabalho constitucionalmente previsto no artigo 58.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que a vacina, nesta fase, não está acessível para todos, logo não se trata de uma questão de opção do trabalhador, antes sim de impossibilidade de obtenção da vacina, não esquecendo que a vacina contra a Covid-19 em Portugal não é obrigatória.
Estas são efetivamente as questões que poderão levantar alguma celeuma, isto porque outras questões existem que poderiam ser equacionadas mas que não nos parecem de grande relevância, pelo menos jurídica.

Deste modo, uma das grandes questões que aqui poderiam ser chamadas à colação seria a questão da proteção de dados, nomeadamente, a famosa questão de um empregador não poder exigir a candidato a emprego ou a trabalhador que preste informações relativas à sua saúde.
Neste ponto, esta questão de proteção de dados será sempre facilmente ultrapassável, uma vez que o trabalhador, ou candidato a posto de trabalho, nunca irá fornecer tal informação directamente à sua entidade patronal, antes sim, aquando dos seus exames médicos para admissão na empresa, um dos tópicos seria a questão da vacinação. Logo, a entidade patronal nunca teria acesso a qualquer certificado de vacinas, antes sim, tal como já decorre hoje em dia, teria a informação da medicina de trabalho que determinado trabalhador estaria apto ou não, sem que nunca a entidade patronal viesse a saber o porquê da apetência ou não de determinado trabalhador ou candidato a posto de trabalho.
Assim, e retomando as questões iniciais, se é verdade que a CRP prevê o direito ao trabalho e a toma da vacina não é obrigatória, no entanto, também é verdade que o Código do Trabalho, artigo 19.º, prevê excepções, desde que devidamente fundamentadas, nomeadamente em questões de saúde pública, pelo que poderá considerar-se que um trabalhador, para ser dado como apto pela medicina do trabalho para o desenvolvimento da sua atividade, só o seja com a vacina.
Sendo que aqui cumpre ressalvar que o artigo 19.º do Código do Trabalho nada fala em vacinação, pelo que a questão de se saber se determinado trabalhador está ou não vacinado não vem expressamente regulado na lei laboral.
Questão diferente será se, para efeitos de aptidão de determinado trabalhador deferida pela medicina do trabalho, a questão da vacina poderá passar a ser uma dos condicionantes para essa mesma aptidão.
Sem prejuízo de tudo o que aqui se referiu, é preciso não esquecer que qualquer contrato de trabalho só existe porque há duas partes, tendo assim um âmbito sinalagmático, ou seja, uma que presta o trabalho, o trabalhador, mas outra que dá o trabalho, a entidade patronal.
Ora, após verificarmos as questões dos trabalhadores, será também de olhar para o lado das empresas, da entidade patronal, nomeadamente se a entidade patronal será obrigada a contratar ou não alguém que não preencha os requisitos que idealizou para determinada vaga na sua empresa.
Nesta senda, julgamos que a liberdade contratual que rege as relações entre particulares terá que ser chamada à demanda, não se podendo considerar como admissível que determinada entidade patronal seja obrigada a escolher determinado trabalhador quando este não preencha os critérios definidos “ab initio”, sendo um deles a aptidão de prestar trabalho, considerando que a vacina será um critério para o deferimento dessa mesma aptidão.
Aqui chegados, urge uma intervenção do Governo com uma clarificação legislativa para se perceber a abrangência do artigo 19.º, nomeadamente uma empresa poder recusar um trabalhador que não esteja vacinado via aptidão do mesmo pela medicina do trabalho, isto tendo sempre por base uma questão de segurança dos restantes trabalhadores ou de terceiros.
Tiago Marcelino Marques Advogado Coordenador RSA LP, 09/07/2021
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