Olivais tradicionais deveriam ter maiores apoios;

Gonçalo Morais Tristão, presidente do CEPAAL, afirma
Olivais tradicionais deveriam ter maiores apoios
“Uma desejada estratégia para o setor olivícola português deve ter em consideração a coexistência dos vários tipos de olival”, considera Gonçalo Morais Tristão.
“A dificuldade em mecanizar todo o processo num olival tradicional tem sido um dos maiores entraves à sua manutenção e à viabilização das explorações, pelo que se tem assistido a walgum abandono. Este aspecto, juntamente com outros, justificaria um maior apoio a este tipo de olivais, sobretudo pela sua função social e ambiental” – afirma Gonçalo Morais Tristão, presidente do CEPAAL – Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo, em entrevista à “Vida Económica” no âmbito do 7º Congresso Nacional do Azeite.


Vida Económica - Qual tem sido a evolução da olivicultura em Portugal?
Gonçalo Morais Tristão -
Portugal tem tido uma evolução extraordinária nos últimos anos no setor da olivicultura e no setor oleícola. De facto, houve um grande incremento de área com plantações de novos olivais, mais modernos, mais produtivos, com compassos mais curtos.
Embora, a nível nacional não se tenha aumentado muito a área de olival, os novos olivais instalados têm produções muito superiores. Isto fez com que, desde há dez anos a esta parte, Portugal seja autossuficiente em azeite, ou seja, produzimos mais do que consumimos. Isto já não acontecia desde a década de 60 do século passado. Desde a campanha em que nos tornou autossuficientes, a produção de azeite tem batido sucessivos recordes. Ao mesmo tempo que se assistiu a este salto produtivo, o setor olivícola/oleícola português também conseguiu enormes ganhos em qualidade.
Estes resultados foram obtidos, sobretudo, com a adoção de novos processos no tratamento dos olivais, na colheita da azeitona, no transporte para o lagar em todo o processo de produção do azeite nos novos lagares, equipados com tecnologia moderna e preocupados com a qualidade do produto. Podemos hoje dizer, com seriedade, que os azeites portugueses ombreiam com os melhores do mundo. Prova disso, é a conquista de prémios em concursos internacionais de azeite com marcas portuguesas.

VE - Existe potencial para o aumento da produção e alargamento das plantações?
GMT -
Apesar do grande incremento das áreas de produção, sobretudo no Alentejo, creio que continua a haver potencial para novas plantações de olival e, consequentemente, para aumentos de produção
Se Portugal conseguir definir uma estratégia de política agrícola que tenha em consideração a valorização da produção agroalimentar e que seja consciente da verdadeira riqueza que são os territórios do interior, quer do ponto de vista económico, quer ambiental, quer social, estou certo de que a cultura do olival reforçará a sua tendência de crescimento.
Coexistência de três tipos de olival

VE - Como vê o papel do olival tradicional, do olival intensivo e do superintensivo?
GMT -
Os olivais modernos, intensivos e superintensivos, plantados normalmente em áreas de regadio, são muito produtivos, elevando a notoriedade de Portugal como player mundial no setor. Por outro lado, contribuem com números bastante interessantes para a balança de pagamentos.
Noutra vertente, este tipo de olivais, nomeadamente no Alentejo, têm atraído inovação, e introduzido novas técnicas e equipamentos que muito beneficia todo o setor. De realçar que, sobretudo no sul do país, os olivais intensivos têm vindo, gradualmente, a ser substituídos por olivais superintensivos devido à dificuldade de contratação de mão de obra.
O olival tradicional, que também pode ser moderno, com mecanização e com novos processos, é um tipo de olival que, além do objetivo de produzir azeite, tem também uma função social. De facto, sendo o tipo de olival predominante no país, ele faz parte do sustento de muitas famílias. É tradição, é paisagem, é património.
Uma desejada estratégia para o setor olivícola português deve ter em consideração a coexistência dos vários tipos de olival e retirar deles as maiores vantagens para a valorização do azeite de Portugal, sem esquecer os aspectos económicos, sociais e ambientais que envolvem o setor.

VE - A mecanização deve ser a prioridade para a viabilidade das explorações?
GMT -
A dificuldade em mecanizar todo o processo num olival tradicional tem sido um dos maiores entraves à sua manutenção e à viabilização das explorações, pelo que se tem assistido a algum abandono. Este aspeto, juntamente com outros, justificaria um maior apoio a este tipo de olivais, sobretudo pela sua função social e ambiental.

VE - Qual é o investimento necessário para a plantação de olival e o retorno esperado?
GMT -
Diversos fatores externos, sobejamente conhecidos, levaram a aumentos dos custos de produção no setor agrícola. Esses fatores também contribuíram para um aumento do custo do investimento para a instalação de um olival. Os preços das plantas aumentaram quase para o dobro. Também houve incrementos de preços consideráveis nos custos de mão de obra e nos metais (aramação). Em face disto, hoje, a instalação de um olival superintensivo pode custar 9500 €/10 000 € por hectare. Quanto ao retorno, depende muito dos preços do azeite. Se os preços andarem por volta do actual preço do azeite, o retorno pode chegar no quinto ou sexto ano. Se os preços baixarem para valores entre 3 € e 4 €, pode-se falar de um retorno de oito a nove anos.

Precisamos de uma estratégia de apelo ao consumo

VE - Quais são as perspetivas em termos de mercado interno e exportações?
GMT -
Existe um grande potencial de crescimento do consumo de azeite. Esta constatação influencia os investimentos na produção de azeite. Em relação a Portugal, continua uma tendência de instalação de novos olivais, cujas produções, muito provavelmente, se destinarão a mercados externos, aumentando o nível de exportações. No mercado interno, com o nível de preços dos últimos dois anos, houve uma quebra de cerca de 11% no consumo de azeite. Ainda assim, o consumidor de azeite resistiu, dado que o aumento percentual do preço do azeite foi muito mais elevado.
Mas sem dúvida que precisamos de uma estratégia de apelo ao consumo de modo a quebrarmos uma tendência, que já existia antes da alta de preços, de manutenção ou ligeira quebra no nível de consumo de azeite. Esta tendência verifica-se, em geral, nos outros países europeus mediterrânicos, tradicionais produtores de azeite (Espanha, Itália e Grécia).
O setor precisa ainda que a sua estrutura interprofissional (AIFO) funcione verdadeiramente, de modo que sejam construídas campanhas de promoção do consumo junto de novos consumidores (jovens), que evidenciem as suas caraterísticas benéficas para a saúde e a sua forte ligação à Dieta Mediterrânica. Oxalá este novo governo que agora entrou em funções consiga perceber o papel fundamental e a missão da estrutura interprofissional do setor olivícola.

VE - Os preços praticados em Portugal e pagos na produção estão alinhados com os preços de Espanha e Itália?
GMT -
Normalmente, os preços praticados em Portugal seguem a bolsa de preços de Espanha e não de Itália que, invariavelmente, são mais altos. Apesar do incremento da nossa produção, não temos escala para poder definir preços. E atualmente, o azeite é uma “commodity, pelo que é o mercado internacional que forma o preço. Como a maior parte da produção se concentra nos países europeus mediterrânicos, com grande predominância de Espanha, qualquer problema ao nível da produção, como foi o caso de recentes colheitas em Espanha muito inferiores aos valores médios, origina oscilação de preços. É isso que assistimos agora. As boas notícias, neste ano, foram as chuvas que caíram nos meses de fevereiro e março e que criaram expetativas de melhores campanhas. Se assim for, os preços da próxima campanha, poderão ser mais baixos.

Congresso Nacional do Azeite realiza-se em Valpaços

“Olivoturismo/Oleoturismo, uma realidade?”, “Preço do Azeite: Mitos e Tabus” e “Alterações climáticas, o futuro hoje” são os temas de debate na 7ª edição do Congresso Nacional do Azeite que se realiza dia 17 de maio, no pavilhão multiusos de Valpaços.
Organizado pelo CEPAAL, em parceria com a Câmara Municipal de Valpaços, no âmbito da Feira Nacional de Olivicultura – Olivalpaços, o Congresso Nacional do Azeite tem como objetivo dinamizar o setor olivícola e oleícola nacional enquanto fórum de excelência para o diálogo, promovendo um ponto de encontro para os profissionais do setor.
O evento será ainda palco de discussões e partilha de informação relativamente a temáticas relacionadas com o setor olivícola e oleícola privilegiando a divulgação de informação de cariz sobretudo técnica.
Paulo Portas é o “keynot speaker” do encontro, que inclui a entrega de prémios do Concurso de Azeite Virgem da Feira Nacional de Olivicultura. O encerramento do congresso conta com a presença, entre outros, do ministro da Agricultura e Pescas José Manuel Fernandes.





16/05/2024
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